Opinião
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25 de novembro de 2019
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18:48

Bolsonaro pratica a necropolítica (por Marcelo Sgarbossa e Cristiano Lange dos Santos)

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Bolsonaro pratica a necropolítica (por Marcelo Sgarbossa e Cristiano Lange dos Santos)
Bolsonaro pratica a necropolítica (por Marcelo Sgarbossa e Cristiano Lange dos Santos)
Jair Bolsonaro. Foto: Reprodução/Instagram

Marcelo Sgarbossa e Cristiano Lange dos Santos (*)

Um projeto de Lei do presidente Bolsonaro (sem partido) quer retirar a excludente de ilicitude para forças policiais em operações. Isto significa que agentes de segurança que cometerem excessos poderão ficar isentos de punição. Em outras palavras, a intenção é legitimar o direito de matar, numa evidente contrariedade aos fundamentos constitucionais do valor intrínseco da dignidade da pessoa humana, estabelecido na Constituição.

Ademais, é possível que Bolsonaro queira se antecipar a possíveis manifestações de rua, tal como tem acontecido no Equador, Chile, Bolívia e, mais recentemente, na Colômbia. Talvez o presidente esteja pensando em usar as forças militares para reprimir os movimentos populares.

Esse é só mais um dentre os inúmeros absurdos legislativos cometidos por Bolsonaro e seu “superministro” Sérgio Moro. Estão na lista o indulto a policiais que cometeram crimes, o Pacote Anticrime, a liberação do porte de armas, sem contar a permissividade com a devastação ambiental, que também é um flerte com a morte. Vale lembrar que a excludente de ilicitude estava prevista no Pacote Anticrime, mas acabou retirado com a aprovação de um substitutivo, apresentado pelo deputado Marcelo Freixo (PSOL/RJ). Assim, Bolsonaro insiste em contrariar as diretrizes éticas, e revela o seu lado mais bárbaro, na medida em que sua política aponta para a banalização da vida e para o extermínio, convertendo o aparato estatal numa máquina de guerra. Os dados são evidentes.

O 13º Anuário Brasileiro de Segurança Pública demonstra que 11 a cada 100 mortes violentas foram decorrentes de ações de policiais. Foram 6.220 vítimas em 2018, o que representa 17 pessoas mortas por dia. Um crescimento de quase 20% em relação ao ano anterior. Significa dizer que as polícias nunca mataram tanto quanto hoje. Mas se a polícia brasileira mata muito, ela também morre. Aliás, o Brasil é um dos países em que mais policiais morrem. Somente em 2018 foram 343 policiais civis e militares assassinados, sendo que 75% estavam fora do horário de serviço.

Além disso, é importante registrar as altíssimas taxas de mortalidade da juventude negra. De acordo com o Atlas da Violência: i) mais de 92% dos homicídios são contra homens; ii) de cada 100 pessoas que sofrem homicídio no País, 71 são jovens negros ou negras; iii) o cidadão negro tem 23,5% a mais possibilidades de sofrer um homicídio se comparado a cidadãos de outras raças/cores, já descontado o efeito da idade, sexo, escolaridade, estado civil e bairro de residência. A não incidência de políticas estatais no enfrentamento desses índices de mortalidade é uma evidente sinalização de que o governo Bolsonaro pratica a necropolítica – a política da morte e da banalização da vida.

O filósofo camaronês Achille Mbembe caracteriza a necropolítica como o poder e a capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer, num contexto marcado pelo extremismo do neoliberalismo. Ao adotar a lógica de fazer a guerra e a acirrar os ânimos, o presidente legitima ações e posturas mais violentas, capazes de ser estimular tais comportamentos com o emprego da violência.

As medidas legislativas enviadas por Bolsonaro não se constituem numa agenda positiva para enfrentar os problemas de segurança pública. É preciso políticas intersetoriais de segurança que envolvam a prevenção, aliadas a ações estatais de pacificação social. Além disso, políticas sociais, especialmente de educação, focalizadas nos grupos mais vulneráveis, sobretudo com jovens, para se construir perspectivas de oportunidade de futuro. Sem isso, não há política que dê jeito.

(*) Marcelo Sgarbossa é vereador e líder da Bancada do PT Porto Alegre. Cristiano Lange dos Santos é Doutor em Direito e procurador Jurídico do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais (LAPPUS).

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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