Opinião
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21 de novembro de 2019
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11:30

Marchezan criminaliza a pobreza (por Marcelo Sgarbossa)

Por
Sul 21
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Guardadores de carro ao final da votação na Câmara de Vereadores de Porto Alegre. (Foto: Jeannifer Machado/CMPA)

Marcelo Sgarbossa (*)

Desesperançadas. Assim saíram as mulheres e homens que acompanharam a sessão plenária em que foi que aprovada a extinção da atividade de guardador de veículo. O questionamento que se ouvia era um só: “E agora, o que vamos fazer?”

Surfando na onda do senso comum, vereadores arrancaram a dignidade de quem tem no seu trabalho a única fonte de renda. Por meio de uma emenda, infelizmente rejeitada pelo voto dos vereadores da base governista, tentou-se diferenciar o “flanelinha”, que comete o crime de extorsão, e portanto deve ser reprimido, daquelas pessoas que são guardadores de automóveis sindicalizados, inclusive usando jalecos, e que têm uma relação de confiança, muitas vezes de proximidade e confiança com os donos de veículos. O projeto de Lei apresentado pelo prefeito Marchezan Júnior (PSDB), no entanto, não fez essa diferenciação.

Generalizar com falas de achaque e de extorsão são formas de fugir do verdadeiro problema. A atividade de guardador de veículo, assim como de catador de material reciclável, muitas vezes é a única opção das pessoas para garantir o sustento de suas famílias.

Estamos vivendo um momento de tristeza em nossa sociedade. A ideia que vem prevalecendo é a criminalização da pobreza, em outras palavras, uma política de extermínio das pessoas pobres. Temos até um ministro da Economia que enche a boca para dizer que os pobres gastam tudo o que ganham, que não sabem poupar. Mas poupar o quê, se não sobra nada?

Em Porto Alegre, Marchezan é responsável por projetos que têm prejudicado os mais carentes, justamente quem mais precisam do apoio do Poder Público. A desestruturação é tão grande e vem por todos os lados. Seja na área de saúde, atacando os profissionais que atendem a comunidade nos postos, seja perseguindo professores e demais servidores municipais. Ou ainda tendo orgulho em defender que a Prefeitura é uma empresa, e não um órgão que deve promover os direitos sociais. Moradia digna então, nem aparece.

O que parece é que o prefeito Marchezan e grande parte dos vereadores resolveram jogar para a torcida. Há tempo se sabe que essa ideia de tentar resolver uma questão social complexa com uma lei não passa de uma grande enganação. Como exemplo, temos as leis que proibiram camelôs e a circulação de catadores nas ruas.

Vale lembrar, ainda, que a própria Prefeitura promoveu cursos de capacitação como guardador de veículos para cerca de cem catadoras e catadores de material reciclável em 2014. A meta era capacitar 500 até 2016, anunciava a gestão anterior, que contava com o apoio de partidos que agora estão aliados a Marchezan para proibir a atividade na Capital.

Certamente, quem trabalha honestamente como guardador também não quer que achacadores se aproveitem para extorquir motoristas. Para ampliar a fiscalização e evitar casos de extorsão, o Município deveria fazer um trabalho de articulação junto ao Sindicato dos Guardadores, que foi fundado em 1984 e é formado por pessoas conhecidas. Muitas delas estiveram nas galerias do plenário, clamando pelo diálogo com os vereadores.

Enquanto a legalidade do projeto de Lei é questionada na Justiça, veremos se a fiscalização terá pernas para abranger toda a cidade. Pois se ilude quem acha que eliminar as pessoas pobres é tarefa fácil. Elas seguirão lutando e resistindo, ainda que na informalidade, para buscar o sustento de suas famílias trabalhando nos poucos espaços que ainda têm.

(*) Marcelo Sgarbossa é vereador e líder da Bancada do PT Porto Alegre

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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