Opinião
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18 de novembro de 2019
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19:10

Terceirização da saúde pública na Lomba fere a dignidade humana (por Maister F. da Silva)

Por
Sul 21
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Foto: Giulia Cassol/Sul21

Maister F. da Silva (*)

A Lomba do Pinheiro é reconhecida por toda Porto Alegre por sua força e por sua organização comunitária e popular. Todos os avanços sociais, obras de infraestrutura, educação e saúde foram conquistados graças a mobilizações encabeçadas por diversas lideranças através das associações de moradores, de reivindicação nas assembleias do Orçamento Participativo (quando este ainda funcionava), do Conselho Distrital e Local de Saúde, CORAS, Fórum de Segurança e do Conselho Popular da Lomba do Pinheiro. Todas as melhorias conquistadas foram construídas por essa série de atores que permeiam vários partidos e credos religiosos, mas, que foram capazes de ao longo do tempo cerrar fileiras em prol do bem comum e do desenvolvimento da comunidade.

A Lomba, como a maioria dos bairros periféricos de Porto Alegre, tem crescimento urbano acelerado, problemas ambientais e sociais, comunidades em situação de risco, ocupação irregulares, problemas de infraestrutura, saneamento básico, altas taxas de desemprego, exclusão social e situação de violência, situações agravadas pelas políticas econômicas adotadas nas três esferas de poder executivo, federal, estadual e municipal. Para sanar tais dificuldades o gestor público, no caso o prefeito Nelson Marchezan Júnior, deveria estender a mão e dialogar com os atores e organizações citados anteriormente, a partir do diálogo e construção conjunta priorizar a implementação de políticas sociais capazes de mitigar tais efeitos sociais, culturais e econômicos na região. No entanto, ao contrário disso, o prefeito menospreza a comunidade, toma medidas autoritárias que visam fragilizar o tecido social construído durante décadas, precariza o mínimo de serviço público que resta e fere a dignidade das pessoas ao terceirizar a gestão e o atendimento a saúde no único Pronto Atendimento 24 horas que a comunidade possui.

O SUS assim como tudo o que a Lomba conquistou é fruto da mobilização popular, foi estimulado e formulado pelos movimentos populares que buscaram interligar a saúde com as demais políticas sociais, de maneira a um combate mais efetivo das desigualdades sociais vigentes, ainda nos idos da década de 80, culminando na conquista da saúde pública como uma das clausulas pétreas da Constituição Federal de 1988. A Lomba possui 55.439 usuários cadastrados nas suas nove Unidades de Saúde, que o prefeito quer extinguir ou fundir, a terceirização do PA atinge, sem exceções, a população de toda a Lomba, mais de 100 mil pessoas, visto que o SUS tem entre seus princípios a universalidade, ou seja, todo e qualquer cidadão deve ser atendido pelo sistema, independente de estar ou não cadastrado.

O índice das condições de vida da população da Lomba está entre os três piores de Porto Alegre, ficando a frente apenas das ilhas e da região nordeste da cidade. O modelo imposto pelo prefeito Marchezan afasta e enfraquece ainda mais o estado brasileiro, para a grande maioria destas pessoas, caso vença a queda de braço com sistema jurídico e consiga terceirizar as USF e demitir os agentes de saúde, será o caos, a total desregulação do sistema de saúde pública de Porto Alegre. A empresa privada é regulada segundo as leis do mercado e o sistema regulatório do mercado é oposto à valorização da pessoa humana. Por exemplo, a probabilidade de esvaziamento dos trabalhos de educação em saúde, cuidado com saúde mental, ações que são desempenhadas com a terceira-idade como caminhadas, atividades corporais, etc. seriam desempenhadas pela empresa contratada? Provavelmente não. Estas são empresas que atuam no mercado da doença, não na prevenção, não são promotoras de saúde. A empresa privada só tem razão de ser com o adoecimento constante da população, para ganhar dinheiro, obter lucro, são necessárias pessoas doentes.

Ao fim e ao cabo é nisso que Marchezan está transformando a saúde pública porto alegrense, estatística para a geração de procedimentos clínicos.

Porto Alegre já teve sua experiência de terceirização da saúde pública, os resultados não foram satisfatórios, o Instituto Sollus, o que resultou em um desvio milionário de recursos públicos. O que está se passando com a saúde pública na Lomba é fruto da voracidade do capital que é contra a Constituição de 88 e encontrou aconchego no colo de governantes que desprezam os pobres e os mais necessitados.

(*) Estudante de Administração de Sistemas e Serviços de Saúde, da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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