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11 de setembro de 2018
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17:50

A experiência de uma Olimpíada Nacional de História: ‘Foi alimento para os nossos sonhos’

Por
Sul 21
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Vitória Camargo, Julia Prates da Silva e Camila Porto das Neves na fase final da competição organizada pela UNICAMP – ONHB | Foto: Arquivo Pessoal

Por Maiara Rauber
Da Página do MST

A educação por onde passa faz história, e o que diferencia o caminho percorrido pelo estudante é o incentivo recebido pela família, professores, amigos e Estado. Na falta de um destes apoiadores, essa história pode não ser muito longa. Para a filha de assentada Julia Kaiane Prates da Silva, de 18 anos, o suporte na busca por conhecimento veio de todos os lados.

Julia cursa o terceiro ano do Ensino Médio e o Ensino Técnico de Meio Ambiente no Campus Visconde da Graça do Instituto Federal Sul Rio Grandense (IFSul), na cidade de Pelotas, na região Sul do Rio Grande do Sul. Ela contou à Página do MST a sua trajetória até chegar à final da 10ª Olimpíada Nacional de História do Brasil (ONHB) juntamente com sua equipe.

Debora Isabel Prates da Silva, de 36 anos, é assentada, mãe de Julia, Calebe, de um ano, e Mirian, de 13 anos. Eles moram há 12 anos em Herval, também na região Sul do estado, onde produzem milho, feijão, hortaliças e outros alimentos. Debora teve que sustentar uma casa, suas duas filhas e administrar um lote após se separar de Valderi Raimundo da Silva, de 38 anos, pai de Julia.

A assentada, mãe de Julia, trabalha com agricultura familiar de modo convencional. Ao mencionar isso, a estudante ressalta que sabe dos pontos negativos desta forma de produção, e que, como futura técnica em meio ambiente, sabe da importância em produzir alimentos agroecológicos.

Para Julia, a luta de sua mãe é inspiração e dá forças para continuar buscando seus ideais. “Eu acompanhei a luta dela e vi tudo o que ela passou e ainda passa. A maior riqueza que ela pode oferecer é os caminhos para eu adquirir o conhecimento. Também que eu sabia usá-lo de forma correta para ajudar outras pessoas”, diz.

O pai da Julia também sempre a apoia e a incentiva nos estudos. Mesmo a distância, uma das formas de se comunicar com a filha é telefonar e perguntar como está o dia a dia na escola. “Ele sempre me orienta quando passo por alguma dificuldade”, conta.

Equipe Finalista da ONHB | Foto: Arquivo Pessoal

Olimpíada Nacional de História

Ao relatar o seu percurso acadêmico, Julia afirma que cursou todo o Ensino Fundamental em uma escola rural instalada dentro do Assentamento São Virgílio, onde mora com sua família no interior de Herval. Já o Ensino Médio surgiu a oportunidade de conciliar com o Curso Técnico de Meio Ambiente, em Pelotas.

No segundo ano do Ensino Médio, a turma de Julia conheceu o professor de História Deomar Villagra Neto. Sua didática de aula, como relata a estudante, era “sem explicação”. “Ele é um apaixonado pela sua profissão, pela área em que trabalha”, destaca. Como forma de continuar em contato com o professor depois do segundo ano, Julia, com as amigas Vitória Camargo e Camila Porto das Neves, resolveram se inscrever na ONHB, após ficarem sabendo por meio de uma colega.

Depois da inscrição, que ocorreu entre março e abril deste ano, duas equipes do Campus Visconde da Graça começaram as etapas da ONHB. Segundo Julia, os grupos tinham uma semana para fazer e discutir com o professor as questões e as tarefas solicitadas pela competição. No final de semana, tinham que marcar as respostas e enviá-las. A outra equipe, que era composta por alunas do segundo ano do Técnico de Agropecuária foi desclassificada na terceira etapa, deixando a equipe Lutzenberger (Julia, Vitória e Camila) nervosa, com o pensamento de que também não avançaria muito na olimpíada. A maior dificuldade para Julia e suas colegas foi conciliar as disciplinas acadêmicas com as etapas da ONHB.

Ao chegarem à quinta fase da competição, foi proposto para as equipes escreverem um discurso como se os alunos estivessem no Congresso Nacional. O assunto a ser abordado era a Reforma da Previdência. Posteriormente, com uma mensagem de áudio do professor Neto, a equipe Lutzenberger ficou sabendo que foi classificada para a final. “Estávamos ansiosas, porém com receio do resultado. Nunca esperávamos chegar onde chegamos. A nossa turma inteira chorou ao saber da notícia”, recorda Julia.

Foi a primeira vez em oito anos que o professor Neto levou uma equipe para a final da olimpíada, a qual ficou entre as 31 melhores do país. A partir disso, as estudantes foram patrocinadas pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para realizarem a prova final presencialmente em Campinas, no estado de São Paulo.

Depois do esforço de toda a equipe, resta compartilhar os aprendizados conquistados ao longo da competição. “O que mais marcou foi o sonho de um professor que uniu três alunas e deu a nós uma oportunidade incrível que nunca imaginamos viver”. Além dos conhecimentos acadêmicos, a a filha de assentados falou de outras situações que a ONHB proporcionou, como conhecer outro estado e outras culturas. “Foi uma experiência que marcou nossa história. Quero que outras pessoas também tenham essa oportunidade e que aproveitem muito, como nós aproveitamos cada momento. Foi alimento para os nossos sonhos”, conclui.

O sonho de oportunidades iguais

A luta pela qualidade de estudos é reforçada por Julia. Ela comenta sobre a importância de levar a educação aos lugares que hoje são esquecidos pelo poder público, pois acredita que o ensino de qualidade não deveria ser restrito, mas sim expandido. Inclusive, esse é o seu desejo para o futuro de outras crianças.

Julia ainda está em busca para se encontrar na vastidão de opções que se apresenta para ela, porém, quer persistir nos estudos e se qualificar em uma área “que possa promover à sociedade o bem”.


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