Opinião
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12 de agosto de 2018
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14:38

As eleições de 2018 e os desafios da esquerda (por Raul Pont)

Por
Sul 21
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As eleições de 2018 e os desafios da esquerda (por Raul Pont)
As eleições de 2018 e os desafios da esquerda (por Raul Pont)
“Precisamos de uma Frente que vá além da vitória eleitoral”. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

 Raul Pont (*)

O pano de fundo do processo eleitoral é a situação do país após dois anos do golpe parlamentar-midiático com a cumplicidade do judiciário  que depôs o governo eleito de Dilma Rousseff.

A aliança PSDB-PMDB e centrão governam, sem legitimidade e sem eleição, sob o programa “uma ponte para o futuro” que é o oposto do governo eleito em 2014.

O golpe neoliberal sustentado pelos partidos citados atende aos bancos, aos rentistas e demais setores oligopolizados. Não passou por eleições, mas impôs ao país um programa não eleito, subordinado aos ricos e ao alinhamento subserviente aos EUA e a UE.

Seus representantes votaram a favor do impedimento de Dilma, das “pautas bomba” de Eduardo Cunha e sustentaram as reacionárias reformas praticadas recentemente com o congelamento dos gastos sociais, da entrega do patrimônio público e liquidação da Petrobrás e das retrógradas alterações nas leis trabalhistas. É o programa do FMI, é o programa da burguesia brasileira, para um país que se desagrega e se subordina crescentemente ao capital internacional.

Essa hegemonia do rentismo financeiro, operada pela quadrilha que dirige o governo Temer ocasionou um verdadeiro terremoto no sistema partidário e eleitoral brasileiro.

Os mais de 30 partidos existentes não conseguem mais esconder seus verdadeiros propósitos. Não possuem programas nem práticas condizentes com seus nomes e promessas. Ao votarem a favor do golpe e das medidas contra os trabalhadores, ao venderem o petróleo do Pré-Sal e a Petrobras e extinguirem as políticas de saúde e de acesso à educação desmascaram-se como partidos dos bancos, das elites e do capital internacional.

Aqui no Rio Grande, os trabalhistas do PTB, os popular-socialistas do PPS e os progressistas do PP que estavam no governo Sartori, agora estão todos juntos no ninho tucano do PSDB, alinhados com um projeto neoliberal, liquidador da soberania nacional e do Estado. O oposto do que pregavam os trabalhistas, as origens arenistas do PP e os comunistas renegados do PPS.

Sartori reúne uns dez partidos cuja siglas e propósitos, também, nada tem a ver com o que o governo pratica. Ou então, se a prática prevalece, são siglas hipócritas e que existem apenas para iludir o eleitor e mascarar seu verdadeiro significado. Exemplos maiores são os socialistas do PSB, os social-cristãos do PSC e os nacionalistas do PMN cujos programas são distintos do que pensa e do que faz Sartori.

O quadro nacional não é muito diferente, apenas agravado pela crise de legitimidade e representação das forças mais comprometidas com o governo golpista como o MDB, o PSDB, o DEM e o PP. Os primeiros apresentam índices mínimos de aceitação e os outros nem cogitam candidaturas próprias, espalham-se oportunisticamente em variadas coligações estaduais.

As pesquisas apontam que as candidaturas que de longe secundam o favorito Lula são as de Jair Bolsonaro, com suas teses autoritárias, no PSL (partido na sua origem liberal fundamentalista) e Marina Silva, da Rede (partido inexistente e de programa indefinido). Esses casos dão a dimensão da crise partidária no país.

A tão anunciada e reivindicada reforma eleitoral nas mãos do atual Congresso não avançou em mudanças democráticas e que melhorassem o sistema político-eleitoral no Brasil.

O fim do financiamento empresarial dos candidatos foi alcançado por decisão do STF que o considerou inconstitucional. Se dependesse do Congresso essa mudança nem ocorreria, apesar da evidente comprovação de que aí residia um dos elementos centrais da corrupção.

A nova legislação aprovada pelo Congresso, por maioria, não criou nenhum elemento novo positivo. Foram mantidos: o voto nominal, as coligações proporcionais até 2020 e o financiamento privado (pessoas físicas) aos candidatos.

A maioria congressual trocou o fim do espaço dos programas partidários na TV e a diminuição da campanha eleitoral no tempo e na TV pela criação de um Fundo Eleitoral que permite uma concentração dos recursos nos já portadores de mandato parlamentar.

Apenas um mês e meio de campanha, menos tempo de rádio e TV e criminalização da atividade político- partidária são decisões que dificultam a experiência democrática, a valorização do debate e da propaganda e favorece quem já tem conhecimento público ou poder econômico para uma campanha curtíssima.

No campo popular, a aliança nacional do PT, PCdoB e PCO foi uma conquista difícil mas memorável, nas condições objetivas em que ocorre. Em torno de 20 estados e entre eles os mais importantes (SP, MG, RJ, RS, PR, BA, SC, CE, MA, RN) a chapa majoritária é composta por estas forças e liderada pelo programa e o favoritismo da chapa nacional com Lula e Manuela, aprovada por estes partidos. Em outros Estados a Frente apoia candidaturas dos setores do PSB que estão em disputa com os rumos do Partido e desde agora comprometidos com a candidatura Lula.

As candidaturas de Ciro Gomes (PDT) e de Guilherme Boulos (PSOL-PCB) já sinalizam um compromisso de unidade no segundo turno e uma identidade de programa e propostas que identifiquem bem os inimigos comuns: Alckmin, Meirelles, Bolsonaro e as políticas praticadas pelo governo golpista de Temer e os aliados menores que o sustentam.

Diante deste quadro e do inimigo comum e seu programa, o grande desafio da esquerda brasileira, sua tarefa histórica, seria aproveitar a disputa eleitoral para a construção de uma unidade que vá além da eleição, que garanta um próximo governo e, principalmente, construa uma Frente político-partidária permanente, com unidade programática e coordenação nacional. Uma Frente que vá além da vitória eleitoral, de governar junto e de se apresentar como uma Frente partidária para a sociedade. Uma unidade que sustente o próximo governo e já prepara sua expressão e organização para as eleições municipais.

Não há mais condições de rompermos a crise do sistema eleitoral e partidário sem apontarmos para a sociedade a formação de um bloco sólido, plural, mas unificado em torno de um programa comum que a população se identifique. A eleição precisa ter o caráter pedagógico da identidade com um programa, um projeto de longo prazo, animado por uma Frente política ampla mas com uma coerência programática e objetivos comuns.

Nesse sentido, uma Frente sólida, programática e com candidaturas unitárias fortalece e permite o crescimento de todos os componentes pela atração que a unidade exerce sobre amplos setores da sociedade. Principalmente nesta conjuntura, quando é evidente a crise generalizada dos partidos políticos e seu afastamento da maioria da população.

Nesse momento em que temos um inimigo comum, no país e no Estado, em que possuímos uma grande identidade de tarefas a exercer nos governos, não se justifica termos duas ou três alternativas para a chefia de governo.

Nossa tese é de que isso não prejudica as nominatas proporcionais mas, ao contrário, a unidade atrai amplos setores da sociedade na razão direta da demonstração de força e capacidade de governar.

Exemplo concreto no caso do RS, nas duas últimas eleições gerais, as candidaturas do PSOL para governador alcançaram menos da metade dos votos recebidos na chapa proporcional somados os votos nominais e na legenda. Menos de 50% dos votos proporcionais. Para o eleitor a perspectiva de força real, de capacidade de governar, leva a um voto útil na chapa majoritária. E, num sistema de dois turnos, isso mais se justifica. Nas municipais de 2016, em Porto Alegre, a soma das candidaturas do PT/PCdoB e do PSOL/PCB alcançaram quase 30% dos votos mas nenhuma das suas candidaturas foi ao segundo turno. Não é coincidência que esse sistema foi imposto pela direita após os desempenhos de Lula em 1989 e 1994.

Nesta eleição fica o desafio. Ousado, difícil, mas fraterno no gesto e na grandeza da conjuntura em que vivemos. Nessa crise político-partidária, a potencialização de uma campanha unitária teria resultados fantásticos, com ganhos proporcionais para todos.

Se isto não for possível, ou não for alcançado, ao menos, nossas forças precisam assumir a defesa de um conjunto de pontos comuns em torno dos direitos do trabalho que foram agredidos, da democracia profunda e da soberania nacional.

Impõe-se, no mínimo, a declaração de identidade na campanha, de apoio mútuo em relação ao segundo turno e da crítica dura, cristalina aos golpistas e ao estado de exceção e autoritarismo reinantes.

Com isso, mais perto estaremos, pela identidade comum, de dar os primeiros passos de um programa que unifique o conjunto da esquerda. Estaremos construindo a proposta de unidade permanente através de uma coordenação nacional que promova um processo de Frente política orgânica entre nossos partidos.

(*) Professor e ex-prefeito de Porto Alegre.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 


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