Opinião
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18 de maio de 2018
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21:06

O futebol é o ópio do povo e o narcotráfico da mídia (por Luciano Fetzner)

Por
Sul 21
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O ex-jogador de futebol argentino Diego Maradona, no encerramento da campanha do presidente venezuelano Nicolás Maduro para as eleições presidenciais no próximo domingo. (Twitter/Divulgação)

Luciano Fetzner (*)

Não gosto de emitir opiniões sobre a Venezuela. Toda “informação” que vem de lá está sempre recheada de conteúdo ideológico. Parece que ambos os lados desta polarização insana – que tomou conta de qualquer papo sobre política no continente latino-americano – estão dando atenção especial para a disputa pela narrativa da história recente Venezuelana. O que sobra é pouquíssima margem para relatos que possam ser encarados como imparciais.

Todavia, a grande mídia brasileira adotou uma postura recente que deixa explícito: com a aproximação do período eleitoral, escolheram um lado desse ringue para se alinhar. Aproveitam as visitas de Grêmio e Corinthians ao país vizinho para, quase que indiretamente (apesar de que com pouca discrição), despejarem sua linha editorial, apostando na narrativa da direita, apoiada por Trump, de que “a Venezuela está sendo destruída pelos comunistas”. E isso é digno de nota e profunda reflexão.

Anos atrás, assisti ao excelente documentário “A Revolução Não Será Televisionada”, que narra o processo de golpe jurídico-midiático sofrido pelo então presidente Hugo Chávez. A obra descreve detalhadamente todo o processo que – utilizando o jargão do futebol – aos 45” do segundo tempo, foi derrotado, graças à massiva mobilização popular em defesa de seu presidente democraticamente eleito (qualquer semelhança com o processo sofrido por Dilma no Brasil em 2016 não é mera coincidência).

Como o golpe não deu o resultado esperado, outras forças começaram a se movimentar. Vieram então boicotes econômicos, manobras com o preço do petróleo, financiamento de milícias e toda sorte de sabotagens. Até mesmo lock-outs foram promovidos por redes de supermercados venezuelanos: escondiam alimentos com o claro intuito de se construir no imaginário popular que o país estava colapsando.

Em 2013, pós a estranha morte de Hugo Chávez – que logo após ter sido sequestrado para a Costa Rica com apoio estadunidense apareceu adoecido de câncer – seu sucessor Nicolás Maduro assume o comando do país. Maduro, mesmo tendo sua indicação ao governo legitimada nas urnas, o mais comum de se ver são referências pejorativas ao seu governo, desde acusações de fraude até a pecha de ditadura. Assim como estamos vendo acontecer no Brasil, o Judiciário de lá entrou em cena. Tentaram extrapolar às suas funções, desequilibrando os 3 poderes. Mais uma vez, a soberania popular deu guarida ao governo venezuelano, levando o Judiciário a ser reformado e a crise solucionada.

Durante este período todo, a Venezuela foi gradativamente se tornando o centro das discussões da geopolítica sul-americana, o que torna claro o porquê do gigantesco volume de produções políticas disputando a “verdadeira verdade” sobre o que tem acontecido por lá. De minha parte, não pretendo fazer juízo de qual o grau de culpa do governo ou dos fatores externos na crise que o país está atravessando, até porque o mundo passa por uma crise sistêmica e cíclica do capitalismo que atinge em maior ou menor grau a praticamente todos os países.

Mas arrisco desta vez uma opinião. Ao contrário do que aconteceu no Brasil, na Venezuela o golpe, primeira cartada, não foi bem sucedido. A segunda cartada está sendo a difamação, a crise e a culpabilização do governo por tudo. Na sequência disso, presumo que transcorrerá discussão internacional sobre “salvar a Venezuela”, via intervenção militar coordenada pelas tropas estadunidenses, sedentas por petróleo. É bom lembrar que não faz muito que Temer permitiu que tropas de Trump se movimentassem na Amazônia, sob o pretexto de manobras humanitárias.

Podem chamar de paranóia, teoria da conspiração, alarmismo ou qualquer outro adjetivo, mas temo que o embrião de um processo de intervenção na América Latina, nos mesmos moldes do que vemos há décadas no Oriente Médio acontecer, pode estar sendo gestado na nossa vizinha Venezuela. E não esqueçam que por essas bandas daqui, além do petróleo, também temos a maior floresta tropical e as maiores reservas de água potável deste planeta.

Como sabiamente afirmara Millôr Fernandes: “O futebol é o ópio do povo e o narcotráfico da mídia”. Fiquemos atentos ás próximas rodadas… Nunca se sabe quando será o próximo 7×1.

(*) Graduando em ciências sociais e diretor secretário-geral do SindBancarios Porto Alegre.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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