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22 de fevereiro de 2011
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01:47

Na TV, Kadafi diz que ainda está na Líbia. Protestos tomam conta do mundo árabe

Por
Sul 21
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Sultan Al Qassemi / Reprodução
Muammar Kadafi em aparição na TV | Foto: Sultan Al Qassemi / Reprodução

Igor Natusch

O ditador Muammar Kadafi, que governa a Líbia há 42 anos, apareceu brevemente na TV estatal, como forma de diminuir os boatos de que teria fugido do país. A aparição foi exibida a partir da residência oficial de Kadafi, na capital Tripoli, segundo a emissora estatal de televisão. “Não estou na França nem na Venezuela. Ignorem os canais (de TV), controlados por cachorros de rua. Ainda estou aqui”, disse Kadafi no breve vídeo, que a TV líbia garante ter sido exibido ao vivo. Durante a transmissão, que durou 22 segundos, Muammar Kadafi aparece dentro de um veículo, segurando um guarda-chuva. Nenhuma menção direta aos protestos foi feita pelo governante líbio.

A violência é a tônica na repressão aos protestos na Líbia. Informações das agências internacionais dão conta de violentos ataques promovidos pelas forças fiéis a Kadafi, inclusive com o bombardeio de algumas cidades tomadas pelos revoltosos. Dois coronéis das forças armadas líbias, que recusaram-se a cumprir a ordem de disparar contra civis, desertaram e fugiram para Malta, onde pediram asilo político. Os militares garantem ter recebido ordens expressas de usar munição letal contra os manifestantes.

Relatos vindos de manifestantes afirmam que o regime de Muammar Kadafi contratou mercenários de países vizinhos, que estariam matando populares indiscriminadamente. “Os portões do inferno foram abertos em Tripoli. Halabja é aqui”, gritou ao telefone um manifestante entrevistado pela rede Al Jazeera, lembrando a cidade do Curdistão atingida por gás sarin em 1988, por ordem do então ditador iraquiano Saddam Hussein. Emissoras árabes de televisão exibiram imagens de mortos durante os protestos de segunda-feira (21), mas aplicaram efeitos de edição sobre o material, alegando que as imagens eram chocantes demais para serem exibidas.

O governo líbio, no entanto, garante que não está cometendo atos de violência contra a população. “Se há de fato um massacre, estou disposto não só a renunciar, como também a atear fogo em meu próprio corpo”, afirmou Khaled Kaeem, ministro das relações exteriores do país. O filho de Muammar Kadafi, Saif Al-Islam Kadafi, também apareceu na TV estatal líbia para negar que haja um massacre em curso no país. Logo após, a emissora exibiu imagens de supostos manifestantes da Tunísia, confessando terem invadido a Líbia para incitar as manifestações. Por outro lado, há também relatos de que emissoras de rádio e TV teriam sido invadidas por revoltosos em cidades como Benghazi e Bayda, passando a transmitir mensagens de apoio à revolta popular.

De qualquer forma, a comunidade internacional não parece convencida pelas alegações do governo líbio, enquanto manifestações de apoio são registradas em diferentes partes do mundo. “O governo líbio tem o dever de respeitar os direitos universais de sua população. É hora do banho de sangue acabar”, afirmou a secretaria de estado dos EUA, Hillary Clinton, na declaração mais enfática de repúdio feita até o momento pelo governo norte-americano. Segundo o jornal Financial Times, empresas que exploram petróleo no país teriam anunciado sua intenção de suspender imediatamente as atividades na Líbia. A British Petroleum (BP), uma das principais extratoras de petróleo do mundo, confirmou que todos seus funcionários em território líbio estão abandonando o país.

Brasileiros na Líbia

O Brasil anunciou estar tendo dificuldades para repatriar os brasileiros que estão na Líbia. Como o espaço aéreo líbio está fechado, um avião fretado pela empresa Queiroz Galvão não teria conseguido aterrissar em Benghazi para resgatar os funcionários. O embaixador brasileiro na Líbia, George Ney de Souza Fernandes, garante ter entrado em contato com os cerca de 500 brasileiros que estão no país, e que todos estão bem, ainda que assustados.

A Queiroz Galvão, que trabalha com prospecção de petróleo, divulgou nota na tarde de segunda-feira (21). “A Queiroz Galvão informa que está prestando toda a assistência aos funcionários da empresa e seus familiares na Líbia e tomando todas as medidas necessárias para que estes possam ser transferidos em segurança”, diz a nota. “Todos os funcionários estão bem e seus familiares no Brasil têm sido atualizados pela empresa sobre a situação. A Queiroz Galvão continua em contato constante com o Itamaraty, com a Embaixada do Brasil em Trípoli e com as Autoridades locais para que a situação se resolva da melhor forma possível”, conclui o comunicado.

Iêmen: Saleh diz que só sai pelas urnas

O governante do Iêmen, Ali Abdallah Saleh, garantiu nessa segunda-feira (21) que só deixará o poder “através das urnas”, após as eleições gerais programadas para 2013. O governante está no poder há 32 anos. “Se querem o poder, terão que conquistá-lo pelas urnas, e não por meio da anarquia e do assassinato”, afirmou Saleh, em uma coletiva de imprensa. O comandante do Iêmen garante estar disposto a promover reformas constitucionais, mas a oposição recusa-se a negociar com Saleh enquanto a repressão aos protestos continuar. A escalada da violência no país, um dos mais pobres do mundo árabe, provocou a morte de pelo menos 12 manifestantes, entre eles um adolescente, morto a tiros em Áden, ao sul do Iêmen. Em resposta à repressão promovida pelo governo de Ali Abdallah Saleh, os ulemas (líderes religiosos) iemenitas comunicaram que o governo está proibido de usar de meios violentos contra os manifestantes, sob pena do regime incorrer em crime religioso. “Qualquer agressão contra os manifestantes é um crime”, afirmaram os ulemas, em reunião coordenada pelo xeique Abdelmajid Zendani, tratado como “terrorista” pelo governo dos EUA devido às suas supostas ligações com o grupo Al-Qaeda.

Bahrein: rei manda libertar xiitas

Em um gesto de aproximação com os revoltosos que tomam conta das ruas do país, o rei do Bahrein, Hamad Ben Isa al-Khalifa, que é sunita, ordenou nessa segunda-feira (21) a libertação de condenados ligados ao ramo xiita. Outros presos tiveram seus julgamentos suspensos, segundo informações divulgadas em um comício pró-governo. A libertação dos presos é um das exigências da oposição para o estabelecimento de um processo de negociação com o governo de al-Khalifa, que reina desde 1999, substituindo seu pai, Isa bin Salman al-Khalifa. De qualquer forma, manifestantes permanecem concentrados na Praça da Pérola, na capital Manama, onde confrontos com forças governamentais teriam causado um número não confirmado de mortos e desaparecidos. O Bahrein é regido por uma monarquia constitucional, ligada à minoria sunita, e o rei al-Khalifa é considerado um reformista, tendo libertado presos políticos e implementado eleições para o parlamento, nas quais mulheres também têm direito a voto. Mesmo assim, a maioria do país é do ramo xiita, e pede mudanças radicais no sistema político.

Argélia: manifestantes dispersados com violência

Mais uma vez, manifestantes foram dispersados com violência durante protestos em Argel, capital da Argélia. Estudantes estão concentrados em frente ao Ministério do Ensino Superior, pedindo a valorização das licenciaturas e reformas no sistema político do país. Desde o domingo (20), autoridades tentam dispersar os estudantes, que são acompanhados por setores em greve, como funcionários públicos e enfermeiros. As marchas pró-democracia têm sido impedidas pelo governo de Abdelaziz Bouteflika, que comanda o país desde 1999. O governo sofre críticas pela crise econômica que o país enfrenta, além de acusações de corrupção e de fraude nos pleitos que garantiram a reeleição de Bouterflika. Para tentar diminuir a insatisfação popular, o governante anunciou o fim do estado de emergência, que estava em vigor no país desde 1992, e anunciou medidas para conter a inflação, como a diminuição de preços dos alimentos.

Jordânia: Abdullah II muda todo o ministério

Respondendo aos protestos que vão tomando conta do país, o rei da Jordânia, Abdullah II, garantiu estar disposto a implementar reformas “rápidas e verdadeiras” no país. A declaração foi dada durante reunião com o novo governo jordaniano, empossado no último dia 9. “Queremos um diálogo amplo e transparente com todas as forças políticas”, assegurou o rei, que comanda o país desde 1999. Ainda que os manifestantes reiterem sua lealdade ao rei, a exigência de reformas radicais levou Abdullah II a mudar todo o ministério. O gabinete é liderado agora por Marouf Bakhit, um ex-general que comprometeu-se a incentivar o diálogo político na Jordânia. O regime jordaniano é uma monarquia constitucional, com o primeiro ministro indicado pelo rei e eleições diretas para a Câmara dos Deputados.

Djibouti: polícia prende líderes oposicionistas

Nos últimos dias, intensificaram-se os protestos no pequeno país africano, exigindo a renúncia de Omar Guelleh, no governo há 12 anos. Líderes oposicionistas foram detidos pela polícia, durante protestos que teriam resultado na morte de um policial e de um manifestante. Omar Guelleh aprovou recentemente uma reforma constitucional, que o autoriza a concorrer a um terceiro mandato de seis anos, o que pode resultar em 18 anos ininterruptos no poder.

Omã: povo pede aumento geral de salários

Cerca de 300 manifestantes, incluindo grande número de mulheres, promoveram protestos na capital de Omã, Mascate, para pedir aumento geral de salários, congelamento dos preços e reformas constitucionais. Os populares, porém, declaram-se leais ao sultão Qabus bin Said al-Said, no poder desde 1970. “Somos fiéis a ti”, diziam cartazes expostos durante os protestos. O sultão é muito popular em Omã, considerado responsável por muitas medidas de modernização do país. No regime do sultanato, o gabinete é indicado por Qabus bin Said al-Said, que pode mudar seu ministério a qualquer momento.

Iraque: pedidos controle de preço e fim da corrupção

Em um país convulsionado por ataques terroristas e pela instabilidade do governo, protestos pacíficos tem pedido o controle dos preços e o fim da corrupção no país. Ali al Sistani, guia espiritual do ramo xiita no país, declarou nesta segunda-feira (21) seu apoio às manifestações populares, que se voltam especialmente contra o primeiro-ministro Nuri Al Maliki. “Compartilho o sofrimento dos iraquianos, causado pela negligência e debilidade do governo”, declarou al Sistani, em carta distribuída por membros do seu gabinete, sediado na cidade santa de Najaf. Mesmo assim, o guia opôs-se a manifestações violentas, como as que foram vistas no início de fevereiro, onde prédios públicos foram incendiados e quatro manifestantes morreram, com outros 150 feridos.

Marrocos: rei afirma estar comprometido com reformas

Novos protestos movimentaram o Marrocos, após o anúncio de cinco mortes em Al Hoceima, ao norte do país. Os corpos foram encontrados após os protestos, escondidos no interior de uma agência bancária. As manifestações foram menos intensas do que as de domingo (20), que resultaram nas cinco mortes e em centenas de feridos nas principais cidades do país. O rei Mohammad VI, no poder desde 1999, procurou tranquilizar os revoltosos, garantindo estar comprometido com a realização de reformas estruturais no país. Os protestos pedem a realização de uma nova constituinte, que atenda necessidades populares e aumente a democracia no Marrocos. Como sinal de diálogo, o governo criou o Conselho Econômico e Social, órgão consultivo que tem o objetivo de diminuir a distância entre o rei e as organizações populares.


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