Opinião
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25 de maio de 2015
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11:29

Manifestação pela manutenção da Uergs em resposta à jornalista Rosane de Oliveira (por Chico Machado)

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Sul 21
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Manifestação pela manutenção da Uergs em resposta à jornalista Rosane de Oliveira (por Chico Machado)
Manifestação pela manutenção da Uergs em resposta à jornalista Rosane de Oliveira (por Chico Machado)

Escrevo estas linhas na condição de ex-professor dos cursos de artes da UERGS, nos seus seis primeiros anos de existência, em resposta aos argumentos apresentados pela jornalista Rosane de Oliveira na edição do dia 5 de maio no jornal Zero Hora. Escrevo estas linhas também porque dezenas de ex-alunos me solicitaram para que eu assim o fizesse. Faço isso me desculpando ao eventual leitor pelo fato de que não sou um especialista no assunto, e tampouco uma pessoa das letras, apenas alguém que teve uma experiência como professor dentro desta universidade.

A primeira questão apontada pela citada jornalista diz respeito ao motivo da existência da nossa universidade estadual: “Por que mesmo um Estado que não consegue oferecer educação básica de qualidade precisa de uma universidade própria?” Uma parte do que me parece ser a resposta a esta pergunta parece tão óbvia que talvez nem precisasse ser dita. Mas como não vivemos em tempos e em terras onde o bom-senso impere, não é demais lembrar que uma educação básica de qualidade passa pela boa formação dos profissionais que lá irão atuar, sendo esta uma das razões de ser das universidades públicas, através dos cursos de licenciatura. Além do mais, não me parece inteligente, a iniciativa de acabar com uma formação de ensino superior que opera com grande qualidade, baseado no argumento que o ensino médio e básico não tem a qualidade que se espera. Parece-me uma questão de diagnóstico mal feito, como cortar as orelhas porque os olhos não conseguem enxergar, ou arrancar a cabeça porque as pernas são deficitárias.

Mas poderia se objetar, a partir do ponto de vista apresentado pela jornalista, que para isso já existem as universidades federais presentes no nosso Estado. Então para que precisamos de uma universidade estadual? A UERGS, por seu formato descentralizado, tem Unidades Universitárias em 24 municípios gaúchos, em todas as regiões do Estado. Assim, além de marcar presença e influir no desenvolvimento de cidades não cobertas pela rede federal de universidades, é importante ressaltar, conforme apontado pela Assessoria de Comunicação da UERGS em pronunciamento oficial emitido como resposta à mesma jornalista, que tal instituição tem como diferencial ofertar cursos de graduação e de pós-graduação voltados para demandas regionais especificas.

Sim, é fato que alguns técnicos da Fazenda, num exercício desconectado da realidade da educação, garantam que seria mais barato oferecer bolsas em faculdades comunitárias do que manter a UERGS. Bem, se penso em números, imagino que também seja um enorme desperdício jogar fora os investimentos e o dinheiro já gastos na implementação da UERGS ao longo de mais de uma década. Ademais, conforme novamente o pronunciamento oficial referido acima, a UERGS recebeu destaque por ser uma das cinco instituições do Estado que mais captou recursos financeiros no biênio 2011 e 2012, no montante de 25% do seu orçamento total anual.

Além disso, correndo sério risco de ser injusto com meus colegas, parece-me que as motivações e os modos de ser das universidades comunitárias do Estado (PUCRS, UNISINOS, FEEVALE, UPF, entre outras), apesar da sua inegável qualidade, faz com que elas não tenham o mesmo caráter das universidades públicas, o que acaba de alguma forma por interferir na sua filosofia e no seu modo de pensar e praticar o ensino (e acho que seria ingenuidade não considerar isso).

Quanto ao fato da UERGS “navegar ao sabor da política de cada governo”, este realmente é parte do seu problema desde o início. Inaugurada ao fim do exercício do Governo de Olívio Dutra, nossa universidade estadual sofreu sérios danos com o processo de sucateamento e as tentativas de desmantelamento nos governos de Germano Rigotto e de Yeda Crusius (e que tememos que ocorra agora com o atual governo). Pela dificuldade de manter sua autonomia, submetida que foi aos interesses dos governantes estaduais e seus partidos, a UERGS tem desde o início de sua história, uma trajetória de luta aguerrida e constante pela sua sobrevivência.

Em contrapartida, penso que é justamente este constante exercício de cidadania, na luta pela manutenção dos direitos adquiridos (que tive a necessidade e a honra de participar em seus seis anos iniciais), e o caráter de formação crítica praticada pela UERGS que eu vivenciei, que motiva seus ex-alunos a saírem em defesa dessa instituição, conclamando seus ex-professores (este que vos escreve, inclusive) a se engajarem e se manifestarem publicamente em favor de sua manutenção.

.oOo.

João Carlos (Chico) Machado é artista plástico, doutor em Poéticas Visuais pelo PPGAV/UFRGS e professor do Departamento de Arte Dramática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

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