Opinião
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19 de outubro de 2018
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13:37

Se não houvesse a política de valorização do salário mínimo, valor seria hoje R$ 540,00 (por Daniela Sandi)

Por
Sul 21
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Foto: Agência Brasil

Daniela Sandi (*)

Se não houvesse a política de valorização do salário mínimo, o valor que é de R$ 954 seria em torno de R$ 540. A política de valorização criada em 2007, fruto do acordo com as Centrais Sindicais para atender a reivindicação histórica de valorização do piso nacional salarial no país, garantiu mais de R$ 400 de aumento real. Em 2011, a política foi transformada em lei e em 2015 renovada com validade até 2019.

Essa política, que está intimamente ligada à dinâmica econômica e condicionada a valorização da “produtividade social” adotou como critérios o repasse da inflação do período e o aumento real pela variação do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes. Ocorre que no período recente o governo em exercício, além de levar o Brasil para uma crise sem precedentes que estagnou o crescimento do PIB, não reajustou o salário mínimo pela inflação do período, diminuindo o poder de compra dos brasileiros que recebem o piso nacional.  Se o governo atual tivesse seguido a regra, o valor seria R$ 957 e não R$ 954,00.

Em janeiro de 2017, diante da taxa anual do INPC correspondente a 6,58% e a definição do valor em R$ 937,00, o salário mínimo acumulou perda, no ano, de 0,10%. Com a quantia de R$ 954,00 determinada para janeiro de 2018, impõe-se ao salário mínimo perda acumulada de 0,34% nos últimos dois anos, o que o faz retornar praticamente ao mesmo valor real de janeiro de 2015, conforme mostram a Tabela 1.

Cumpre alertar que a continuidade dessa política (valida até 2019) dependerá do novo presidente. O plano do candidato Haddad propõe a criação do programa Salário Mínimo Forte, com a manutenção da regra de valorização que acaba em janeiro de 2019. O texto diz que o reajuste do salário mínimo continuará a ser definido pela fórmula que assegura a variação da inflação do ano anterior, acrescida da variação do PIB de dois anos antes. Por outro lado, o plano de governo de Bolsonaro não prevê nenhum compromisso com a política do salário mínimo.

A regra de reajuste do salário mínimo também traz benefícios para os empregadores, ao contrário do que pregam as candidaturas conservadoras. A regra de reajuste dá previsibilidade aos agentes econômicos e tem como consequência a ampliação do mercado consumidor interno renovado pelas novas ocupações, aumento da renda do trabalho e por crescimento sustentado da economia brasileira.


A desvalorização do salário mínimo, com uma eventual mudança de regras, pode ter um impacto nefasto numa economia já dilacerada. São 48 milhões de pessoas que tem seus rendimentos referenciados no salário mínimo. E se for levado em conta os projetos para reforma da Previdência, esse impacto pode ser ainda mais devastador, pois quase dois terços dos beneficiários recebem um salário mínimo do INSS, por ser o piso da Previdência atrelado ao piso nacional.

A valorização dessa remuneração deve continuar, sobretudo porque o país segue profundamente desigual. O salário mínimo desempenha importantes funções no Brasil e que não podem ser abandonadas, dentre elas estão: (a) servir de proteção às categorias mais vulneráveis do mercado de trabalho, especialmente aos “perdedores da barganha salarial”; (b) combater a pobreza; (c) diminuir as desigualdades salariais segundo atributos pessoais; (d) balizar os salários de ingresso no mercado de trabalho; (e) servir de referência para os baixos rendimentos do trabalho em geral; (f) organizar a escala de remunerações; (g) inibir a rotatividade; (h) reduzir as diferenças entre as regiões e dinamização econômica; e (i) servir de piso para os benefícios da Seguridade Social (DIEESE, 2010)

Além de trazer melhorias nas condições de vida das famílias com reflexos na possibilidade de prolongar a formação educacional dos jovens, o salário mínimo é o instrumento muito poderoso de combate à pobreza e concentração de renda, portanto, o processo de valorização deve continuar para que o país se torne justo no valor atribuído ao trabalho e o texto da Constituição ganhe vida.

(*) Economista e Técnica do DIEESE.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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