Opinião
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8 de janeiro de 2019
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17:34

Jovem tropeço (por Decio Machado Monteiro)

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Sul 21
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Jovem tropeço (por Decio Machado Monteiro)
Jovem tropeço (por Decio Machado Monteiro)
“Quem garantirá nossa soberania alimentar e dará continuidade à produção de alimentos?” (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Decio Machado Monteiro (*)

Diferentemente do governo federal, nosso jovem governador vem acenando com uma forma diferente de fazer política buscando diálogos e consensos. Isto é inovador! Quem sabe estaria gestando (perdoem-me o gerundismo) uma nova ordem política tão necessária ao nosso caminhar evolutivo neste mundo que agoniza, paradoxalmente, entre a globalização, divisionismo entre irmãos e a distorção dos princípios que comungam as grandes religiões – que talvez seja mais uma dessas crises que antecedem e revolucionam nossa história.

Por isso, ainda no caminho da boa expectativa, escrevo estas mal traçadas linhas como uma crítica fraterna e construtiva. Dada a natural dificuldade de conseguir agenda com Vossa Excelência, dificuldade natural em início de mandato, busco, ao mesmo tempo, sensibilizá-lo e informar aos demais patrícios e irmãos gaúchos. Cabe aqui um parêntese, talvez Vossa origem urbana dificulte uma visão mais apropriada sobre a realidade e, que invariavelmente ficará na dependência de seu(s) secretário(s) e assessores, mas vamos lá.

Os dados de minha argumentação encontram respaldo não apenas em ser agricultor e servidor do Incra, que me dão condições e proporcionaram conhecer, constatar e rever as realidades dos diversos rincões de nosso estado, ou por estar imbuído das atribuições funcionais que tratam sobre comercialização, ou ainda de representar a Autarquia junto à Comissão de Produção Orgânica (CPOrg/RS) e junto ao Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (PLEAPO/RS). Meus argumentos se somam aos dados do IBGE, em especial ao último censo agropecuário e a manifesta constatação conjunta com tantos outros atores, desde colegas das diversas esferas do serviço público, de técnicos da extensão rural e de representantes de diversos movimentos sociais.

Foram recenseados pelo IBGE em 2017, 365.052 estabelecimentos agropecuários, (76.420  a menos do que o censo de 2006), dos quais 83,7% são compostos por propriedades com até 50 hectares, ou seja, predominância de agricultura sob regime familiar. Observa-se, então, a diminuição de pessoas no campo: enquanto o Censo de 2006 apontava 1.231.825 habitantes em zona rural, o Censo de 2017 registra 983.751-uma diferença de 248.074 pessoas. Tais números dialogam com o envelhecimento no campo e a GRAVE crise que abate a sucessão rural. Estas constatações impõem grandes questionamentos: para onde foram essas pessoas? Por que deixaram o campo, a vida rural? Quem garantirá nossa soberania alimentar e dará continuidade à produção de alimentos?

Neste sentido, cumpre reconhecer o papel estratégico que a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Rural (SDR) desempenhou, não só em relação às políticas voltadas para agricultura familiar, mas, em especial, na condução do Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica. Aliás, questões como sucessão rural e agroecologia por si só já mereceriam uma secretaria, a exemplo de como faz o estado do Paraná que possui significativamente menos estabelecimentos rurais do que nós e é destaque em agroecologia, possuindo inclusive uma autarquia, o Centro Paranaense de Referência em Agroecologia (CPRA) desde 2005.

Cumpre aqui resgatar a questão da agroecologia e produção orgânica, não só nos aspectos afetos à sustentabilidade, “modismos”, opção de vida ou questão ideológica, mas, sobretudo, científico, pois a biologia explica muito bem a necessidade de manutenção da saúde e equilíbrio celular para que os seres vivos consigam viver e se reproduzirem. Muitos cientistas suspeitam que problemas como câncer, rejeição à lactose e ao glúten, depressão, etc., se devem em grande parte à ingestão de alimentos intoxicados/desequilibrados. A título de comparação, assim como hoje já se reconhece os malefícios em relação ao hábito de fumar, que, outrora era desconsiderado.

Ademais, apelando também para o argumento econômico-político, a sociedade gaúcha, nacional e internacional vem progressivamente demandando produtos saudáveis, de tal monta que o crescimento do setor registra cifras não inferiores a 15 % ao ano.

Isto posto, Exmo Governador – resgatando as palavras de seu conterrâneo Apparício Torelly, nosso Barão de Itararé, Não é triste mudar de ideias, triste é não ter ideias para mudar, e para além da torcida e da pré-disposição em colaborar -, rogamos, não só para que revejas a extinção da SDR mas que cries uma estrutura, nos moldes de como fizeram nossos irmãos paranaenses, para cuidar e alavancar o nosso Plano Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica, que já fez muito e pode fazer muito mais.

(*) Guardião de variedades crioulas, servidor do Incra/RS e representante da Autarquia junto ao PLEAPO/RS e a CPOrg/RS.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 

 


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