Opinião
|
26 de junho de 2018
|
18:14

Que falta faz O Pasquim, que surgiu há 49 anos (por André Pereira)

Por
Sul 21
[email protected]
Que falta faz O Pasquim, que surgiu há 49 anos (por André Pereira)
Que falta faz O Pasquim, que surgiu há 49 anos (por André Pereira)
Reprodução

 André Pereira (*)

Um dia após a inquisição covarde e machista que um programa da mídia brasileira – Roda Viva – impôs à presidenciável deputada Manuela D’ Ávila (PCdoB), envergonhando o jornalismo decente, relembro com saudades de O Pasquim – que nos ajudou a respirar no fedor dos idos do ódio e da intolerância do passado recente, que se renovam tristemente nos dias de hoje.

Em 26 de junho de 1969, nasceu o lendário “O Pasquim” que desafiou a ditadura civil, militar e midiática implantada em 1964 no país.

‘Nanico alternativo’ “O Pasquim” surgiu na carona do movimento frenético da chamada contracultura emblematizado por maio de 1968 em Paris e indignado com o ataque brutal aos direitos humanos que o regime totalitário agudizava no Brasil.

O semanário editado na praia carioca de Ipanema, por inspiração de um gaúcho de Passo Fundo, Tarso de Castro, chegou à tiragem de 225 mil exemplares repercutidos com leitura de 2 milhões de pessoas, nos anos 70 e 80.

Foi um marco no jornalismo impresso do período anterior à evolução tecnológica das comunicações, com computadores, internet, celulares que facilitam a veiculação – mas não o conteúdo do produto oferecido, ontem e hoje.

Contra o cenário dos jornalões metidos a ‘gente do bem’, O Pasquim foi irreverente, desbocado, sarcástico e provocador.

E, por isso, logicamente padeceu com a censura, especialmente quando a equipe foi presa no final de 1970 e o jornal foi feito e refeito várias vezes por duas mulheres Martha de Alencar e Bárbara Oppenheimer (gaúcha e à época esposa de Tarso) com textos e desenhos enviados por Millôr Fernandes, entrincheirado em seu apartamento na zona sul do Rio de Janeiro.

Com entrevistas especiais polêmicas, publicadas com suas transcrições brutas sem revisores, que incluíam palavrões, às vezes substituídos por asteriscos na capa (como na edição dedicada a ouvir a musa do cinema Leila Diniz), virou referência jornalística, embora seus múltiplos editores (primeiro Jaguar e Sérgio Cabral, depois Ziraldo e Paulo Francis, mais tarde Flavio Rangel e Luiz Carlos Maciel e, após, Millôr) sempre dissessem que nada era feito com planejamento.

O certo é que, nos encontros de super egos, se entornavam litros de bebidas alcóolicas mensurados com a criatividade que brotava, caudalosa e alucinante, em mesas de bar, rodeados de intelectuais, músicos, cantores, escritores e mulheres bonitas e bronzeadas, onde encenavam insólitas reuniões de pauta.

No cenário cinzento e opressivo daqueles anos de chumbo, O Pasquim era um respiro para as gerações de antanho. Quando chegava semanalmente às bancas de jornais, soava como uma música de Chico Buarque que vencia a censura e surgia com o canto do que queríamos dizer e simplesmente não podíamos, sob o maldito domínio do coturnos e dos punhos de renda de sempre.

(*) Jornalista

§§§

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora