Opinião
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17 de novembro de 2019
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17:26

Porto Alegre e o desafio da unidade nas eleições de 2020 (por Juliano Medeiros e Matheus Gomes)

Por
Sul 21
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Prefeitura de Porto Alegre. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Juliano Medeiros e Matheus Gomes (*)

Um ano atrás o Brasil elegia Jair Messias Bolsonaro como seu 38º Presidente da República. Foram 57 milhões de votos dados ao ex-capitão, contra 47 milhões do seu adversário, o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Numa eleição altamente polarizada e marcada pelo uso em escala industrial de boatos e mentiras nas redes sociais e aplicativos de celular, 42 milhões de brasileiros e brasileiras optaram pelo voto nulo, branco, ou simplesmente não compareceram às urnas.

A oposição, dividida e derrotada, parecia dar sinais de que demoraria muito tempo para superar a eleição de Bolsonaro. Afinal, os partidos de esquerda e centro-esquerda se dividiram em quatro candidaturas presidenciais na maior parte do tempo: Guilherme Boulos (PSOL), Manuela D’Ávila (PCdoB), Ciro Gomes (PDT) e Lula (PT). Embora muito menos dividida que as forças de direita, a presença de quatro nomes da oposição evidenciava mais que divergências políticas ou programáticas. O que estava em disputa era os rumos da esquerda diante da crise do lulismo.

A prisão sem provas do ex-presidente Lula, em abril do ano passado, trouxe para a mesa um componente ainda mais dramático. Diante da flagrante injustiça cometida contra o líder do maior partido da oposição, as forças de esquerda e centro-esquerda se dividiram. Enquanto PT, PSOL e PCdoB consideraram que Lula era um preso político, PDT e PSB optaram por respeitar a decisão dos tribunais. Com a interdição judicial da candidatura do ex-presidente, as forças do campo democrático, ao final, se dividiram em três candidaturas: Boulos, Ciro e Haddad.

Apesar da unidade de amplos setores em favor do candidato petista no segundo turno das eleições presidenciais, o cenário da oposição a Bolsonaro no início do governo era de divisão. A eleição para a presidência da Câmara dos Deputados evidenciou as diferentes estratégias usadas pela oposição. Enquanto alguns partidos e lideranças apoiaram o nome de Marcelo Freixo (PSOL), outros optaram por apoiar o atual presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM), líder do famigerado “Centrão”. Passados mais de 300 dias de governo, seguem existindo diferentes projetos no interior da oposição, entretanto, o rechaço comum às contínuas ameaças às liberdades democráticas, os ataques aos direitos trabalhistas e sociais e a destruição das nossas riquezas naturais, nos posicionaram na mesma trincheira em muitos momentos, o que incluiu o apoio e a participação em manifestações de massa, como as jornadas pela educação pública.

Por tudo isso, o PSOL acaba de aprovar, em seu Diretório Nacional, uma orientação pela construção da unidade nas eleições de 2020. Nossa resolução ressalta que “essa pressão não pode ser entendida como forma de suprimir divergências acumuladas em nível local entre partidos que hoje compõem a oposição ao governo Bolsonaro”. Em outras palavras: a unidade deve ser buscada, mas sempre respeitando as realidades locais e os limites impostos pela dinâmica da luta política em cada município. A questão que se coloca para nós é: será possível transformar as cidades em polos de resistência a ofensiva autoritária e neoliberal? Pensamos que a capital gaúcha pode oferecer uma resposta positiva a essa pergunta e servir de exemplo para todo o Brasil.

O aumento dos conflitos políticos na América do Sul – especialmente na Argentina, Equador e Chile – mostram que as forças neoliberais têm sido cada vez mais questionadas pelas maiorias sociais, penalizadas pelas políticas de ataque aos direitos. A experiência concreta da maioria do povo brasileiro – refletida na queda de popularidade do presidente e no recorde de desaprovação do governo – revela a enorme frustração de parte daqueles que elegeram Bolsonaro. Diante disso, é natural que as propostas da oposição para enfrentar a crise que assola o país encontrem maior audiência. Mas para isso é preciso seguir apostando no diálogo.

Em Porto Alegre, capital do Fórum Social Mundial e berço da democracia participativa, as forças de oposição ao governo Bolsonaro estão diante de uma oportunidade única. A construção de uma frente eleitoral contra o neoliberalismo de Marchezan Jr. entre PCdoB, PSOL e PT é um empreendimento que pode servir de exemplo para outros lugares do país. É claro que para que isso aconteça é fundamental pensar um programa de transformações para a cidade, que extraia as lições dos erros e acertos das experiências vividas pela esquerda a frente do Paço Municipal. Será preciso definir critérios democráticos para a construção da chapa e também desafiar nossos partidos a construir suas decisões refletindo os anseios dos movimentos sociais e coletivos que resistem nos bairros, locais de trabalho, escolas e universidades.

É difícil, mas é possível. Se deixarmos de lado certas inclinações hegemonistas e abandonarmos qualquer posição sectária ou auto-proclamatória, construiremos um caminho parar superar diferenças e formatar um programa comum. E o PSOL, em particular, pode e deve dar sua contribuição neste esforço, preservando sua coerência e sua identidade, mas levando em conta o momento grave que vivemos. A existência de um governo de extrema-direita favorece o diálogo e o entendimento eleitoral entre as forças de oposição. Resta agora fazer o dever de casa. O desafio é enorme. Mas a vitória também pode ser.

(*) Juliano Medeiros é historiador e presidente nacional do PSOL. Matheus Gomes é mestrando em História e membro da executiva estadual do PSOL/RS.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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