Opinião
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24 de agosto de 2019
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21:34

Nota do Movimento Todos Pela Educação

Por
Sul 21
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Todos Pela Educação (*)

À luz da entrevista concedida pela Professora Liane Bernardi ao jornalista Marco Weissheimer, publicada no portal Sul 21 no dia 19 de agosto deste ano (disponível aqui), entramos em contato para, respeitosamente, nos colocar à disposição de modo que possam conhecer melhor o Todos Pela Educação (Todos), nosso posicionamentos, forma de atuação e de manutenção, uma vez que, embora tenha sido dito pela Professora que o Todos seja seu objeto principal de estudo, parece haver grande desconhecimento sobre nosso trabalho.

Primeiramente, cabe destacar que o Todos Pela Educação surgiu de um grupo de pessoas, dentre as quais se encontram empresários, jornalistas, pesquisadores e militantes por causas sociais no Brasil. A qualquer um que se interessar, a lista de fundadores está disponível em nosso site (pode ser vista aqui) e contém nomes tão plurais quanto o empresário Jorge Gerdau e o cientista político Fernando Abrucio, citados na matéria, bem como o religioso Frei Beto, conhecido pela postura progressista, o jornalista Ricardo Kotscho, o reitor e fundador da Universidade Zumbi dos Palmares José Vicente e a, já falecida, ativista Zilda Arns. É, portanto, falsa a informação de que a organização foi criada por “um grupo de banqueiros”, como se afirma na introdução da matéria, ou pela “financeira Unibanco-Itaú”, como se afirma em uma das respostas posteriores.

É falsa também a informação de que o Todos oferece serviços à gestão pública, conforme o mesmo parágrafo dá a entender. Desde 2006, o Todos acompanha os indicadores e as políticas públicas educacionais do País, busca entender seus efeitos e resultados, elabora diagnósticos e propõe políticas públicas informadas por evidências, experiências bem sucedidas no Brasil e no mundo e referenciadas no arcabouço legal da área no País, com o único propósito de contribuir para que seja garantida a todas as crianças a todos os jovens Educação Básica Pública de qualidade. E faz isso de forma republicana e transparente – todos os estudos e propostas apresentados pelo Todos ao poder público estão disponíveis publicamente em nosso site – entre elas, por exemplo, a de Financiamento (aqui), a voltada a Professores (aqui) e a dedicada ao tema da Alfabetização (aqui).

É importante ainda ressaltar que o Todos é uma organização de natureza suprapartidária. Na rede de fundadores e associados, bem como dentre os que colaboram com as iniciativas que lideramos, há pessoas que defendem visões de mundo diferentes, com e sem vinculações partidárias. Exemplo mais recente disso se deu na construção do documento Educação Já, que contou com a colaboração de um grupo plural de mais de 60 especialistas e profissionais da educação (pode ser visto na página 3 do documento, disponível na íntegra, aqui). Portanto, não faz sentido algum tentar buscar alinhar a nossa atuação do governo atual – é desproporcional, inclusive, a comparação, uma vez que, desde 2006, temos interlocução com o Ministério da Educação. Além disso, como fizemos com todos os governos desde nossa fundação, temos sido críticos de diversas ações da atual gestão federal na educação, como pode ser visto, por exemplo, nestas entrevista ao Valor Econômico aqui e aqui, e ao Estadão, aqui.

É equivocado, também, atribuir ao Todos o discurso de que a Escola Pública não funciona. Ao contrário, é comum reiterarmos em nossos posicionamentos públicos os avanços que foram conquistados pela Educação Básica nas últimas décadas, como por exemplo, pode ser visto neste artigo no Estadão (aqui) e nesta conversa no Twitter (aqui). Independentemente da visão sobre o que deve ser a qualidade da Educação – tema abordado em outro ponto do texto -, contudo, mesmos dados oficiais usados pela Professora mostram claramente que o País não está conseguindo garantir o direito à Educação – por exemplo, falta infraestrutura adequada e as taxas de evasão e reprovação ainda são muito grandes. E o Todos jamais atribui isso às escolas individualmente, mas entendemos que são desafios postos pelo sistema como um todo, conforme exposto em outro artigo de opinião (aqui). É válido salientar, contudo, que mesmo diante dos avanços e sempre os mencionando, o papel de mobilizar poder público e sociedade exige que se apontem os problemas. Afinal, como cobrar melhorias se apenas falarmos do que já está bom?

Lamentamos que a Professora entenda as competências socioemocionais como algo para controlar os estudantes. Há uma ampla gama de estudos sobre essa área o que defendemos é justamente o oposto do apontado nessa entrevista: não desejamos alunos “tranquilos e socializados”, mas sujeitos capazes de dialogar inclusive com pessoas que pensem diferente. Sujeitos que cultivem e promovam a cultura de paz, ainda que se manifestem e protestem contra as injustiças. Sujeitos que possam aprender a aprender, desenvolvendo um pensamento crítico, explorador e autônomo. Sujeitos que sejam cidadãos com oportunidades. Longe de defender que se foque apenas em Português e Matemática, o Todos buscou sempre apontar a importância de uma Educação Integral que se baseie no amplo conhecimento acumulado pela sociedade e seja promotora do respeito à diversidade e diferenças de crenças e visões de mundo. Inclusive, no documento Educação Já, disponível aqui, acima citado, os princípios do que defendemos estão destacados na página 32 do texto.

Não fica claro o que a Professora quer dizer quando afirma que, ao ser reconhecido como organização sem fins lucrativos (o termo correto é Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – Oscip, um título dado pelo governo e para o qual são necessários uma série de requisitos e comprovações), o Todos passa a “agir em outras posições”. O Todos mantêm sua forma de atuação desde que foi fundado: monitora os indicadores e políticas educacionais, busca mobilizar a sociedade pela importância da Educação, colocando o tema em pauta na mídia, produz conhecimento e o apresenta à sociedade e ao poder público. Embora o Plano de Metas Compromisso Todos Pela Educação, lançado na gestão do então ministro da Educação Fernando Haddad tenha levado o nome do Todos e contado com sua contribuição na elaboração, por meio do conhecimento até então produzido, o Todos jamais se envolveu na implementação de qualquer ação relacionada a ele, ou sequer se envolve na implementação de políticas públicas.

Sobre o Conselho de Governança do Todos, a matéria oculta que, além de pessoas ligadas a alguns dos mantenedores do Todos (nem todos tem cadeira no Conselho, que é eleito pela assembleia dos sócios a cada dois anos), há pesquisadores, pessoas que passaram pela gestão pública de diferentes governos, e pessoas diversas comprometidas de causas sociais no Brasil. Essa lista, que está no nosso site, pode ser encontrada aqui.

A matéria faz ainda, erroneamente, parecer que o Todos tem qualquer ingerência ou participação nas ações dos institutos e fundações em redes de ensino. Não há uma cadeia de ações articuladas com o Todos ou pelo Todos, muito menos no sentido de acabar com projetos pedagógicos locais.

Já a pergunta do repórter Marco Weissheimer, que traz uma afirmação falsa sobre uma suposta disputa pelo dinheiro público, demonstra um profundo desconhecimento do Todos: somos uma organização que não recebe, nem nunca recebeu, qualquer quantia de dinheiro público. E nem defende especificamente que sejam usados recursos públicos para que empresas privadas forneçam serviços ou insumos à Educação, como faz crer a relação entre a pergunta e os exemplos dados na resposta da Professora.  Aliás, fossemos defensores da pautas do setor privado, certamente não teríamos, por exemplo, divulgado na semana passada este estudo aqui sobre os problemas associados à agressiva expansão do Ensino a Distância (EAD) na formação inicial de professores, que, em grande medida, tem se dado por meio de instituições particulares de ensino.

Além disso, temos um amplo quadro de doadores, de forma que nossa atuação possa ser independente tanto de governos – uma vez que é nosso papel monitorá-los – quanto de uma organização específica, uma vez que nossa missão em contribuir para que seja garantido o direito à uma Educação de qualidade a todas as crianças e jovens não se submete a qualquer ator em particular. A lista está aqui.

Ainda sobre a relação com os governos, a afirmação da Professora de que “eles abandonam qualquer discurso moderado (…) investindo em propaganda na mídia” não deixa claro a quem ela se refere como “eles”, mas vale ressaltar que o Todos não faz propaganda paga.

É falsa também a informação de que o Todos defende a política de voucher – em relação á qual a organização tem, na verdade, várias críticas – e muito menos que esta política está inserida na proposta de Novo Fundeb liderada pelo Todos – a proposta, que defende um modelo ampliado e mais redistributivo em benefício dos municípios e alunos mais pobres, é pública e pode ser acessada em detalhes aqui.

Por fim, a afirmação de que há uma afinidade entre o “discurso truculento e tosco de Bolsonaro contra a universidade pública e contra o que é ensinado nas escolas hoje e a estratégia de fundo do movimento Todos pela Educação” busca estabelecer uma relação sem qualquer respaldo na realidade. O Todos sempre defendeu a Educação, se posicionou publicamente nas ocasiões em que atores do governo se manifestaram de forma ofensiva à escola, alunos e professores – por exemplo, em artigo no jornal O Globo (aqui) e em entrevista à Rádio Cultura (aqui). Não há uma estratégia “de fundo”. Temos uma equipe comprometida, pessoas que trabalham diariamente com afinco para qualificar o debate educacional e com a única missão de contribuir para que o direito à uma Educação de qualidade seja garantido para todas as crianças e todos os jovens do Brasil.

Causa-nos estranheza que, sendo o objeto de estudo em uma universidade pública – cujo interesse está em qualificar debates e prezar pelos métodos científicos da pesquisa – o Todos não tenha sido procurado pela pesquisadora, ou, ainda, pelo jornalista, para apurar as acusações feitas pela sua fonte.

Sem mais, reiteramos nossa disposição para que conheçam melhor o trabalho do Todos Pela Educação de maneira que suas produções acadêmicas e jornalísticas tenham maior aderência aos fatos e maior responsabilidade perante o debate público.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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