Opinião
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9 de dezembro de 2019
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19:50

Por nossos direitos, nenhum recuo, não há negociação, retira já! (por Eduardo Luís Ruppenthal)

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Sul 21
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Por nossos direitos, nenhum recuo, não há negociação, retira já! (por Eduardo Luís Ruppenthal)
Por nossos direitos, nenhum recuo, não há negociação, retira já! (por Eduardo Luís Ruppenthal)
Caminhada luminosa do CPERS. Foto: Luiza Castro/Sul21

Eduardo Luís Ruppenthal (*)

A força da mobilização do magistério gaúcho através da greve em reação ao pacote neoliberal e desumano do governo Leite (PSDB) fez com que amplos setores da base parlamentar aliada recuassem de um apoio incondicional. O governador planejou de forma estratégica enviar o pacote de retirada de direitos sem precedentes no final do primeiro ano de mandato para preservar seus aliados dos desgastes políticos das eleições municipais (2020) e apostou que o período do final do ano letivo poderia ser mais um ingrediente suficiente para a não mobilização dos educadores gaúchos.

A adesão massiva por todo o estado com uma greve diferente marcada por um lado pela disposição de luta, apoio das comunidades escolares e amplos setores da sociedade, e por outro pela energia dos professores e funcionários junto com os estudantes em defender a Educação Pública a partir de cada escola, cada município e região, com múltiplas formas de manifestação, com criatividade e clareza da gravidade da situação conjuntural que vai além da vergonhosa situação salarial, de miserabilidade pelos baixos salários pagos, aliados aos quase 50 meses de parcelamentos e atrasos, com cinco anos sem nenhum reajuste, sem sequer a reposição inflacionária com perda do poder de compra em mais de 30% no período. Um pacote que está atrelado a um projeto de destruição e desmonte da Escola Pública.

O primeiro ano do governo Leite é marcado pela continuidade e aprofundamento da política neoliberal de descaso e desmonte dos serviços públicos do governo Sartori (MDB). Na educação continuou o fechamento de turmas, turnos e escolas, do campo e urbanas, falta de professores e funcionários, atraso dos repasses mensais às escolas, precarização ainda maior das relações de trabalho, dispensa de trabalhadores contratados, troca por contratos emergenciais fechados, além da impensável, absurda e desumana demissão de trabalhadores em licença saúde com doenças diversas e graves como câncer, em recuperação pós intervenções cirúrgicas, casos de fratura de ossos e até em licença maternidade.

A indignação e a revolta acumuladas foram reação ao pacote do governo Leite com a retirada de direitos conquistados por décadas de lutas, encaminhada de forma sorrateira para ser votado em regime de urgência (30 dias) pela Assembleia Legislativa. Abraços simbólicos às escolas, caminhadas luminosas, atos locais, regionais e estaduais, trancaços de ruas e rodovias, panfletagens, acampamentos em praças (atividades diárias incontáveis pipocando em cada município e regiões do estado), participação em rádios e jornais locais, tribunas populares e livres, manifestações e aprovação de moções de repúdios em centenas de câmaras de vereadores, campanhas pelas redes sociais e a unidade com outras categorias de servidores públicos fizeram com que vários deputados e bancadas da base que sustentam o governo Leite manifestassem contrariedade ao pacote como foi apresentado. E a manifestação da possibilidade da retirada do regime de urgência. A indignação e a revolta das ruas chegaram aos gabinetes da “Casa do Povo”.

A formação de uma ampla base de apoio do governo Leite, com mais de 40 deputados estaduais (PSDB, MDB, PP, PTB, PRB, PPS, PODEMOS, SOLIDARIEDADE, PSB, PR, PSD, PSL, DEMOCRATAS e NOVO) vai muito além do necessário para garantir as votações favoráveis, se dá graças ao alinhamento político e ideológico do projeto do governo, mas também pelas relações da velha política brasileira do toma-lá-dá-cá, da troca de favores, de cargos políticos em diversos órgãos, autarquias e secretárias, inclusive da educação, emendas parlamentares, promessa de financiamento, apoio e alianças nas eleições futuras, como as municipais em 2020. Portanto, tanto por parte dos deputados com seu histórico de fisiologismo político e de seus partidos, como por parte do Leite e de seus representantes, os próximos dias até o 17 de dezembro, data quando toda a pauta tranca pelos 30 dias do regime de urgência dos projetos, serão de negociação. Negociação de nossos direitos, de quanto custa cada voto de cada parlamentar: quantos cargos de confiança, quanto de apoio e financiamento para as próximas campanhas eleitorais, onde prevalecem interesses privados e pessoais. Em outras palavras, cada parlamentar e partido possuem seu preço. É isso que está em jogo. Outra estratégia do governo pode ser a retirada do regime de urgência e propor para votar em sessões extraordinárias em janeiro e fevereiro após o fechamento do ano letivo, nas férias do magistério dificultando a mobilização dos trabalhadores em educação. Sessões essas convocadas pelo Executivo no recesso parlamentar, entretanto que representam pagamentos de fartas diárias aos deputados e seus assessores para votarem contra os interesses da ampla maioria da população gaúcha.

O recuo dos deputados por enquanto se deve a nossa mobilização, a nossa força e à reação à altura da gravidade da situação, consequência da política planejada e executada do governo Leite. O mantra da crise esconde a real intenção de desmonte e conseqüente privatização dos serviços públicos, onde a tarefa principal do Leite é tirar ainda mais dos muitos que ganham pouco e direcionar para os poucos que ganham muito (expressos nos R$ 25 bilhões em 10 anos da retirada dos nossos direitos). Preservar e enriquecer ainda mais o andar de cima da sociedade gaúcha através das sonegações (R$ 7 bilhões anuais), das absurdas e sigilosas isenções e benefícios fiscais (R$ 9 bilhões anuais), não cobrança dos recursos da Lei Kandir (R$ 5 bilhões anuais e R$ 53 bilhões acumulados) e de não mexer nos altos salários, do andar de cima do Judiciário, Legislativo e Executivo. Aliás, estes que historicamente não possuem nenhum compromisso com a Educação Pública, mantém seus filhos em escolas privadas, nas mais caras da capital e até em instituições no centro do país ou até no exterior. Os mesmos que são donos e/ou financiam e possuem amplo espaço para conduzir a sua narrativa de “crise e soluções” nas principais empresas de comunicação do estado (RBS, Record, Bandeirantes, SBT, Pampa, etc) porta-vozes dos governos de plantão, que investem o dinheiro que dizem que não possuem para pagar salários ou investir em serviços públicos em propagandas caríssimas pagas com dinheiro público.

A greve se mantém forte, graças à revolta e indignação de uma categoria que está sendo massacrada há anos, que ao final do mês não sabe como paga as suas contas e que precisa escolher entre comer ou quitar as contas atrasadas. Uma categoria que se sacrifica, se desdobra e assume a responsabilidade diária de ser a base da educação de centenas de milhares de crianças, jovens e adultos da classe trabalhadora, 99% da população gaúcha. Portanto não vamos recuar, não aceitamos que nossos direitos sejam trocados por negociações obscuras, fisiológicas e repugnantes da velha política representada pelo governo Leite e de seus aliados. A nossa história não nos permite recuar. Continuaremos nas ruas. É pelo passado, presente e principalmente pelo futuro da Escola Pública. Por nossos direitos e pela defesa intransigente da Educação Pública, Gratuita, Laica e de Qualidade. RETIRA JÁ!

(*) Professor da Rede Pública Estadual. Licenciado e bacharel em Ciências Biológicas (UFRGS), especialista em Meio Ambiente e Biodiversidade (UERGS) e mestre em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS). Membro do coletivo Alicerce. Atualmente está como vice-diretor do 13º Núcleo do CPERS – Osório.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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