Opinião
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21 de novembro de 2019
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12:58

Falta gestão na Educação do Marchezan (por Jonas Reis)

Por
Sul 21
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Jonas Reis, diretor-geral do Simpa. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Jonas Reis (*)

Decidir os rumos da escola na democracia direta é um direito guarnecido em lei própria municipal em Porto Alegre (Lei 7.365/1993).

O governo municipal não pode descumprir a legislação vigente. Seria uma demonstração de arbitrariedade se assim o fizesse. Nem mesmo os governos mais autoritários desrespeitaram os sistemas legais da forma como vemos hoje. Apenas ditaduras assim o fizeram como, por exemplo, em 1968, quando foi editado o Ato Institucional nº 5, o famoso AI-5.

Mas não é o caso do que ocorre no município de Porto Alegre. Aqui, do ponto de vista da gestão democrática da educação, as comunidades escolares abriram seus processos de escolha direta das equipes diretivas, cumprindo a lei e desafiando o Governo Marchezan e seus vereadores aliados.

Cumprir a lei deveria ser o óbvio para os bons cidadãos, os regrados. Mas não é tão natural, em se tratando de um governo que soterrou o Orçamento Participativo (OP) e desincentivou a participação popular na gestão da prefeitura.

Estamos diante de um governo que não debate mais com a cidade o orçamento e administra mal os recursos públicos, privilegiando os que já há décadas vêm sendo beneficiados da/na capital dos gaúchos: os ricos e os grandes empresários. No caso da educação, sua opção é a compra de pacotes privados de ilusões para as comunidades, com “Startups” e outras parcerias milionárias, enquanto as escolas públicas penam com escassos recursos financeiros.

A Rede Municipal de Ensino de Porto Alegre (RME-POA), em particular os docentes, servidores públicos concursados, estão de parabéns, pois não titubearam ao dar início ao processo eleitoral para a escolha das direções em suas escolas. Estão cumprindo a lei em vigor.

Cumprir as leis é um dever de todo funcionário público exemplar. É uma pena que o secretário de educação de Porto Alegre, ao invés de cumprir a lei, tenha apostado em uma aventura e criado um projeto de lei “sem pé nem cabeça” (Projeto de Lei do Executivo – PLE 20/2019) para burlar a lei atual há poucos dias do encerramento dos mandatos vigentes das equipes diretivas das 99 escolas da RME-POA.

Hoje, as escolas elegem equipes diretivas compostas por chapas para preencher os cargos de diretor e vice. No projeto de lei de Marchezan, não votaremos em chapas, mas apenas no diretor que poderá escolher livremente seus vices apenas depois de eleito. Na prática, estamos trocando projetos coletivos por individuais. Um retrocesso, em se tratando de gestão democrática, pois uma pessoa sozinha não faz gestão. Na verdade, pela lógica do Júnior, devemos reproduzir o modelo do “reizinho mandão” nas escolas? Chega de gestão e responsabilidades compartilhadas? Chega de coletividades?

Além disso, é um projeto que busca responsabilizar unicamente os professores e as direções escolares quanto aos avanços no IDEB. No projeto da “Lei Júnior”, o diretor será destituído, perderá o cargo se não melhorar o IDEB de sua escola.

Para melhorar o IDEB atual, é necessário um conjunto de políticas sociais que atendam aos alunos e suas famílias em todas as dimensões humanas, com destaque especial para a criação de empregos qualificados para todos os cidadãos, pais e mães, a garantia de assistência social real para os mais empobrecidos, a educação em tempo integral em todas as escolas, um Sistema Único de Saúde (SUS) fortalecido principalmente. Um aluno ou aluna que não tem o que comer em casa, pois o desemprego assola as famílias, ou que não tem um medicamento ou acesso a uma consulta médica para curar possíveis enfermidades, jamais poderá aproveitar com intensidade o mundo escolar e de instrução. Com fome ou doente ninguém aprende. Assim, devemos destacar que não temos políticas públicas fortes neste sentido no Brasil atual. Nosso país está mergulhado em uma crise econômica, política e institucional sem precedentes. Os investimentos em políticas sociais estão congelados.

Essa ação do governo, ao tentar responsabilizar só os professores pelo IDEB, revela uma fórmula gestora peculiar que devemos sublinhar.

Desorganização total do setor pedagógico e jurídico quanto aos calendários legais, aos regulamentos da boa e planejada gestão da educação pública municipal. O secretário teve três anos de gestão e não buscou mudar antes a lei de eleição de diretores por quê? Pensamos ser pura incompetência e desleixo com o cotidiano de gestão das escolas. Aliás, em poucas escolas a gestão Marchezan “colocou os pés”, o que pode ser um sinal que corrobora ainda mais esta alternativa.

Ausência de concursos públicos para suprir as demandas reais da RME-POA. Não realização de nenhum concurso para os anos finais do Ensino Fundamental, tampouco para os setores das escolas, como, biblioteca, informática, nutrição e manutenção geral como também para monitores escolares.

O governo Marchezan incorre em um grande erro ao fazer tramitar um projeto de lei de mudanças na forma de escolher os gestores e ao atropelar o trabalho das direções atuais, deixando as escolas sem representantes legais eleitos. E o faz propositalmente.

Não basta a falta de mais de 600 professores na rede. Um déficit enorme, que desfalca as equipes e faz centenas de turmas irem embora das 99 escolas sem aulas todos os dias. Isso é um absurdo. Não há professores substitutos, por isso os alunos vão embora. Os contratos temporários que criou foram uma “fake news”, não supriram a realidade. Nem mesmo as equipes de coordenação e apoio pedagógico estão completas nas escolas. Mas há algo que nos inquieta: vemos muitos professores querendo ampliar suas cargas horárias de 20 para 30 ou 40 horas, e o secretário de educação não permite, preferindo deixar turmas sem o direito à educação. Por que isso? Alguns alunos estão sem aulas de artes, português, língua estrangeira e matemática há mais de 2 anos. Contudo, retirou, de 2018 para 2019, 30 professores de sala de aula para enclausurá-los nos setores burocratizadores da Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre (SMED). Inclusive professores que sequer cumpriram o estágio probatório. Tremenda falta de respeito com o povo.

Além disso, nesse sufoco criado pela incompetência governamental, muitas equipes acabam tendo que dar conta de fazer a manutenção física das escolas, pois os grupos de manutenção de prédios foram tão reduzidos na gestão do governo Júnior que não há número suficiente de servidores para efetuar esses serviços nas escolas. Estamos à mercê do desmonte intencional da educação.

Entretanto, o prefeito vem com essa piada de “Natal Alegre”, com show de famosos na Orla do Guaíba, enquanto falta gestão na educação. É a “política do pão e do circo”? Porto Alegre tem outras prioridades, Senhor Prefeito. A educação é uma delas. Não deixe mais faltar professores nas escolas, faça concurso ao invés de brincar com a legislação vigente.

Por fim, ao que parece, vivemos tempos de valores invertidos. Governantes não zelam pelas leis, as descumprem. O judiciário nada faz, parece ficar inerte ou fechar os olhos. A população trabalhadora, pagadora de impostos, segue sendo vilipendiada. A ‘Pólis” sofre no tempo de barbárie e banalização das leis. Quem afinal está abaixo da Lei? Só o cidadão comum? Só o cidadão sem poder? Os gestores públicos estão acima dela? Quem responsabilizará Júnior por suas arbitrariedades, por tentar jogar as escolas no mesmo caos gestor dos setores da desgovernada SMED? Os vereadores do governo compactuarão com essas brincadeiras do secretário Adriano, o douto?

Mas, dia 21 de novembro de 2019, vamos festejar a democracia nas escolas municipais. Festejar o trabalho das comunidades escolares para garantir a lei vigente da verdadeira Gestão Democrática. Vamos exercer nosso direito de voto, elegendo chapas completas. Vamos escolher os rumos de nossas escolas. Vamos dizer sim à legislação e à democracia e dizer não ao caos gestor perpetrado pelo governo Júnior na SMED. Vamos juntos, por nossos alunos, pelo bom andamento do serviço público de educação municipal. Afinal, quem faz a educação acontecer são os professores, os alunos, os responsáveis e os funcionários de escola, não são os aventureiros encastelados na SMED.

(*) Doutor em Educação. Diretor Geral do SIMPA. Professor da RME-POA na EMEF Ver. Carlos Pessoa de Brum.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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