Opinião
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16 de abril de 2016
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10:00

Os Deuses Malditos (por Marino Boeira)

Por
Sul 21
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Os deuses malditosVocê pode mergulhar na essência de um acontecimento histórico relevante lendo o que os grandes historiadores (Eric Hobsbawm,por exemplo ) disseram dele ou como um grande artista tratou do assunto. Muitas vezes, a segunda opção, mesmo que se percam alguns detalhes, pode ser muito mais importante.

Tomamos o caso do nazismo e sua introjeção na sociedade alemã. Todos nós sabemos que Hitler representou num primeiro momento um movimento contra a nobreza prussiana e até mesmo a alta burguesia alemã. Seus seguidores iniciais oram buscados no populacho de Munique. Sua primeira força de ataque contra as instituições, foi formada pelas SA de Ernst Röhm, herdeira dos freikosp anti-comunistas da República de Weimar.

Quando seu movimento se tornou vitorioso por via parlamentar em 1933, Hitler tratou de se desfazer dessas companhias pouco recomendáveis (Rohm foi preso e assassinado por sua ordem) para se aproximar da alta burguesia alemão, que passou a ver nele o único político capaz de afastar o “perigo comunista” que poderia afetar seus negócios.

Esse momento fundamental na história da humanidade, que permitiu a Hitler dar os passos adiante na consolidação do regime nazista e posteriormente na efetivação das suas guerras de conquista, tem o seu melhor retrato no filme Os Deuses Malditos (Gotterdammerung ´La Caduta degli Dei e em inglês, The Dammed) de Luchino Visconti, rodado em 1969, com Dick Bogard, Helmut Berger, além da brasileira Florinda Bolkan..

Visconti (1906/1976), homossexual e comunista, foi um dos maiores diretores do cinema italiano, se não o maior e tem em sua filmografia obras fundamentais, como Rocco e seus Irmãos (Rocco e suoi fratelli); As Noites Brancas (Le Notti Bianche); O Leopardo ( Il Gattopardo); Senso (Senso)  e Morte em Veneza (Morte em Veneza), além de um dos melhores episódios de Boccacio 70 ( Il Laboro)

Os Deuses Malditos conta a história da família do barão da indústria do aço Joachim Von Essenbeck e mostra a longa desagregação dessa família, oriunda da nobreza, que vai se mesclando com a ralé populista na sua ânsia de preservar suas posses que imaginam ameaçadas pelo comunismo ascendente na Alemanha.

Embora Visconti nunca tenha escondida sua opção pelo marxismo, a maneira como ele mostra esta fusão entre os novos capitalistas, herdeiros da nobreza prussiana, e a direita populista do nazismo, é feita através de imagens cinematográficas poderosas e não com um discurso convencional.

Um bom exemplo disso, sempre citado pelos críticos, é de que como os símbolos do nazismo, principalmente a suástica, começam pouco a pouco a fazer parte da decoração do palácio da família Essembeck, levando os espectadores a perceber (ou deveriam perceber) que apesar de algumas diferenças iniciais entre seus segmentos ( no caso a nova nobreza capitalista e  os populistas da direita nazista)a história da humanidade é sempre a história das lutas de classe, como Marx já ensinara.

Obs. Não confundir Os Deuses Malditos, com Os Deuses Vencidos (Yong Lions), outro bom filme sobre o nazismo, feito por Edward Dmytryk (também acusado de comunista), de 1958, com Marlon Brando e Montgomery Clift.

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Marino Boeira é professor universitário.

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