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5 de setembro de 2012
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09:00

Cavaletes e cartazes são alvo de incomodados com propaganda eleitoral

Por
Sul 21
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Cavaletes e cartazes são alvo de incomodados com propaganda eleitoral
Cavaletes e cartazes são alvo de incomodados com propaganda eleitoral
Movimentos na internet incentivam rabiscos em propagandas irregulares. | Foto: Sujo Sua Cara

Samir Oliveira

Em época de eleição, as cidades ficam entupidas de propaganda política, com cartazes e cavaletes de candidatos distribuídos em muros, calçadas e canteiros de ruas e avenidas. Só em Porto Alegre, são 600 candidatos a vereador e sete à prefeitura, cada um com um enxame próprio de material de campanha.

Irritados com os eventuais abusos nesse tipo de propaganda, grupos de cidadãos começam a se formar nas redes sociais para hostilizar os materiais que são utilizados de forma ilegal pelos políticos, como cavaletes que atrapalham a passagem de pedestres – o que é proibido pela Lei 9.054 de 1997, que estabelece normas para as eleições.

Há pelo menos duas comunidades no Facebook que incitam a população a rabiscar os cartazes e cavaletes irregulares. O grupo Sujo Sua Cara foi uma iniciativa de porto-alegrenses criada em 2010 e já conta com mais de 4 mil apoiadores. E o grupo Cavaletes Malditos foi criado na semana passada por uma moradora de Campinas, em São Paulo.

Em ambas as comunidades, as pessoas enviam fotos de todo o pais com propagandas alteradas por desenhos no rosto dos candidatos, desde bigodes e chifres até adereços, como óculos de carnaval, perucas e maquiagem. Os responsáveis pelos grupos ressaltam que a ação deve ocorrer somente sobre os materiais que infringem a legislação, mas representantes do Ministério Público asseguram que a prática configura em crime, pois trata-se do impedimento de publicidade eleitoral.

“É uma das piores formas de divulgação”, diz moradora de Campinas sobre cavaletes

Uma moradora de Campinas, de 24 anos, criou o grupo Cavaletes Malditos no Facebook para denunciar os materiais de propaganda eleitoral que infringem a legislação na cidade. As ruas da cidade, que possui 740 candidatos a vereador, possuem grande quantidade de cavaletes e cartazes, e já chegou a ser veiculado na imprensa local a dificuldade que os pedestres encontram para caminhar em determinadas vias.

Grupo de Campinas denuncia abusos em propagandas políticas na cidade | Foto: Reprodução

“No meu bairro há muitos cavaletes perto de uma clínica para idosos. Isso dificulta a passagem dos pedestres. Então eu peguei minhas canetinhas e comecei a escrever nos cartazes o número da lei que regulamenta esse tipo de propaganda”, conta ao Sul21 a criadora do grupo, que é formada em Comunicação Social e se define como uma “artivista” – pessoa que utiliza expressões artísticas para se manifestar sobre causas políticas e sociais.

Ela resolveu criar a comunidade na internet para alertar a população sobre os abusos cometidos pelos candidatos em relação à propaganda nas ruas e propagar esse tipo de ação sobre os materiais irregulares. “Criei o grupo para expor minha indignação e muitas pessoas se identificaram. Os políticos não dão a mínima atenção a isso (os cavaletes), é uma das piores formas de divulgação. Além de poluir visualmente a cidade, emporcalham tudo, pois ficam abandonados em terrenos baldios”, critica.

A moradora se mostra descrente com a atuação dos órgãos de controle, como a Justiça Eleitoral, a quem é conferido o poder de polícia para fiscalizar a propaganda irregular. “Demora muito até termos uma resposta desses órgãos e acabamos ficando nas mãos deles”, reclama.

Comunidade recebe fotos de ações em todo o país | Foto: Sujo Sua Cara

Questionada sobre a possibilidade de sofrer qualquer retaliação por parte de partidos ou candidatos, ela diz que considera sua causa justa. “Os cavaletes são propriedade particular dos candidatos, e essa propriedade particular não pode prejudicar meu direito de me locomover. Nós não podemos mexer neles, mas eles podem nos atrapalhar? É uma forma de Justiça. Se formos esperar pelas instituições, vamos demorar muito para obter resultados ou não teremos resultado nenhum”, entende.

Na comunidade do Facebook, a organizadora postou um vídeo no qual acompanha um sorveteiro, que ficou impossibilitado de realizar plenamente seu trabalho por conta dos obstáculos criados com as propagandas políticas. A reportagem do Sul21 entrou em contato com o grupo Sujo Sua Cara, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.

“Essas pessoas correm o risco de serem punidas”, diz Ministério Público

O promotor do Gabinete de Assessoramento Eleitoral do Ministério Público (MP) Estadual do Rio Grande do Sul, Rodrigo Zilio, assegura que os autores de rabiscos nos cartazes de candidatos podem vir a ser punidos. “Isso pode chegar ao conhecimento do MP e teríamos que adotar alguma conduta para fazer cessar essa retorsão”, explica.

Rodrigo Zilio diz que somente Justiça Eleitoral pode fiscalizar abusos | Foto: Juarez Sant'Anna Neto/MP-RS

O promotor lembra que há dois artigos do Código Eleitoral que disciplinam esse tipo de conduta. O artigo 331 estabelece que “inutilizar, alterar ou perturbar meio de propaganda devidamente empregado” pode resultar em pena de detenção por até seis meses ou pagamento de 90 a 120 dias-multa. E o artigo 332 determina que “impedir o exercício de propaganda” pode acarretar em detenção de até seis meses e pagamento de 30 a 60 dias-multa.

Os organizadores das comunidades no Facebook orientam as pessoas a agirem somente sobre as propagandas que estiverem irregulares. Porém, o promotor diz que, eventualmente, eles podem ser enquadrados da mesma forma no artigo 323, uma vez que a lei não protege somente os materiais “devidamente empregados”. Rodrigo Zilio critica esse tipo de atitude e afirma que somente a Justiça Eleitoral pode agir sobre as propagandas irregulares. “As pessoas pensam que estão apenas protestando, mas correm o risco de terem que se explicar em juízo. Eu não incentivaria de modo algum esse tipo de conduta nas redes sociais. Se a propaganda estiver irregular, é preciso notificar o Ministério Público e a Justiça Eleitoral. A ninguém mais é dado o poder de polícia nesses casos”, observa.

Incomodados com propagandas irregulares apelam para o humor | Foto: Sujo Sua Cara

Em Porto Alegre, a promotora Maria Alice Buttini, responsável pela fiscalização da propaganda eleitoral nas ruas da Capital, diz que ainda não foi notificada por partidos ou candidatos sobre rabiscos em cartazes e cavaletes. “Não chegou ao nosso conhecimento notícias sobre esses danos. As denúncias mais comuns envolvem colocação de propaganda em bens de uso público ou em imóveis particulares sem autorização do proprietário. Essas pessoas nos acionam e recebemos várias denúncias por dia”, conta.

Ela acrescenta que também são comuns denúncias envolvendo o horário de permanência dos cavaletes nas ruas, que vai das 6h às 22h. “Às 22h01 essa propaganda já não pode mais estar nas ruas. Contamos com o apoio do DMLU e da EPTC para que elas sejam recolhidas e colocadas no depósito da Justiça Eleitoral, de onde não retornam”, explica.

Advogados eleitorais criticam alterações em propagandas de rua

O advogado Gustavo Paim, especialista em Direito Eleitoral, acredita que a legislação sobre propaganda política nas ruas contem alguns aspectos muito subjetivos e, portanto, a população pode não entender corretamente os critérios na hora de promover qualquer ação hostil em relação aos materiais indevidamente colocados. “Há uma análise subjetiva em relação às propagandas móveis. É difícil para o eleitor saber o que é permitido ou não”, avalia.

Ele teme, também, que as ações de rabiscos em cavaletes e cartazes possam ser influenciadas por posições político-partidárias. “Acabamos vendo a Justiça pelas próprias mãos ser feita de acordo com uma coloração ideológica ou partidária”, lamenta.

Em muitos casos, rabiscos impossibilitam identificação do candidato | Foto: Sujo Sua Cara

A criadora do grupo Cavaletes Malditos assegura que não pertence a nenhum partido político, nem faz campanha para nenhum candidato. “Não é algo relacionado a um partido ou a um político. De nenhuma forma quero fazer perseguição, pois praticamente todos os políticos usam os cavaletes de forma indevida”, explica.

A advogada especialista em Direito Eleitoral, Maritânia Dallagnol, considera que essas ações são uma “depredação” e uma “atitude de violência” em relação às propagandas. Ela reconhece que há excessos por parte dos políticos, mas entende que “o caminho da legalidade é a denúncia aos órgãos de controle”. “Observamos que está havendo abuso de candidatos que colocam propagandas em jardins, canteiros e rótulas não permitidas”, afirma.

Para ela, é perigoso incitar a população a agir contra as propagandas eleitorais, mesmo as irregulares. “Esses internautas estão propondo uma desobediência civil e um incitamento contra a propaganda política. Isso é muito perigoso. Já houve um período no Brasil onde não tínhamos propaganda eleitoral e não queremos retornar a isso. É preciso buscar uma equação entre a possibilidade de o candidato se fazer conhecido e a preservação do espaço público”, avalia.


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