Noticias|Últimas Notícias>Política
|
7 de janeiro de 2011
|
18:29

Deputado federal recém eleito, Stédile defende tributação triplicada para os bancos

Por
Sul 21
[email protected]

José Luiz Stédile / Foto Divulgação

Felipe Prestes

Deputado federal eleito pela primeira vez, o ex-prefeito de Cachoeirinha José Luiz Stédile (PSB) não mede as palavras ao definir o espaço concedido ao PSB no governo Dilma: “Horrível”. O socialista conta que existe “uma corrente forte” que pensa que o partido deve tomar outros rumos na próxima eleição ao Planalto, embora deva apoiar Dilma Rousseff neste mandato.

Stédile ressalta que o PSB tem hoje dois dos governadores melhores avaliados no país: Eduardo Campos, de Pernambuco, e Cid Gomes, do Ceará. E também dois prefeitos de capitais bem avaliados: Márcio Lacerda, de Belo Horizonte, e Luciano Ducci, de Curitiba, que era vice do tucano Beto Richa, agora governador do Paraná. “O povo está reconhecendo o nosso tipo de administração. Não queremos mais do que a gente merece, mas muito menos do que a gente merece é insuportável”.

Irmão de um dos fundadores do MST, João Pedro Stédile, o ex-prefeito conta que é muitas vezes confundido com o parente, mas que suas lutas são diferentes. “Meu irmão é economista agrário, sempre esteve ligado a este setor, e eu nunca estive, sempre morei na cidade”.

Em conversa por telefone José Luiz Stédile, que presidiu a CUT metropolitana, também falou sobre as lutas dos trabalhadores urbanos, as reformas política e tributária e criticou também o espaço destinado ao PSB no governo Tarso. Ele defende a reforma tributária, com tributação maior para os bancos. “É o setor que mais lucros tem no Brasil”.

Sul21: O senhor foi presidente da CUT metropolitana…
José Luiz Stédile:
Isto. Eu era vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, aqui da Grande Porto Alegre.

“O aumento salarial movimenta a economia. Ele nunca é prejudicial à nação”

Sul21: Será um defensor da luta dos trabalhadores na Câmara?
JLS
: Com certeza. Eu acredito que o aumento salarial movimenta a economia. A prova disso é o Brasil que temos hoje. Quando eu era da CUT, o salário mínimo era US$ 30, US$ 40. Hoje chega a quase US$ 300 – é claro que o dólar está um pouco defasado. O salário nunca é prejudicial à nação. Por isso vou continuar na luta por melhorias salariais.

Sul21: As críticas de quem diz que a CUT se tornou “pelego” do governo federal no governo Lula procedem?
JLS
: Eu não sou mais da CUT; não tenho acompanhado muito. Na verdade, a minha categoria não era de funcionários públicos, que são os que mais têm conflitos com o governo. Eu vou continuar mantendo os meus princípios.

Sul21: O senhor vai lutar na Câmara pela redução da jornada de trabalho, de 44 para 40 horas?
JLS
: Eu concordo com a redução. Apenas acho, e isso não é “peleguear”, que talvez o Brasil não esteja preparado para uma redução drástica: ‘a partir de agora baixou para 40 horas’. Isso tem um impacto na produção industrial brasileira, na concorrência com outras empresas. Acho que tem que haver uma redução gradual, um plano de redução para 40 horas, meia hora por ano em oito anos, por exemplo. Aí não traria impacto, estaria na previsão de cada ano.

José Luiz Stédile / Foto Divulgação PSB

“Não tive voto dos sem-terra. Minha votação é essencialmente urbana”

Sul21: O senhor é irmão de um dos fundadores do MST, o João Pedro Stédile. O senhor tem um olhar para o campo?
JLS: Nunca tive. Meu irmão é economista agrário, sempre esteve ligado a este setor, e eu nunca estive, sempre morei na cidade. Fui prefeito da cidade de Cachoeirinha, que não tem área rural. Existia uma desconfiança, quando me elegi prefeito, de que haveria ocupações em Cachoeirinha e eu provei que não havia esse tipo de estratégia. Hoje eu tenho o respeito da classe empresarial, de todos os setores de Cachoeirinha.

Sul21: Não será então um dos setores defendidos pelo senhor na Câmara.
JLS
: Não. Não é que eu vou ser contra também. Vou lutar para que ocorra o que for justo, mas não é minha prioridade, não tive voto dos sem-terra. A minha votação é essencialmente urbana, recebi votos de trabalhadores urbanos e da sociedade civil das cidades.

Sul21: O senhor costuma ser confundido com seu irmão?
JLS:
Todos os dias (risos). Nós temos um problema: somos parecidos fisicamente. Ele é três anos mais velho que eu, muito parecido, com o mesmo sobrenome, as pessoas acabam confundindo. Onde não me conhecem, acham que eu sou (ele). Mas eu fiz questão de fazer minha campanha diferenciada. Não serei um militante da causa dos sem-terra. Não que eu não concorde com algumas coisas, mas não é minha prioridade.

“Levo para Brasília a experiência de ter pego o segundo município mais violento do estado. Hoje, não está nem entre os 20 primeiros”

Sul21: Da sua experiência como prefeito de Cachoeirinha por dois mandatos o que o senhor leva para a Câmara?
JLS
: Primeiro a preocupação de que o Brasil cresceu, mas não estava preparado para que grande parte da população passasse a consumir. Então nós temos graves problemas de infraestrutura urbana nas cidades médias e grandes: moradia, transporte. O transporte é um caos. As cidades não foram planejadas para este número de veículos que temos aí. Estas são algumas das preocupações que levarei para o Congresso. Uma carga tributária mais justa também será uma preocupação. O Brasil arrecada mal e gasta mal. Levo a experiência de quem enfrenta no dia-a-dia problemas que, muitas vezes, na Federação tu não percebes. Experiência de ter pegado o município que era o segundo mais violento do estado e que hoje não aparece nem entre os vinte primeiros. Levo para a Brasília experiência de ter que enfrentar no dia-a-dia os problemas da falta de médicos, falta de infraestrutura, falta de recursos. Também serei um lutador das causas municipalistas. Acho que a Federação fica com uma parte muito grande dos recursos. Perdeu a oportunidade de fazer justiça na questão dos royalties do pré-sal. Além da Reforma Tributária, lutarei pelas reformas Política e Sindical – é preciso os sindicatos se renovarem também.

Sul21: Fala-se muito em Reforma Tributária, mas cada um tem uma opinião diferente sobre o que mudar. Que mudanças mais significativas teriam que ocorrer na questão tributária?
JLS
: Os empresários têm um pouco de razão quando colocam que a tributação é alta para pagar um tipo de serviço que o estado não presta. Por exemplo, todo o empresariado gasta muito com segurança, que é um dever do estado. Vários empresários têm que manter creche, que é um dever do estado. Vários empresários têm que dar plano de saúde para seus funcionários, porque a saúde do SUS não é boa. Então eles reclamam com razão neste aspecto, acho que tem setores da economia que têm que ter sua tributação reduzida. Por outro lado, tem um setor que tem que ter sua tributação triplicada, que é o setor bancário. É o setor que mais lucros tem no Brasil, é muito pouco tributado. Tem que haver compensações. Estímulo à indústria nacional, à cadeia produtiva e onerar mais os bancos.

“Modelo político-eleitoral do Brasil privilegia quem tem recursos”

Stédile, senador Paulo Paim e Vicente Pires, prefeito de Cachoeirinha / Divulgação Prefeitura de Cachoeirinha

Sul21: E quanto à Reforma Política, quais as mudanças mais necessárias?
JLS
: O modelo político-eleitoral do Brasil é muito defasado. Ele privilegia muito quem tem recursos. Depois de eleito deputado federal quem não se reelege é muito incompetente. Todo o sistema é feito para manter a atual estrutura. Por exemplo: emendas parlamentares. Eu serei beneficiado agora. Tu vais me perguntar se eu não vou pegar. Claro, que eu vou pegar, porque não vou prejudicar a cidade que eu estou representando. Mas é um contrassenso. Deputado é eleito para legislar e fiscalizar. Estou fazendo um estudo para mostrar que não há critério nestas emendas. Vi municípios no interior do estado, gastando fortunas para fazer uma praça central, enquanto em um município ao lado não havia posto de saúde. Não há um critério democrático e justo na distribuição destes recursos. Cada deputado investe no que vai dar retorno eleitoral. E são valores altíssimos, R$ 10, 12 milhões.

Minha cidade tem 120 mil habitantes e uma arrecadação de R$ 200 milhões, hoje. Mas para investimentos tem R$ 6,7 milhões. Então eu como deputado terei mais recursos para investir do que têm Cachoeirinha e Alvorada juntas. É uma desproporção. Além disso, a forma de arrecadação feita pelos partidos como é feita hoje, sem critérios, sem limites, é um exagero. Isso não é ilegal, mas é imoral. Quanto a Odebrecht, quanto cada empresa brasileira está doando para os partidos? Isso tem um preço. Se tiver uma reforma política que fortaleça os partidos e não as pessoas, poderemos mudar de rumo o Brasil, colocando pessoas mais decentes para legislar e governar.

Sul21: O senhor acha que teremos um Congresso qualificado o suficiente para fazermos estas mudanças nos próximos quatro anos?
JLS
: É sempre complicado acreditar em um Congresso que se beneficia do sistema. Os próprios (parlamentares) teriam que votar algo que iria prejudicá-los. Na prática vários deputados também pensam o seguinte: em um critério de voto em lista, os atuais deputados seriam os primeiros da lista. Por outro lado, teriam que passar a fazer campanha para seu partido, coisa que a maior parte não faz. Tem deputado que as pessoas nem sabem de que partido é. Hoje, as pessoas dizem que votam na pessoa, não no partido. Isso é um sinal claro de fragilidade partidária. Poucas pessoas têm identificação partidária, isso é ruim para o Brasil.

“Cachoeirinha foi o município que mais tratou e recuperou dependentes químicos no estado”

Sul21: O senhor falou da redução da violência em Cachoeirinha. A segurança pública é uma responsabilidade maior do estado que do município. Como Cachoeirinha reduziu a violência?
JLS
: Todo o mundo fala em combate às drogas. Vários municípios fazem palestras, mas não tomam atitudes concretas para enfrentar, de fato, o problema. Nós identificamos que a maior parte dos casos de violência no município era ligada às drogas. Nós fizemos um programa de recuperação dos dependentes químicos.

Sul21: Um programa público ou em parceria?
JLS
: Um programa público. Fomos o município que mais tratou e recuperou dependentes químicos no estado. Nós pagávamos a recuperação. Um custo caro, mas dá retorno. Nós diminuímos custo com saúde, porque boa parte dos dependentes químicos é vulnerável a vários tipos de doenças. Nós recuperamos no meu governo mais de 500 jovens. Na prática, eram aqueles que cometiam crimes. Fala-se muito em conscientização, palestras. Não acredito neste tipo de campanha. Não atrapalham, mas não dão resultado nenhum. (…) O programa de recuperação que nós temos é um programa que recupera em uma fazenda e depois acompanha na cidade a recuperação, porque recaídas são comuns. Se não tiver acompanhamento, a tendência de recaída do dependente é muito grande. Agora, o atual prefeito está criando a primeira fazenda de recuperação pública no Brasil. Antes, tínhamos um convênio com uma fazenda.

“No governo Dilma, não queremos mais do merecemos. Mas, muito menos é insuportável”

Sul21: Como é que o senhor viu o espaço destinado ao PSB nos governos de Dilma Rousseff e Tarso Genro?
JLS
: Horrível (risos). O PSB elegeu seis governadores, quatro senadores e 35 deputados federais. Os estados onde governamos são os que a Dilma teve as melhores votações: Pernambuco, Ceará, Paraíba e Piauí. A Dilma fez cerca de 80% dos votos nestes estados. Uma campanha que nós fizemos. Fomos fundamentais para a eleição da Dilma. Ganhamos dela dois ministérios de pequena importância. O de Portos seria também de Aeroportos, e acabou ficando apenas de Portos. E o Ministério de Integração Nacional, que dialoga pouco com o país, se concentra mais no Nordeste. Ela privilegiou o PMDB, que está chorando de barriga cheia. Em vários locais do Brasil, como RS, SP e SC, o PMDB apoiou o Serra. O PMDB foi um partido quase dividido na eleição.

Já existe uma corrente muito forte no PSB que acha que se deve apoiar a Dilma, porque acreditamos no governo, mas que a postura do governo Dilma nos força a tomar caminhos próprios na próxima eleição. Hoje os dois governadores de maior aceitação no Brasil são os de Pernambuco (Eduardo Campos) e Ceará (Cid Gomes), os dois nossos. Os dois prefeitos melhores avaliados no Brasil também são nossos, o de Belo Horizonte (Márcio Lacerda) e Curitiba (Luciano Ducci). O povo está reconhecendo o nosso tipo de administração. Não queremos mais do que a gente merece, mas muito menos do que a gente merece é insuportável.

Sul21: E quanto ao governo Tarso?
JLS
: No governo Tarso nós ganhamos uma secretaria que, de fato, é de muito trabalho, mas… No governo Tarso também achamos que fomos fundamentais para a vitória. O Tarso estava com a campanha estagnada, com o mesmo percentual (nas pesquisas) há vários meses. Se nós tivéssemos mantido a candidatura do Beto (Albuquerque), haveria segundo turno. Seria uma nova eleição. Julgamos que com uma secretaria só, para o tamanho do nosso partido, que elegeu três deputados federais e três estaduais, estamos tendo o mesmo peso de outros partidos que não apoiaram o Tarso desde o início. (…) Nós ganhamos uma secretaria forte, mas que não tem muitos cargos para contemplar o partido. Em vários municípios foi pior para o partido o Tarso ter ganhado. Onde disputamos com PDT, PTB ou PT esses partidos saem fortalecidos e nós perdemos espaço.

“O tamanho que o PSB ficou no governo Tarso é muito abaixo do valor que ele tem”

Sul21: Esse espaço maior não se deve ao fato de o PDT e o PTB terem mais parlamentares que o PSB na Assembleia?
JLS
: Foi correta a postura do Tarso de atrair o PDT e o PTB, não é isso que estou questionando. Mas o tamanho que o PSB ficou no governo é muito abaixo do valor que ele tem. Há uma indignação, sim, forte no partido. Não sei aonde isso vai levar. A situação está muito delicada internamente no partido. Isto não quer dizer que não concorde com o Tarso. Vou defender que apoiemos o governo; acho que o Tarso toma medidas corretas. Mas o tamanho de nosso partido não está sendo contemplado.

Sul21: O senhor também governou na prefeitura de Cachoeirinha com uma coalizão ampla. O senhor teve dificuldades para governar? Como foi lidar com partidos com diferenças ideológicas com o PSB, como o PTB e PMDB?
JLS
: Não tive (dificuldades), porque as pessoas têm pouca identificação partidária. Não noto muito diferença entre militantes do DEM e do PDT. Aliás, as pessoas mudam toda hora de partido. Conheço vários na minha cidade que saíram do PC do B, foram para o DEM, depois PDT, e assim por diante. Nem mais o PT, que tradicionalmente é um partido com posturas ideológicas fortes. Hoje tem muito empresário de direita dentro do PT. Nem o PSOL tem mais postura ideológica, pelas pessoas que estão compondo o partido.

“Consegui ter 95% dos partidos da cidade do meu lado. Na verdade, não eram os partidos. Eram as pessoas”

Sul21: Mas no que isto facilita para governar?
JLS
: Isto facilita muito. Não… Para quem está governando, o ideal era que tu tivesses partidos fortes, tradicionais, ideológicos, para tu saberes com quem tu contas, qual é o programa, qual é a postura. Mas como não existe o partido forte, os municípios governam com as pessoas, com as lideranças da comunidade. Todo o prefeito é obrigado a ter maioria na Câmara, como o Tarso está fazendo, e tu tens que ter as principais lideranças da cidade do teu lado para ajudar a implantar os programas. Senão tu tens os programas e não consegues implantar. Eu consegui ter 95% dos partidos da cidade do meu lado. Mas na verdade não eram os partidos, eram as pessoas.

Sul21: Vi no seu blogue que o senhor critica o dispêndio de dinheiro público que está sendo feito no país, tendo em vista a Copa do Mundo.
JLS
: Apesar da visibilidade que vai ter a Copa do Mundo, do turismo, que é alavancado, acho que os valores que estão sendo destinados são um exagero em um país em que as pessoas estão morrendo por falta de médicos, um país com dificuldades em vários setores. Tenho desconfiança se (a Copa do Mundo) é tudo isto. Na verdade, a Copa do Mundo dura um mês. Vi algumas matérias que mostram a África do Sul após a Copa do Mundo. O percentual de aumento do turismo após o torneio é insignificante perto do que esperavam. Então eu questiono sim.

Sul21: A que o senhor atribuiu sua chegada à Câmara pela primeira vez?
JLS
: Primeiro, ao crescimento do meu partido. Segundo, ao reconhecimento da minha administração como prefeito de Cachoeirinha, cidade em que fiz metade dos meus votos. Terceiro, à compreensão das pessoas da proposta de valorizar as cidades discriminadas e o reconhecimento de uma pessoa que vai lutar pelos direitos do cidadão.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora