Opinião
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8 de setembro de 2018
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11:00

Projeto como antídoto contra a corrupção (Tiago Holzmann da Silva)

Por
Sul 21
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Projeto como antídoto contra a corrupção (Tiago Holzmann da Silva)
Projeto como antídoto contra a corrupção (Tiago Holzmann da Silva)
“A ‘vantagem’ deveria estar não no valor, mas no resultado que é a obra pública de qualidade. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Tiago Holzmann da Silva (*)

A falta de qualidade das obras públicas é notícia recorrente na imprensa brasileira. Os exemplos são abundantes, atribuídos a licitações frustradas, contratos mal elaborados, falhas graves em projetos (ou ausência dos mesmos), obras interrompidas, superfaturadas, com desvio de recursos e corrupção.

Todos os contratos públicos exigem a realização de uma licitação, que é um procedimento obrigatório para a celebração de qualquer contrato público, como o projeto e a obra. Entre outros requisitos, a Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93) exige que a proposta seja a “mais vantajosa” para a administração pública, o que tem levado à adoção indiscriminada do critério do tipo “menor preço”. A “vantagem” deveria estar não no valor, mas no resultado que é a obra pública de qualidade. Economizar no projeto de Arquitetura e Urbanismo e Engenharia é uma forma equivocada de iniciar o processo, pois apenas ele é capaz de garantir a técnica, os materiais, a remuneração e os prazos adequados. É o projeto completo, detalhado e orçado – em suma, bem feito e embasado na realidade – que resultará em uma obra de qualidade e efetivamente vantajosa para as pessoas e a administração pública. E ele não comporta o critério raso e superficial do menor preço.

O uso do “menor preço” para contratos de obras públicas vai de encontro à doutrina jurídica e contraria as pesquisas científicas que consideram o projeto relevante para a qualidade final da obra. Autores como Koskela consideram o projeto o condutor do processo de produção, Melhado prova que a qualidade do projeto é fator de economia e eficiência na construção, Medeiros afirma que o projeto não é gasto, mas investimento em qualidade e eficiência e Rufino, por sua vez, destaca que o projeto é fator determinante para a qualidade da obra.

Segundo Melhado, quando a atividade de projeto não é valorizada, os projetos são entregues repletos de erros e lacunas, levando a perdas de eficiência nas atividades de execução e prejuízo a determinadas características idealizadas para a obra.

A questão é: por que a administração pública segue contratando por menor preço serviços que deveriam ser contratados por critérios de qualidade e técnica? O que há é um conflito, com outros atores e setores e com a própria sociedade, que contribui para a desvalorização do projeto: profissionais incapazes de definir regras e procedimentos compatíveis com a realidade; clientes interessados na obra, que não entendem a necessidade do projeto; gestores públicos, que querem economizar no momento errado; legisladores, que criam leis para acelerar a obra e desvalorizam o projeto; e órgãos de fiscalização, que preferem o mais barato ao mais econômico e, de fato, vantajoso.

Enquanto a Administração Pública não fizer uso do antídoto contra a corrupção que já está em suas mãos, com projeto completo e filtro de qualidade e técnica nas licitações e contratos públicos, o povo seguirá pagando caro por projetos baratos. É do interesse público não apenas acelerar a licitação, mas principalmente obter o melhor resultado na obra executada.

(*) Arquiteto e urbanista , presidente do CAU/RS.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 


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