Opinião
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25 de setembro de 2019
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19:53

Os riscos da gestão privada no Mercado Público (por Marcelo Sgarbossa)

Por
Sul 21
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Os riscos da gestão privada no Mercado Público (por Marcelo Sgarbossa)
Os riscos da gestão privada no Mercado Público (por Marcelo Sgarbossa)
Mercado Público de Porto Alegre. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Marcelo Sgarbossa (*)

Perto de completar 150 anos, o Mercado Público de Porto Alegre está por ser concedido para a iniciativa privada. O prefeito Marchezan Júnior (PSDB) pretende repassar a administração deste espaço tradicional do nosso Estado por um prazo de 25 anos. Para isso, abriu uma consulta pública, com previsão de licitação para novembro.

A decisão de privatizar a gestão do Mercado deixa a comunidade apreensiva, especialmente os mais de 100 permissionários e cerca de 1,2 mil pessoas que lá trabalham. São muitas as incertezas e inseguranças sobre o quanto que essa mudança de gestão vai impactar no funcionamento desse local, que é um patrimônio da população e tem íntima relação com a vida e os hábitos da sociedade gaúcha.

A privatização de locais com essas caraterísticas populares pode gerar uma elitização, já que o alegado viés de modernizar o Mercado Público pode acabar afastando consumidores tradicionais, que encontram ali uma forma de se relacionar com o espaço público, num dos locais mais simbólicos do Rio Grande do Sul.

Sempre é importante ressaltar que investidores buscam lucro. Não estão preocupados em preservar o patrimônio imaterial, que se mantém na simbologia dos hábitos de uma coletividade, nos rituais do comércio tradicional e nas relações pessoais que se nutrem de vivência, ultrapassando assim uma mera atividade comercial.

Pela lógica privada, lucrar com investimentos pode forçar o aumento nos preços dos produtos, impedindo assim que as pessoas de baixa renda continuem se abastecendo nas bancas de referência. É possível, ainda, que isso altere de tal ordem as características que desanime comerciantes a permanecerem nesse ambiente moldado pelas famílias e proprietários tradicionais, o que atribui alma própria a esse ponto comercial.

Desde que foi fundado, em 3 de outubro de 1869, o Mercado Público sobreviveu a enchentes (1941), incêndios (1976,1979 e 2013) e ameaças de demolição. Foi tombado pelo Patrimônio Histórico e Cultural de Porto Alegre em 1979. Passou por uma importante reforma na década de 1990, que recuperou a concepção arquitetônica original, resgatou a qualidade estética, qualificou a capacidade de abastecimento e valorizou espaços de sociabilidade.

Conceder a administração do Mercado por um quarto de século ao setor privado pode ser tempo suficiente para destroçar uma história e um modo de vida construído ao longo de 150 anos. A população de Porto Alegre, mais do que nunca, precisa estar atenta para evitar a descaracterização e o desrespeito ao que há de mais sagrado numa comunidade: nosso modo de convívio e relacionamento num espaço público por excelência não pode ser ameaçado pela simples lógica mercadológica do lucro acima de tudo.

(*) Vereador e líder da bancada do PT.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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