Opinião
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11 de outubro de 2018
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16:36

A tortura da tortura (por Milton Pomar)

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Sul 21
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A tortura da tortura (por Milton Pomar)
A tortura da tortura (por Milton Pomar)
Reprodução

Milton Pomar(*)

Durante a ditadura militar (1964-1985), além dos presos comuns, eram torturados também os presos políticos. Era presa e torturada qualquer pessoa (estudante, trabalhador/a, artista, padre, esportista, sindicalista) que não concordava com o governo, ou que havia sido denunciada como opositora.

Dezenas de milhares de pessoas consideradas opositoras foram torturadas durante a ditadura, por policiais civis e militares e por integrantes das Forças Armadas, e um número incalculável de pessoas foram torturadas psicologicamente, através da divulgação desses fatos e do receio de serem denunciadas e presas, e da propaganda que os governos militares faziam, contra os “terroristas”, os “subversivos” e mandando embora do país (“Brasil: ame-o ou deixe-o”) quem não concordava com o que a ditadura fazia.

Sofri a tortura psicológica da possibilidade de ser capturado, torturado e preso, durante pelo menos dez anos, dos 10 aos 20 anos de idade (1968/1978). Pensava sempre como reagiria: se aguentaria até a morte, ou se “entregaria” o nada que sabia – e esse não saber era um grande problema, porque quem torturava não aceitava que o torturado não soubesse de nada, essa condição revelaria que o torturador errara o alvo. Por isso, muitos torturados foram torturados até a morte: porque realmente nada sabiam, nada tinham a revelar para os torturadores.

Imagine o que é todos os dias pensar na possibilidade de ser torturado até a morte. Alimentar essa preocupação todos os dias, com as notícias diárias de pessoas presas, torturadas, mortas ou “desaparecidas”. Milhares de dias convivendo com essa apreensão, que só aumentava cada vez mais conforme aumentava também o cerco da ditadura sobre quem era contrário a ela, com mais e mais prisões, torturas e mortes.

A tortura é considerada crime contra a Humanidade. Apesar disso, os torturadores durante a ditadura militar não foram punidos, como não são punidos os que continuam a torturar ainda hoje – a tortura continua a acontecer impunemente todos os dias, em todo o Brasil, cometida por funcionários públicos municipais, estaduais e federais que devem, por lei, proteger quem está preso, em delegacias ou penitenciárias.

Tudo isso está voltando agora, 50 anos depois, com a possibilidade da eleição no Brasil de um presidente que defende abertamente a tortura. Eu assisti ele falando isso em uma entrevista na TV, não foi ninguém que me contou. Torturar alguém é crime. É covardia. Quem tortura, sempre tortura quem está indefeso: preso, amarrado ou algemado. E em geral são muitos torturadores contra um(a) torturado(a), é uma covardia coletiva. Na maior parte dos casos de tortura, os torturadores são funcionários públicos, cujo preso está sob sua responsabilidade legal.

Defender a utilização (fazer apologia) da tortura é crime. Uma pessoa que faz propaganda da tortura e morte de opositores políticos vai fazer isso se chegar ao poder. O atual presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, é o melhor exemplo do que nos espera, se esse candidato ganhar.

(*) Professor e geógrafo

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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