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28 de setembro de 2011
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17:47

Contra o preconceito, mães de filhos gays “saem do armário”

Por
Sul 21
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Contra o preconceito, mães de filhos gays “saem do armário”
Contra o preconceito, mães de filhos gays “saem do armário”
"Não precisamos ter vergonha", diz Marisa, mãe de Alexandre | Foto: Arquivo pessoal

Rachel Duarte

“Ele veio ao mundo para me ensinar”, diz Marisa Figueiró, 66 anos, viúva e mãe de Alexandre Boer, 47, homossexual. Ciente da orientação sexual de Alexandre há 32 anos, ela já partilhou com o filho alegrias, conquistas, dores, dificuldade financeiras e outros fatores comuns à vida de qualquer ser humano. Mas, o que ela não admite, é ter que conviver com o preconceito da sociedade. “Temos que aceitar os nossos filhos, não importa a sexualidade deles. Temos que aceitá-los, pois não são criminosos. São pessoas do bem com opções sexuais diferentes, mas que trabalham e lutam na vida. Não precisamos ter vergonha”, afirma.

Em nome da luta contra o preconceito, mães como Marisa estarão em Brasília nesta quinta-feira (28). O lançamento público da campanha “Mães pela Igualdade” antecede o seminário “Famílias pela Igualdade”, promovido pela Frente Parlamentar Mista pela Cidadania LGBT, liderada pelo deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ). No evento, as mães compartilharão suas histórias como forma de alertar parlamentares, governantes e a sociedade para a crescente onda de violência contra o público LGBT.

Segundo secretário da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Márcio Martins, mais de três mil homossexuais foram mortos no Brasil desde a década de 80 até hoje. Por não constar a tipificação de caráter homofóbico nas ocorrências policiais, o país ainda não consegue quantificar o número de gays mortos por preconceito. “Sabemos que foram 198 casos em 2009 e 250 no ano de 2010 porque as entidades têm informações de familiares e fizemos uma estimativa com o que é veiculado na imprensa”, diz Martins.

O major da Polícia Militar do Rio Grande do Sul, Paulo Cesar Franquilin Pereira, confirma a deficiência do sistema nos indicadores de homicídios por homofobia. “Nós registramos os crimes conforme a identidade da carteira de identidade, dizendo se é do sexo feminino ou masculino”, afirma.

Criminalizar a homofobia

O filho de Marisa, o jornalista Alexandre Boer, é sócio-fundador da ONG Somos e avalia que os crimes homofóbicos são sempre motivados por ódio e se caracterizam pela violência exagerada. “Não se mata um gay com um tiro, se mata com 30, enforcado, espancado. Mas a homofobia não está só na agressão física. Tem outras forma de violência que acabam não sendo registradas como tal”, destaca.

Segundo Alexandre, a violência aumentou nos últimos tempos porque os direitos do público LGBT também aumentaram. “Isto é uma reação da sociedade conservadora, que chega a ir para as ruas caminhar contra os direitos de outros seres humanos. Chegamos a este ponto. Isto é preocupante numa sociedade dita democrática”, alerta.

O ato das Mães pela Igualdade será uma forma de voltar a pressionar pela aprovação do projeto de lei 122, que prevê a criminalização de atitudes homofóbicas no Brasil. A legislação que tipifique e regulamente os crimes de ódio cometidos contra LBGTs poderá garantir igualdade no nível de proteção legal aos brasileiros, principal medo das mães em assumir seus filhos. “Eu tive receio das dificuldades que ele teria na vida com o preconceito. Mas acho que ele lida bem com isso hoje porque sempre conversamos”, diz Marisa.

Alexandra Martins
Campanha das "Mães pela Igualdade" vai a Brasília nesta quinta | Foto: Alexandra Martins

“No fundo, a maioria tem preconceito”

Marisa e Alexandre contaram separadamente ao Sul21 a mesma história. “Ela sempre conversou comigo e contei para ela na adolescência”, disse Alexandre. “Ele me falou quando tinha 15 anos. Nós conversávamos. Eu cheguei a propor dele tentar sair com meninas. Mas ele viu que não era isso. Foi um descobrimento conjunto”, contou Marisa.

Filho único e sem o pai desde cedo, Alexandre sempre manteve uma ligação forte com a mãe, o que foi fundamental para fortalecer o filho a encarar a sociedade. “Os familiares são os primeiros a ter preconceito. Eu disse que meu filho era gay só na formatura dele, quando ele tinha já 22 anos”, conta a mãe.

Mãe e filho chegaram a atuar juntos na ONG Somos, onde Marisa se uniu a outras mães de homossexuais. “As mães fazem de conta que não sabem, por medo de encarar a realidade. Temos como perceber que eles têm outra opção sexual”, diz Marisa.

“Ser gay não é uma moda, como a TV e as novelas caricaturizam. Esta imagem é de uma falsa aceitação da sociedade. No fundo, a maioria tem preconceito. O meu filho é um amigo, filho e orgulho para mim. A única coisa que fico triste é não ser avó. Mas temos que amá-los sempre. É na família que podemos dar o amor e prepará-los para as dificuldades da vida lá fora”, completa.


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