Opinião
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22 de maio de 2010
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18:29

Que vergonha!

Por
Sul 21
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* Por Maria Lúcia Sampaio

Não entendo nada de futebol, mas como meu pai sempre foi torcedor fanático do Internacional, aprendi a gostar e, de vez em quando, assisto a um jogo na TV. Por conta do marido gremista, vi o jogo do Grêmio contra o Santos. Ao ouvir o repórter dizer que os gaúchos cantaram o Hino do Rio Grande do Sul, ao mesmo tempo em que era cantado o Hino Nacional, me enchi de vergonha.

No dia seguinte, estava no site da ESPN/Br que, além disto, como réplica à torcida santista que gritava “o imortal morreu”, os gaúchos chamaram os santistas  de “filhos de nordestinos”, de “povo sem cultura” e depois cantaram novamente o hino do nosso estado.

Intencionalmente, escrevo gaúchos e não gremistas, porque é  assim que fica para o resto do Brasil. Basta dar uma olhadinha em alguns dos quase 300 comentários dos internautas.

Que mico, meu Deus!

Durante quase dez anos morei fora do Rio Grande e, mesmo no exterior, convivi com gente dos mais diversos estados do Brasil.

Foi uma belíssima experiência!

Nunca quis ser diferente dos habitantes do lugar em que estava vivendo, muito pelo contrário. Quanto mais me mimetizava melhor (na época do golpe de Pinochet, consegui me safar da Dina, a polícia política, porque pensaram que eu era chilena).

Em 1981, quando retornei para Porto Alegre, algumas coisas esquisitas me chamaram a atenção. Como gosto muito de música, e era (e sou) fã da Elis, me pareceu estranho o pouco caso com que era tratada. Todo o Brasil a reverenciava, mas para muitos gaúchos ela era uma traidora porque, entre outras coisas, perdeu o nosso sotaque.

Mas, bah tchê!

Com o passar do tempo, vi novos hábitos se estabelecendo: a popularização do chimarrão entre os jovens e a criação de bares onde só se executava música nativista, entre outros. Vi também o crescimento de um sentimento (?) novo para mim: o orgulho de ser gaúcho. Os conceitos de nativismo, tradicionalismo e gauchismo tornaram-se importantes temas de debate, estabeleceu-se uma espécie de louvor à tão decantada identidade do gaúcho.

O MTG vai ganhando força, com a pretensão (conforme está em sua Carta de Princípios) de “promover, no meio do nosso povo, uma retomada de consciência dos valores morais do gaúcho”.

Ué, então quer dizer que existem valores morais específicos dos que nasceram no nosso estado?

Os festejos da Semana Farroupilha se tornaram mais importantes do que a Semana da Pátria, o “orgulho gaúcho” tomou conta de corações e mentes e, enquanto isso, nosso Estado entrou em um período de declínio.

Surpresos, descobrimos que temos políticos corruptos e servidores públicos desonestos; que já não é unânime a nossa condição de “celeiro do país”; que o nosso ensino não é mais o melhor do Brasil; que também temos a nossa própria “guerra do tráfico” e crimes políticos. Enfim, vemos (ou deveríamos ver?) que o nosso estado tem os mesmos problemas do restante do país. Se algum dia fomos, hoje não somos os melhores!

Dá tristeza pensar que estamos recorrendo à arrogância para não encaramos nossos problemas.

O comportamento dos gaúchos ontem, no jogo Santos x Grêmio, desrespeitando a execução do Hino Nacional e sendo preconceituosos  com os nordestinos, será uma demonstração desta arrogância?

Fico com medo de onde isto pode nos levar. Afinal, a “Carta de Princípios” do MTG, aprovada em 1961 e ainda em vigor, diz ser um dos objetivos daquele movimento: “Buscar, finalmente, a conquista de um estágio de força social que lhe dê ressonância nos Poderes Públicos e nas Classes Rio-grandenses para atuar real, poderosa e eficientemente, no levantamento dos padrões de moral e de vida do nosso Estado, rumando, fortalecido, para o campo e homem rural, suas raízes primordiais, cumprindo, assim, sua alta destinação histórica em nossa Pátria.”


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