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6 de maio de 2011
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21:08

Sociedade gaúcha busca alternativas para pagamento dos precatórios atrasados

Por
Sul 21
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Eloina Nunes Fonseca - Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte

Dona Eloina Nunes Fonseca espera há 25 anos o recebimento dos precatórios relativos à pensão que recebe do marido ex-funcionário da Companhia Rio-Grandense de Artes Gráficas (Corag). Na fila, ela sofre sem os recursos que poderiam ajudar na recuperação da saúde. “Eu já estou com 84 anos. E tenho a saúde debilitada de um acidente que sofri no ônibus há três anos. Tenho esperança de ainda receber este dinheiro”, disse. Assim como ela, estima-se que 8,5 mil precatoristas aguardam nas filas do estado para receber os valores a quem têm direito. Para tentar encontrar um caminho para resolver esta equação, representantes do legislativo e judiciário, e sindicatos de aposentados e pensionistas gaúchos se reuniram nesta sexta-feira (6), no Seminário o Futuro dos Precatórios. O evento ocorreu durante a manhã, no Auditório Dante Barone, da Assembleia Legislativa.

No primeiro painel, foi debatida a competência do Poder Judiciário para a expedição de precatórios e RPVs e o não-cumprimento pelo Estado dos montantes obrigatórios. À tarde foram abordados também o montante real da dívida do Estado, a disponibilidade de caixa e o cumprimento constitucional para com os credores.

Apesar de não ter sido anunciado até agora pelo governo, o tema dos precatórios está integrado no Programa de Sustentabilidade Financeira. O executivo estadual estuda encaminhar para apreciação dos deputados um Projeto de Lei que autorize uma Via de Conciliação com os precatoristas para abertura de negociação dos valores junto ao governo. A medida visa inverter a lógica de pagamento atual (em ordem crescente), para priorizar as dívidas do estado com os credores. Com isso, os valores poderão ser reduzidos de modo a serem pagos em um tempo mais curto, aumentando a expectativa de recebimento dos valores ainda em vida.

Ramiro Furquim/Sul21

“Com a Câmara de Conciliação (criada no governo Yeda) foram renegociados 214 precatórios. Com a Emenda Constitucional nº 62 isto foi inviabilizado. Agora, para podermos ter uma conciliação precisamos de uma lei autorizativa”, disse a coordenadora de Execuções e Precatórios da Procuradoria Geral do Estado, Ana Cristina Brenner. Ela informou que já se reuniu com a Casa Civil e apresentou a Via de Conciliação como alternativa para os pagamentos atrasados. Segundo a coordenadora, intenção do governo é apresentar esta alternativa como um projeto de lei, no pacote que será encaminhado ao legislativo este mês.

A Emenda Constitucional nº 62, publicada em 10 de dezembro de 2009, determina que o governo disponibilize o equivalente a 1,5% da Receita Corrente Líquida — RCL para o pagamento dos precatórios. Os valores definidos por lei são depositados mensalmente pelo Tesouro do Estado em duas contas correntes. Em 2010, foram pagos R$ 498 milhões. Para este ano, a previsão é de que serão pagos R$ 314 milhões.

De acordo com a Emenda Constitucional, 50% dos recursos se destinam ao pagamento dos precatórios, que deve ser feito em ordem cronológica, dando preferência aos idosos (mais de 60 anos) e a portadores de doenças graves. Os outros 50% vão para conciliações, leilões e pagamento por ordem crescente de valor.

Comércio informal

Nos últimos sete meses, cresceu o número de precatoristas que passaram a negociar o valor de seus créditos, entrando na fila dos que aceitam, em vez do valor total a que têm direito, o equivalente a 40 salários mínimos. Além disso, um comércio informal foi instituído para comprar os precatórios e amortizar o ICMS. Com isso, os credores recebem apenas 25% do valor que deveriam e as empresas acumulam dívidas também, já que a compensação com impostos não é prevista na lei dos precatórios.

Ramiro Furquim/Sul21

Neste sentido, o assessor jurídico do Sinapers ((Sindicato dos Servidores Aposentados e Pensionista do RS), Ricardo Bertelle defendeu posição contrária à possibilidade de um projeto de lei para negociar a dívida do estado em compensações de ICMS, o que regularizaria as empresas gaúchas que compram precatórios hoje. “É autorizar a negociação de pessoas idosas com grandes empresas. Ela não terão a mínima vantagem. Terão que abrir mão do que devem receber ou terão que perder ainda mais dinheiro para advogados”, argumentou.

Alternativas

Os representantes das entidades de pensionistas e aposentados defenderam maior poder por parte da Justiça na aplicação de sanções ao Estado, e formas de poder capitalizar esses recursos em compra de bens através de programas governamentais, e mesmo no abatimento de dívidas com o Poder Público.

A defensora pública do Estado Jussara Acosta propôs o cumprimento da legislação em vigor, principalmente a Emenda Constitucional 62/2009, que prioriza os precatoristas com mais de 60 anos ou acometidos por doença grave. Felipe Kirchner, também representando a Defensoria Pública, sustentou que o problema não é apenas econômico, mas cultural e existencial. “Historicamente, o Estado empurra suas dívidas com a barriga”.

Marta Kumer, juíza do Tribunal Regional do Trabalho, disse que o Brasil é o único país que possui este mecanismo de negociação de suas dívidas, e onde os bens públicos não podem ser penhorados. “É preciso mudar a postura de negociação entre Estado e Justiça”, defendeu. Segundo Pedro Pozza, do Tribunal de Justiça, a tendência é que o Estado, cada vez mais, fique impossibilitado de zerar esta conta.

Pelos dados apresentados pelos representantes dos servidores aposentados e pensionistas, o Rio Grande do Sul possui um estoque de precatórios de R$ 8,5 bilhões, ocupando o quarto lugar no ranking nacional de dívidas.

Ramiro Furquim/Sul21

Compromisso

Na abertura do seminário, o presidente do Legislativo Estadual destacou a iniciativa e o esforço da instituição na resolução do problema. “Este é um compromisso de Estado, é inaceitável que as coisas tenham chegado a este ponto. Contribuiremos na busca de uma solução ao problema, faremos uma grande concertação”, afirmou Villaverde.

Frederico Antunes lembrou que os credores querem manter as esperanças e ter a certeza de que receberão aquilo a que têm direito. “As pessoas não podem mais ser enganadas, precisam saber se vão receber ou não, o Estado tem o dever de responder a isto. O Estado não pode ser exímio e rápido cobrador, moroso e mau pagador”.

O Seminário O Futuro dos Precatórios foi organizado pela Comissão Especial dos Precatórios Judiciais do RS, presidida pelo deputado Frederico Antunes (PP).


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