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22 de março de 2011
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21:22

Após reunião com governo, MST aceita sair de fazenda em São Borja

Por
Sul 21
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Igor Natusch

Os agricultores sem terra que ocuparam a fazenda Palermo, em São Borja (RS), devem sair da área na manhã de quarta-feira (23). A decisão foi tomada durante encontro do secretário gaúcho de Desenvolvimento Rural e Cooperativismo, Ivar Pavan, com representantes do grupo ligado ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Como parte do acordo, o governo gaúcho se compromete a adquirir as terras, atualmente utilizadas para pecuária, e destiná-las ao assentamento das 54 famílias que ocuparam a propriedade nesta segunda-feira (21). As informações são da assessoria do secretário Ivar Pavan.

Para a confirmação da compra, o governo terá que aguardar decisão da Justiça sobre o valor da propriedade. Após o posicionamento, o Estado fará a aquisição do terreno. Como sinal de concordância, os trabalhadores rurais que estão na propriedade se comprometeram a sair da área ocupada. A saída dos manifestantes independe da decisão da 2ª Vara Cível de São Borja, que recebeu pedido de reintegração de posse da parte de José Renan Toniazzo, dono da área de 1,2 mil hectares. A decisão da juíza Larissa Moraes, inicialmente prevista para o final da tarde de terça-feira (22), acabou ficando para a manhã seguinte.

Com agenda marcada em Brasília, o secretário Ivar Pavan mudou os compromissos de última hora e partiu para São Borja no início da manhã de terça (22). Além de Pavan, estavam na comitiva o secretário de Agricultura, Luiz Fernando Mainardi, o procurador do Estado Carlos César D’Eli e o comandante geral da Brigada Militar, tenente-coronel Sérgio Roberto de Abreu. A negociação iniciou por volta das 10h, e estendeu-se durante toda a tarde.

Mesmo concordando em partir, os manifestantes não estão dispostos a esperar muito tempo por uma definição. Os sem terra garantem que voltarão a ocupar a fazenda se, no prazo de quatro dias, não forem apresentadas garantias de que as famílias serão de fato assentadas na área. A última vez que sem terra foram assentados no RS ocorreu em 2008, quando foi desapropriada parte da fazenda Southall, em São Gabriel.

Ocupação ocorreu durante a madrugada

A ocupação aconteceu por volta das 4h da manhã de segunda-feira (21). Dois ônibus e um caminhão participaram da ação, que teria mobilizado, segundo a Brigada Militar, cerca de 250 acampados de várias cidades do noroeste do RS. Foi a terceira vez que a área foi alvo de ações do MST – as anteriores ocorreram em 2005 e 2006. O caseiro da fazenda teria sido rendido, bem como sua família, e mantido trancado dentro de casa até a metade da manhã. Além da família do caseiro, apenas três funcionários vivem nos 1,2 mil hectares da fazenda, que é utilizada, segundo o proprietário, para a criação de cerca de 2 mil cabeças de gado.

O presidente do Sindicato Rural de São Borja, Dirceu Dornelles Filho, demonstra indignação com o que considera uma “invasão violenta” da fazenda Palermo. “Invadiram a casa, ameaçaram com armas, promoveram cárcere privado. Intimidaram até mesmo uma criança. Essa atitude é típica de uma quadrilha”, ataca o produtor rural, em conversa telefônica com o Sul21. “Não somos nós (proprietários rurais), é a humanidade toda que não aceita uma coisa dessas. Se dizem sem-terra, mas comportam-se como criminosos”. A Brigada Militar, porém, garante não ter registrado nenhum tipo de violência por parte dos agricultores que ocuparam a área.

A fazenda Palermo encontra-se desde 2001 na fila de desapropriações do governo. Apesar da situação já estar encaminhada, falta uma definição judicial sobre a indenização a ser paga ao atual proprietário, José Renan Toniazzo. O pagamento dos valores é necessário para que o governo possa iniciar oficialmente o assentamento de famílias no terreno. O então governador Olívio Dutra pagou cerca de R$ 1,5 milhão pela área, mas o proprietário não aceitou a indenização e o impasse acabou indo para a Justiça. O novo valor arbitrado pelo Judiciário é de R$ 3,8 milhões. O restante do dinheiro ainda não teria sido pago a Toniazzo, já que o governo gaúcho busca documentos que comprovem o depósito anterior, que indicarão a quantia exata ainda pendente.

Dirceu Dornelles Filho, do Sindicato Rural de São Borja, admite que a situação da fazenda está há quase uma década nas mãos da Justiça, mas defende que o princípio da propriedade privada deve ser seguido enquanto não ocorre uma decisão na esfera legal. “A falta de uma definição não dá direito a ninguém para invadir a propriedade”, acentua, cobrando uma ação “enérgica” do governo gaúcho. “Esperamos que o governo cumpra o seu dever e, assim que a Justiça anunciar sua decisão, restabeleça a posse da propriedade”, afirma.

Em 2008, o governo de Yeda Crusius assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no qual se comprometeu a assentar todas as famílias sem terra do RS. A decisão foi tomada durante as ações do MST envolvendo a fazenda Guerra, no norte do estado. O MST critica o governo por não ter, até o momento, se movimentado para cumprir o termo.

Tarso Genro: “ato desnecessário”

Durante a abertura do seminário de proteção e integração de refugiados, na manhã de terça-feira (22), o governador do RS, Tarso Genro, posicionou-se de forma contundente contra a ocupação da fazenda Palermo. “Cometeram um ato desnecessário. Era só ter dito que queriam pressa num processo de desapropriação que está em andamento que tomaríamos providências”, garantiu o governador. Ainda que acentue que o governo vai tentar solucionar a questão de forma política e jurídica, Tarso deixou claro que um inquérito será aberto para determinar as responsabilidades. “Neste caso há, no mínimo, violação de domicílio e submissão de cárcere privado das pessoas”, afirmou.

“Esta atitude não contribuiu nem com a própria luta deles (MST)”, acrescentou Tarso. Para ele, a situação acaba se degradando com ações como essa, já que o proprietário da terra não irá querer negociar sobre pressão e o judiciário será pressionado a adotar medidas enérgicas, sem realmente avaliar os argumentos do MST. E advertiu: “o estado de direito funcionará para todos, desde o MST até o banqueiro”.


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