Opinião
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15 de junho de 2018
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17:56

Futebol e Justiça (por Maister F. da Silva)

Por
Sul 21
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“Continente europeu exibe seus selecionados de descendentes das ex-colônias” (Équipe de France de Football/Facebook)

 Maister F. da Silva (*)

Tempos de Copa do Mundo.

O futebol de repente tem a culpa inteira de todos os males, sufoca a luta de classes, se ele não existisse os pobres fariam a revolução social e os analfabetos seriam doutores, é a única religião sem ateus, a bola está rolando, todos irão sucumbir ao ópio do povo. Até os críticos mais ferrenhos irão torcer escondidinhos, em segredo.

Arte e emoção são duas das coisas mais valiosas ao sistema capitalista, espetáculo, festa, um negócio perfeito para os mercadores, merece lugar de destaque no altar do deus dinheiro. Os melhores dentro das quatro linhas são mercadorias, cifras, são livres para serem negociados, emprestados, comprados e vendidos.

A “indústria futebolística”, não reconhece o futebol, aquele que o povo reconhece, sem compromisso, abusado, que quando se entra em campo e se joga com felicidade pouco importa o resultado, ganhar ou perder. Esse futebol caiu em desgraça para a indústria do futebol, ela precisa de resultados, coletivos e individuais, precisa prestar contas aos seus patrocinadores, gerar lucros e dividendos.

E os jogadores?

São jovens que em sua maioria saíram de uma condição social e econômica de dificuldades, com pouca formação (a maioria não concluiu sequer o ensino médio) e foram encurralados pela busca da glória e dinheiro, mal eles sabem que são prisioneiros da indústria e não tem o direito de decepcionar seus admiradores.

No futebol, assim como na indústria somos produtores de artigos de exportação: produzimos para quem pode pagar. Os que conseguem a façanha de serem exportados são acolhidos como imigrantes de luxo. A grande maioria negros ou mestiços, desconhecem que sua arte não pode esconder a cor de sua pele, qualquer deslize em campo ou fora dele serve para ouvir os mais enfadonhos insultos.

A indústria os proíbe lembrar de onde vieram, falar ou portar mensagens sobre política ou questões sociais é terminantemente proibido. Com multa ou expulsão.

Casos emblemáticos como Maradona e Adriano, considerados beberrões, putanheiros e falastrões. Perseguidos por jornalistas, que antes os aplaudiam e exortavam os deram como mortos após serem acometidos pela doença do futebol-fama. Pagaram o preço de pensar que poderiam ser insolentes com a indústria, como eram dentro das quatro linhas.

O povo em solidariedade não os condenou ao esquecimento.

Como o capital, não tem pátria ou fronteira. Na copa irão desfilar seleções de todos os continentes, o continente europeu irá exibir seus selecionados de descendentes das ex-colônias que fizeram sua fortuna.

Ironias do futebol.

A Holanda tem em suas maiores estrelas da história descendentes de escravos do Suriname e na França seu maior ídolo é filho de argelinos.

Futebol e justiça, não.

O capitalismo sequestrou o futebol.

Mas ele ainda é o esporte do povo. Dificilmente há uma comunidade que não tem um campinho pra uma pelada da molecada, o futebol da firma, dos amigos de infância e adolescência.

O futebol resiste!

(*) Militante do Movimento dos Pequenos Agricultores

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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