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11 de maio de 2011
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23:31

Caso Banrisul: empresário garantia terceirizadas e centralizava ações do grupo

Por
Sul 21
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Igor Natusch

Para garantir a eficiência do esquema que consumia boa parte das verbas de publicidade do Banrisul, os envolvidos precisavam ter certeza que as licitações estariam sob controle, contando apenas com empresas ligadas à quadrilha. Além disso, os valores propostos tinham que atuar no sentido de disfarçar os superfaturamentos, com concorrentes que cobrassem ainda mais do que a já inchada proposta da vencedora. De forma a não enfrentarem surpresas, os participantes do esquema contavam com a atuação de Davi Antunes de Oliveira, que se transformou em uma figura centralizadora de todas as atividades criminosas da quadrilha.

Proprietário de uma série de empresas, Davi tratava de gerenciar a participação delas no esquema criminoso, de forma a legitimar a escolha de orçamentos acima do mercado. Em repetidas oportunidades, todas as empresas terceirizadas envolvidas na concorrência de serviços publicitários para o Banrisul eram controladas, no todo ou em parte, por Davi Antunes de Oliveira. Em paralelo, o empresário mantinha intenso contato com todos os vértices da organização criminosa, garantindo o funcionamento da rede e a distribuição dos lucros ilícitos oriundos do esquema.

As atividades eram centralizadas na Conexão Sul, pertencente de direito a Maria Selma da Silva, ex-sogra de Davi, mas controlada de fato pelo empresário. Documentos localizados na sede da Conexão Sul demonstram que Davi Antunes de Oliveira tinha ligação também com a Q Ideia, Renove, Mac Mídia e Self Eventos, todas envolvidas em várias das licitações superfaturadas que lesaram o Banrisul. Além disso, e-mails enviados a Davi por Sônia de Souza, da SLM, referiam-se a empresas como Mac Mídia e Digisul, o que revela a participação dele na administração das duas firmas. Ou seja, o empresário atuava como gerenciador, de forma a garantir que as concorrências estivessem sob total controle da quadrilha e que os valores definidos em cada caso fosses aprovados sem dificuldades pelo banco.

Reprodução
Troca de e-mails evidencia controle de Davi Antunes de Oliveira sobre as movimentações financeiras da quadrilha | Foto: Reprodução

As ligações entre as várias empresas envolvidas na fraude acabaram se tornando ainda mais visíveis, de acordo com o MP, na medida em que os representantes das terceirizadas foram comparecendo para os depoimentos. Empresas distintas, que alegavam não ter qualquer ligação, se apresentaram com os mesmos procuradores. Três acusados, ligados a quatro empresas (Mac Mídia, Conexão Sul, Q Ideia e Seftur) fizeram-se representar pela advogada Cristiane Lindenmeyer, enquanto outros sete indiciados foram representados pela advogada Helena Lahude Costa Franco. Indício, segundo o MP, de que todos receberam assistência jurídica da mesma fonte: Davi Antunes de Oliveira.

Algumas conversas interceptadas pelo Ministério Público demonstram as atividades de Davi no gerenciamento das empresas terceirizadas incluídas no esquema. Um diálogo telefônico de 14 de abril de 2010, entre Davi Antunes de Oliveira e Edinéia Klein Ávila, funcionária da DCS responsável pela coleta de orçamentos nas ações de comunicação do Banrisul, revela que Davi Antunes de Oliveira tinha “pagamentos” planejados para aquela mesma noite. Conversas do empresário com sua esposa Luciane e com Armando D’Elia Neto também parecem fazer referências à distribuição de valores, citando “trocinhos” e a “pegar a nossa parte”.

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Planilhas encontradas na empresa Conexão Sul mostram que Davi Antunes de Oliveira tinha participação direta em várias terceirizadas envolvidas na fraude | Foto: Reprodução

A posse de informações privilegiadas por parte de Davi Antunes de Oliveira é tão clara que o MP chegou a registrar conversa dele com um amigo de Santa Catarina, onde o empresário sugere a aquisição de imóveis para posterior aluguel ao Banrisul. A sugestão coincide com decisões internas do banco quanto a expansão da instituição financeira em território catarinense. Além disso, conversas de Davi com seu irmão, Paulo Gerson Antunes de Oliveira, demonstram que o empresário tentava não apenas tomar conhecimento da política de investimentos do banco, como também influenciá-la, de forma a manter o esquema criminoso em plena atividade. Paulo Gerson é ex-assessor do PMDB gaúcho, e foi acusado pelo vice-governador Paulo Feijó (DEM), em 2007, de estar envolvido com superfaturamento em um projeto de reelaboração da logomarca do Banrisul, serviço pelo qual o banco teria desembolsado R$ 20 milhões.

Conversas revelam preocupação com denúncias e investigação

Assim que era garantida a vitória na licitação por uma das empresas de Davi Antunes de Oliveira, o acusado tratava de subcontratar outras empresas, que acabavam sendo “quarteirizadas” para a execução efetiva dos serviços orçados. Um dos subcontratados, Luciano de Oliveira Totti, foi responsável pela denúncia ao Ministério Público que descortinou o esquema. Ao descobrir que havia prestado serviços por valores bastante inferiores aos destinados pelo Banrisul para o pagamento, Luciano contatou a agência SLM para avisar que iria ao MP denunciar a situação. Conversa entre Davi Antunes de Oliveira e sua esposa Luciane evidencia não apenas o conhecimento que Davi tinha da situação, como que já havia sido feito pagamento em dinheiro para tentar comprar o silêncio do denunciante, tratado na conversa como “a bicha”. Naquele momento, havia um esforço da nova presidência do Banrisul em cortar gastos na publicidade, o que leva Davi a dizer que não daria mais dinheiro a Luciano:

DAVI — Então tá, né, fazer o que né? O que a gente podia dizer? Não se faça então…
LUCIANE — É, mas é que ela (Luciano) mais ou menos sabe como é que funcionava, né?
DAVI — Mas pode saber o que funcionou, o que quiser, não tem nada.. Agora vai ter que se fuder!
(…)
LUCIANE — Não, eu só fico preocupada porque tem coisas que chamaram vocês que ela sabe diretamente, não sabe?
DAVI — Sim, e daí?
LUCIANE — Sim. Pode através dela ligar A com B, né?
(…)
DAVI — Vamos jogar duro com ela também. Ela que faça o que ela acha que vai fazer. Agora acabou. Até porque querida, acabou mesmo. Vamos defender o quê?

Para tentar deter Luciano de Oliveira Totti e neutralizar suas denúncias, a quadrilha cogitou até mesmo o suborno de um delegado de polícia, que apresentaria uma falsa denúncia de forma a sujar a ficha do denunciante e diminuir o impacto negativo da acusação. Conversa de Davi com Armando D’Elia Neto, registrada no dia 26 de agosto de 2010, explicita a ideia, além de citar o nome de Jairo Xavier Amaral, proprietário da gráfica Impressul e incluído na lista de réus do processo:

DAVI – Eu tô por te dizer o seguinte, cara: o nosso passo é planejar bem, é chegar para falar com o Jairo (…) o Jairo disse para mim “eu tive um problema” e me contou uma tragédia dele que depois eu te conto que o Alexandre participou, e fez uma coisa muito parecida com isso, tá? A história é bem parecida. Quando aquela vez eu falei com ele sobre a bicha ele já tinha me dito isso, de ele ter isto na cabeça… Mas agora, velho, eu não sei se não é a hora de nós nos armar com esse cara (…) Pensa, vai pensando, vai maturando até amanhã (…..)
ARMANDO – Não, eu acho que tu tem razão, mas até por isso, cara… Era bom falar com o Cássio antes, cara, tomarmos um café antes, para tu ires bem armado para a reunião com o Gílson depois.

No dia seguinte, após encontro com Sônia de Souza e Gilson Storck na sede da SLM, Davi Antunes de Oliveira voltou a conversar via Nextel com Armando D’Elia Neto, da DCS. Na conversa, além de considerações sobre o tamanho da ameaça que pairava sobre a quadrilha, são discutidas formas de levar a situação ao conhecimento de Walney Fehlberg, então superintendente de marketing do Banrisul, de forma a não assustá-lo com a possibilidade do esquema ser descoberto:

DAVI – Ele (Luciano de Oliveira Totti) não disse “preso” (refere-se à prisão de Walney Fehlberg em SP). Eu tentei, digo, eu pedi para ela (Sônia) me copiar bem o que ele disse… Ela disse “não, ele falou do problema do diretor no aeroporto, do problema do diretor no aeroporto”, que eu deduzo que alguém disse para ele que o cara ia viajar e quem fez a denuncia foi esse filho da puta!
ARMANDO – Pois é. Aí, agora é uma informação nova, mas e aí. o que ela… E o que a Sonia achou? É tudo invenção dele ou achou que é quente? O Gilson tava junto? Ou só ela?
DAVI – Os dois. O Gilson acha que se tá rolando MP nisso, nada mais podemos fazer. Mas assim, ela disse que ele sabe e insistiu (…) Ela não deu o braço a torcer, dizendo “não, eu vou avisar ao Davi”, entendeu? Ela não disse isso. Disse que ele insistia pra dizer. “Não, mas eu tenho um dossiê, mas eu tenho esse dossiê”, entendeu? Porque, para o Gilson tá claro que a bicha sabe que não pode mais bater em nada, em coisa nenhuma e em lugar nenhum por causa do contrato aquele que nós temos. Mas vender um dossiê é uma outra história. Não é a mesma coisa, não sei se tu tá entendendo… É isso que a bicha tava contando.
(…)
DAVI – Bom, velho, eu tô achando, e eles acharam, que o cara tá muito fudido. E eles, e eles “ah, quem sabe (…) 5 ou 10 pila” (…) “Se eu souber que tu deu um real pra ele, tu, Gilson, do teu bolso, porque ele precisava pra inteirar no ônibus, eu não falo mais contigo”.
ARMANDO – Te cantei a pedra que eles iam querer que tu cagasse 5 ou 10 pila pro cara, né?
(…)
ARMANDO – Agora tu tem que avisar o amigo, né? O que que tu acha?
DAVI – Pois é. Vou ligar. Ele me ligou. Ele achou que eu ia tá na reunião também. E eu acho que nós temos que explicar a ele, temos que explicar todo o contexto. Por isso que eu acho que nós, de repente, temos que falar pessoalmente (…) Porque, tu tá entendendo porque tu conhece mais a linha de raciocínio da bicha… Se nós explicar, não, (se Walney) souber a história do aeroporto ele vai pirar na batatinha. Ele vai achar que com certeza tem coisa, entendeu? (…)
ARMANDO – Pois é. Bem conheço. Faz o seguinte, cara. Dá uma ligada pro cara aí e diz que tem que falar e a gente combina alguma coisa aí hoje. E vê o que que tu acha. A gente vamos para um lugar e damos uma conversada aí.
DAVI – Onde podemos, tu acha? Deixa eu ver um lugarzinho assim tipo… Tu acha ruim ser na empresa? Tu acha ruim entrar lá? (…) Acho que não, né? Porque não tem essa história de estar seguindo nem nada. (…) Vou falar com ele e dizer “a gente precisa se falar, tem que te explicar bem direitinho”. Porque, cara, se explicar mal para ele isso, ele vai pirar!
ARMANDO – Vamos para outro lugar aí, cara. Vamos marcar num posto de gasolina. Um outro troço aí mais longe. Se tem alguém em cima aí, vai ser pior ainda. Não se esquece o seguinte: só o que a bicha tá cuidando agora é justamente isso. A bicha tá reparando, ela incendiou e sabe que a gente tá se falando.

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