Correa: ‘Aqui há a mão de um país hegemônico. O que acontece no Equador, ocorre no Brasil e na Argentina’

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Luís Gomes
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Rafael Correa deu um breve discurso durante ato da Caravana do Lula em Santana do Livramento | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Enquanto Lula, Pepe Mujica e Dilma conversavam na Praça Internacional de Santana do Livramento, que demarca a fronteira entre Brasil e Uruguai, um outro líder latino-americano observava à distância. Alto, de óculos escuros, com um blazer sem gravata, erguia-se com tranquilidade em meio à multidão de apoiadores do PT e da Frente Amplia que estavam ali para escutar os colegas com quem ele dividira tantas reuniões de cúpula pela América do Sul. Estava em meio ao público porque não o reconheceram, fora impedido de ingressar no cercado que isolava os palcos. Foi só mais tarde, depois de o evento ser interrompido pela falta de luz e retomado, que Rafael Correa foi reconhecido e juntou-se aos ex-presidentes.

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Em um breve discurso, Correa, que deixou a presidência do Equador no ano passado após três mandatos, criticou o seu sucessor, Lenín Moreno, a quem acusou de ser o “Temer equatoriano” por ter, segundo ele, traído a “revolução cidadã” do país e entregado seu governo “totalmente para a direita”. “Foi uma traição profunda, a entrega total do país aos poderes de sempre e à imprensa corrupta”, disse.

Correa comparou as situações de Brasil e Equador ao dizer que Lenín Moreno é o Temer de seu país | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Terminado o evento, deu uma breve entrevista à imprensa. Questionado sobre como poderia Moreno, candidato governista escolhido para ser seu sucessor, ter lhe traído, Correa respondeu. “É a alma dos traidores. Ficam calados esperando a sua oportunidade. Veja o que fez em 10 meses Lenin Moreno. Disse que eu era o melhor presidente de todos os tempos, o maior governo do planeta, o melhor equatoriano da história, agora sou corrupto, autoritário, quer me mandar preso”.

Depois de três mandatos como presidente, Correa passou o cargo a Lenín Moreno em maio de 2017 diante da possibilidade de retornar à chefia do país no futuro, em função de uma emenda aprovada em 2015. Moreno, no entanto, convocou um referendo que colocou fim aos planos do ex-presidente. Realizada em fevereiro, a consulta popular definiu que os políticos só podem concorrer a dois mandatos seguidos, após os quais não podem voltar a se candidatar.

Além disso, Correa, que hoje vive na Bélgica, país de origem de sua esposa, também passou a ter de lidar com uma ofensiva judicial. Seu ex-vice-presidente, Jorge Glas, que também foi vice de Moreno, foi condenado a seis anos de prisão em um escândalo que envolve a construtora brasileira Odebrecht e se espalha pela América Latina. Para o equatoriano, trata-se de uma estratégia regional influenciada pelos Estados Unidos para desmoralizar lideranças de esquerda que governaram o continente a partir da primeira década do século XXI.

“É claro que aqui há a mão de um país hegemônico. O que está acontecendo no Equador é o livreto do que está ocorrendo no Brasil e daquilo que estão fazendo na Argentina. A Lula, acusam de ter um apartamento que nunca teve. A Cristina, de ser traidora da pátria, que é um crime que só existe em caso de guerra. O processo, a estratégia, a comunicação, é o mesmo livro. É claro que é uma estratégia regional e manejada extrarregionalmente”, disse.

Diante desse quadro, Correa insistiu que a esquerda não pode permitir que as forças de direita, com o apoio do que chamou de a “imprensa corrupta que se vende ao melhor pagador”, ganhe a batalha moral e torne-se elas a guardiã da luta contra a corrupção. “Está claro que alguns conseguiram nos desmoralizar com um discurso de que há corrupção, ou seja, atentando contra o que há de mais sagrado para um revolucionário. A única batalha que não pode perder um revolucionário é a batalha moral. Hoje, mais do que nunca, temos que ter a razão, a verdade, as mãos limpas, e mostrar que os corruptos são os que estão voltando”, disse.

Rafael Correa subiu ao palco depois que o evento já tinha começado | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21

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