Geral
|
7 de setembro de 2011
|
16:35

Liberdade de imprensa e regramento democrático

Por
Sul 21
[email protected]

Há muitas definições possíveis de democracia. Talvez a mais básica seja a de autoria de Norberto Bobbio, enunciada no livro O futuro da democracia – uma defesa das regras do jogo. Como fica explícito no subtítulo da obra, é o estabelecimento de regras que define o caráter do jogo político. Segundo Bobbio, “por regime democrático se entende principalmente um conjunto de regras de procedimento para a formação das decisões coletivas, nas quais é prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados”.

Leia Mais:

— Sem proposta do governo, regulação da mídia ainda é tabu

— Marco regulatório da mídia proposto pelo PT divide base e oposição

— PT amplia alianças, garante cota a mulheres e defende marco regulatório da mídia

Regras que precisam ser respeitadas e que são imprescindíveis, em uma democracia, tanto para limitar o poder do Estado-soberano, por meio de uma Constituição, quanto para disciplinar as liberdades e regular os direitos dos cidadãos e da sociedade civil. A ausência de regras de participação,diferente do que se imagina, gera anarquia ou autoritarismo, nunca uma democracia.

A democracia é concebida como um processo, que pode ser mais ou menos democrático. Robert Dahl, que formulou o conceito de poliarquia para definir as democracias realmente existentes, demonstra que quanto mais inclusivo, quanto mais participativo, quanto mais responsivo (ou seja, quanto mais capaz de responder às demandas dos cidadãos) for um sistema político, mais democrático ele será.

Estas formulações se adéquam perfeitamente à realidade brasileira de hoje e à discussão em curso na mídia do país, principalmente desde o encerramento do 4º Congresso do PT, ocorrido no último domingo (04), no qual foi aprovada uma moção de apoio ao estabelecimento de um “marco regulatório das comunicações”.

Sem ao menos explicitar o teor da moção aprovada, amplos setores da mídia nacional reassumiram suas posturas históricas e se colocaram peremptoriamente contrários ao estabelecimento de regras de procedimento para a normatização das comunicações no Brasil. Voltaram a defender, como fazem há tempos, que em uma sociedade democrática não podem existir regras que limitem o poder da imprensa e das comunicações.

Segundo esta concepção, a imprensa seria mais soberana que o Estado, pois não estaria submetida a nenhuma regra. Não se trata aqui de defender as propostas do PT que não são, na verdade, muito diferentes das propostas que já foram aprovadas pela 1ª Conferência Nacional de Comunicação, realizada em 2009, ou das propostas elaboradas pelo ex-ministro das comunicações Franklin Martins, em 2010.

Trata-se, aqui, de defender a necessidade da existência de regras que normatizem os procedimentos da imprensa, disciplinando a atividade e impedindo a oligopolização ou a monopolização do mercado. Trata-se de admitir a criação de um Conselho Nacional de Comunicação, que regule as atividades de imprensa e no qual estejam representados tanto os profissionais quanto as empresas de comunicação, além do Estado e de outros setores da sociedade civil.

Trata-se de defender a liberdade de expressão, garantindo a livre manifestação das opiniões, via imprensa, primeiro direito cerceado em qualquer governo autoritário. Regular as atividades de imprensa não implica a regulação dos conteúdos veiculados pela mídia. Estes precisam manter-se sempre intocáveis, submetidos apenas às sanções penais e cíveis, em caso de abusos contra pessoas, instituições ou o próprio Estado. Garantir o direito de expressão e de manifestação implica, entretanto, garantir a diversidade de opiniões, só possível com a existência de diferentes veículos de comunicação, sem que os maiores eliminem os menores.

No Brasil, a resistência e o combate à ditadura levaram à idéia de que toda e qualquer regulação da mídia corresponde a autoritarismo. Em qualquer país democrático, entretanto, há regras de procedimento estabelecidas e que regulam a atuação da imprensa e sua propriedade. Para evitar dúvidas e mal entendidos urge que o próprio governo federal tome a iniciativa de reabrir o debate na sociedade, propondo marcos para a regulação dos meios de comunicação.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora