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15 de julho de 2011
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15:32

Lei sobre crimes na rede não pode sair antes de regulação de direitos

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Sul 21
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Audiência sobre internet na Câmara | Foto: Leonardo Prado/Ag. Câmara
Audiência discutiu o "AI-5 Digital" e o Marco Civil da internet nesta semana, na Câmara | Foto: Leonardo Prado/Ag. Câmara

Rachel Duarte
De Brasília

Bancos e provedores de internet podem controlar dados pessoais dos usuários sem permissão? Ainda existem perguntas sem reposta, do ponto de vista jurídico, sobre a internet no Brasil. A sociedade já se posicionou sobre o assunto em duas consultas públicas no ano passado e o resultado foi a proposta de um Marco Civil da Internet. Porém, antes de definir os direitos de cada um na internet, um projeto de lei que define como crimes algumas práticas corriqueiras na rede voltou ao debate na Câmara, e as entidades da sociedade civil se articulam para defender o “não” à proposta.

Leia mais:
– Marco Civil da Internet deve vir antes de lei penal, diz especialista

“Antes de qualquer medida ser sancionada é preciso definir quais são as condutas possíveis na internet. Isso é uma lógica jurídica primária. Tem que avaliar a realidade, como preservar os direitos fundamentais dos cidadãos com a utilização da internet, para depois poder avaliar se os deveres estão sendo cumpridos”, afirma o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Guilherme Varella

Como o projeto conhecido como “AI-5 Digital” tramita há três anos na Câmara e já recebeu alterações no Senado, não restam mais possibilidades de ajustes no texto. Ou os parlamentares discordam do novo texto e a primeira redação do projeto vai à aprovação, ou a presidenta Dilma Rousseff envia antes o projeto do Marco Civil da Internet. “Se tivéssemos votado o Marco Civil antes, não teríamos este problema. Foi uma questão de agenda política. Entendemos. Existe uma pressão da agenda internacional sobre a produção cultural que entra no interesses econômicos sobre direito autoral que colide na liberdade de conteúdo da internet”, diz o advogado do Idec.

Para Azeredo, há "terrorismo" por parte dos ativistas digitais | Foto: Divulgação/PSDB

Para o deputado federal Emiliano José (PT–BA), a indústria cultural americana é a maior interessada em restringir o uso da internet. O deputado aponta uma inconstitucionalidade no projeto do colega Azeredo, que se baseia na legislação internacional aprovada na Convenção de Budapeste, da qual o Brasil sequer participou. “É uma norma internacional que interessa a apenas 30 países. Argentina, México e Rússia, por exemplo, não assinaram esta norma na Convenção. Porque agora teremos que adotar esta lei?”, critica.

Autor do projeto quando ainda era senador, o agora deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG) defende sua proposta como uma alternativa aos crimes de pedofilia e invasões de hackers a sites institucionais e endereços pessoais. “Existe uma omissão clara do governo em discutir o assunto. Menosprezar o risco dos crimes da internet não é a melhor alternativa. O projeto tem que ser melhor compreendido, não podem fazer terrorismo de que a discussão deve-se a criminalização de baixar músicas”, critica.

“Não” ao AI-5 Digital

Para os críticos do projeto do deputado Azeredo, o “AI-5 Digital” permitirá a punição criminal de práticas atualmente comuns na internet. Para o sociólogo Sérgio Amadeu, projeto assegura o uso comercial de informações de cidadãos que navegam na rede, sem que ele sequer tenha conhecimento ou autorizado a liberação dos seus dados pessoais, ou os seus hábitos de navegação.

Sérgio Amadeu: "Eu gostaria de discutir se uma empresa pode invadir minha privacidade" | Foto: Wilson Dias/ABr

Um exemplo, diz Amadeu, é a prática adotada pelos bancos, que instalam nos computadores dos clientes, sem que eles saibam, um software que acompanha a navegação. “Segundo eles, é para evitar clonagem. Mas eu gostaria de discutir, por exemplo, se a empresa pode invadir minha privacidade. Porque isso é invasão. Eu não sei se é por controle da instituição mesmo”, indaga.

Amadeu também traz, como exemplo, uma negociação que está sendo feita pela empresa de telecomunicação Oi. “Eles estão contratando uma empresa que oferece um produto proibido na Inglaterra e na União Europeia. Quando o usuário acessa algum site utilizando o provedor deles, o acesso é na verdade desta empresa e ela direciona você para o site que você optou entrar. Então é um intermediário, que acompanha toda a sua navegação, para depois lançar publicidade em cima do usuário. Eu queria entender se isso é crime, porque eu considero isso uma invasão gravíssima”, critica.

Para Azeredo, trata-se de um debate “ideológico”. “Não há maior invasão de privacidade do que a sofrida pelas vítimas da ação dos hackers que invadem nossos sites e endereços eletrônicos, como fizeram com o da Petrobras”, responde.

Especialistas em tecnologia, direito penal, ativistas da internet livre e parlamentares discutiram o o projeto de lei do deputado Azeredo em audiência pública nesta quarta-feira (13), na Câmara.  Eles defenderam a necessidade de mais tempo de discussão para definir o limite entre o que as empresas podem fazer com os dados dos usuários e como penalizar os crimes na internet.

“Esta lei que está ai não serve ao cidadão da internet. Ela é inócua. Precisamos definir primeiro os direitos que usuários e empresas tem, para que então as violações, graves, sejam consideradas crimes. O Marco Civil é que tem que ser aprovado. O governo precisa enviar o projeto do Marco Civil. Do contrário, iremos propor aos deputados que eles o façam”, afirma Sérgio Amadeu.


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