Opinião
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5 de julho de 2019
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15:58

A coragem de Carola serve de inspiração (por Marcelo Sgarbossa)

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A coragem de Carola serve de inspiração (por Marcelo Sgarbossa)
A coragem de Carola serve de inspiração (por Marcelo Sgarbossa)
Carola Rackete, comandante do navio Sea Watch 3. (Reprodução/Facebook)

Marcelo Sgarbossa (*)

A vida deles vem antes de qualquer jogo político, afirmou a capitã alemã Carola Rackete, 31 anos, detida na ilha de Lampedusa, no Mediterrâneo, ao aportar o navio humanitário Sea Watch 3, resgatando 42 migrantes que estavam à deriva há 17 dias, sem que nenhum país os acolhesse. Rackete invocou o “estado de necessidade” para entrar no porto da Itália.

A coragem para evitar a morte de dezenas de pessoas explicitou a gravidade do retrocesso humanitário que vigora em muitos países, motivado por posições xenófobas de governos de extrema-direita. A prisão dela foi determinada pelo ministro italiano do Interior, o ultradireitista Matteo Salvini, que chamou a capitã de criminosa. Libertada três dias depois por uma juíza, com o argumento de que ela estava cumprindo o dever de salvar vidas, a capitã agora é alvo de ameaças.

De acordo com a ONU, em todo o mundo, de 68,5 milhões de pessoas são migrantes. Quase 25,4 milhões são refugiados, mais de metade menores de 18 anos. Há também 10 milhões de pessoas apátridas, às quais foram negadas a nacionalidade e o acesso a direitos básicos, como educação, saúde, emprego e liberdade de circulação.

Quase 20 pessoas são deslocadas a força a cada minuto, em decorrência de conflitos ou perseguições; aproximadamente 44.400 por dia.

O nosso Estado e a Capital gaúcha são destinos crescentes de migrantes e refugiados. Em junho, durante a Semana do Migrante, na audiência pública realizada na Câmara Municipal ficou demonstrada a ausência de programas capaz de prestar acolhimento ao grande volume de pessoas que chega diariamente por aqui, e não sabe aonde ir ou a quem recorrer, pois não encontra nenhum amparo em órgãos públicos.

Algumas organizações da sociedade acabam tentando atender de alguma forma, como é o caso da Igreja Pompeia, que desde 1958 acolhe migrantes. Só em 2018, registrou centenas de pessoas de 52 nacionalidades diferentes. Atualmente, o Rio Grande do Sul é o segundo estado brasileiro que mais recebe venezuelanos, atrás de São Paulo.

Além de não serem acolhidos, migrantes também são discriminados. O ódio e a intolerância chegam como uma forte penalidade sobre a já dura realidade do desterro. São pessoas que foram obrigadas a abandonar suas casas e seus países para tentar viver em segurança.

A exclusão, a violência, o preconceito, a omissão e a indiferença ressaltam o que há de mais negativo como característica de uma sociedade. Um ser humano não vale menos por ter nascido em outro território com mais conflitos do que o nosso.

Lavar as mãos como se não houvesse a responsabilidade humanitária de acolher quem já teve que abrir mão de seu pertencimento geográfico e cultural é uma extrema crueldade. Temos relatos do crescimento do número de suicídios entre migrantes, e aumentam os casos de adoecimento físico e mental.

A atitude corajosa da capitã Carola deve ser inspiradora para nossas ações cotidianas, para que possamos entender o valor da vida para muito além da nacionalidade ou condição social, e termos atitudes solidárias para quem busca uma pátria nova, aportando toda a sua riqueza cultural.

O Brasil e o Rio Grande do Sul são compostos por pessoas de inúmeras etnias, que migraram em outros momentos históricos, como é o caso marcante das comunidades alemães e italianas, por exemplo. Imigrantes de ontem não podem ser os xenófobos de hoje.

(*) Vereador e líder da Bancada do PT

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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