Entrevistas|z_Areazero
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1 de agosto de 2016
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11:53

‘É o momento da verdadeira esquerda apresentar um projeto alternativo de sociedade’

Por
Sul 21
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Foto: Guilherme Santos/Sul21
Júlio: “Chega dos poderosos dominarem o país, fazerem o que fazem, salvarem os banqueiros, os industriais, os latifundiários”| Foto: Guilherme Santos/Sul21

Débora Fogliatto

O professor de matemática Júlio Flores, um dos fundadores e mais conhecidos políticos do PSTU gaúcho, é pré-candidato à Prefeitura de Porto Alegre com a proposta de construir uma gestão socialista dos trabalhadores. Com uma posição bastante definida de oposição aos governos federal, estadual e municipal, Júlio e seu partido defendem o “fora todos”, ou seja, não querem nem o retorno de Dilma Rousseff nem a permanência de Michel Temer, mas sim novas eleições gerais.

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Para além disso, defende um projeto político e social diferente do que existe atualmente no Brasil. Por isso, acredita que as eleições municipais estão diretamente ligadas ao cenário nacional. “O elemento central da nossa proposta, em todos os terrenos, é a mobilização popular, então, supondo que não haja eleições gerais agora e que se mantenha ou o governo Dilma ou o governo Temer, obviamente nosso governo municipal seria de oposição frontal a esse governo”, explica ele em entrevista ao Sul21. Caso eleito, diz que estabeleceria um sistema de conselhos populares, em que os trabalhadores decidiriam sobre os rumos da gestão.

Embora a posição da direção do partido seja a pré-candidatura de Júlio neste momento, ele avisa que isso pode mudar no próximo dia 5, quando há uma convenção para definir oficialmente o que o PSTU fará nas eleições municipais. O partido está em tratativas com o PSOL e encarou como positivo o fato de a Rede não apoiar a candidatura de Luciana Genro. Há, no entanto, alguns pontos divergentes. A possibilidade de fazer parcerias com a iniciativa privada, por exemplo, que é considerada pela candidata do PSOL, não é admitida por Júlio. “A nossa proposta é, inclusive, a expropriação das empreiteiras e das construtoras, para colocá-las a serviço desse plano de obras públicas de capital”, afirma.

Foto: Guilherme Santos/Sul21
O socialista defende eleições gerais e critica: “a classe trabalhadora se viu traída pelo PT” | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Confira a entrevista completa:

Sul21 – Quais são as tuas propostas ‘carro-chefe’ para a cidade?

Júlio Flores – A primeira questão, o eixo divisório, digamos assim, das nossas propostas em relação às demais pré-candidaturas é a relação com a questão nacional. Nós achamos que, nessa conjuntura de crise e decadência do PT e da Frente Popular, é necessário a gente apontar um caminho diferente dessa podridão, da roubalheira existente e dos ataques aos trabalhadores. É necessário exigirmos fora todos: fora governo federal, Fora Temer, Fora Dilma, Eduardo Cunha, Rodrigo Maia (novo presidente da Câmara Federal), Renan Calheiros, toda essa turma e todos que estão envolvidos nessa roubalheira, que na verdade deve ser 90% do Congresso Nacional. E ter eleições gerais, para constituir um novo governo, um governo socialista dos trabalhadores a nível nacional, apoiado em conselhos populares para governar o país. Porque chega de os poderosos dominarem o país, fazerem o que fazem, salvarem os banqueiros, os industriais, os latifundiários, enquanto o povo trabalhador sofre as consequências desse ajuste fiscal que eles – tanto a Dilma quanto o Temer – querem fazer. É um projeto idêntico, com mudanças  superficiais entre um e outro. E a grande tragédia é o papel do PT nesse processo, no qual a classe trabalhadora tinha apostado durante 30 anos, pelo menos, e de fato e se viu traída pelo PT e rompeu com o PT. Então rompeu com Dilma, rompeu com governo e acho que é um novo momento que a gente tem que apontar um caminho socialista para o Brasil.

“Com esse dinheiro da ruptura do FMI e da dívida, poderia fazer um plano de obras públicas, que garantisse emprego pra milhões de trabalhadores”

Sul21 – Seria necessária então não só uma troca dos governantes, mas também um novo modelo?

Júlio Flores – Sim, um novo modelo de gestão do país. Um governo que rompesse com o Fundo Monetário Internacional, que deixasse de pagar a dívida pública, tanto interna quanto externa, que promovesse uma profunda reforma agrária no país, que o PT não fez, estatizasse o sistema financeiro e começasse um novo momento de desapropriação das grandes empresas pra mudar a face e a estrutura do país. Essas seriam, resumidamente, as principais tarefas de um governo socialista, dos trabalhadores, que atendesse às necessidades atuais e históricas, porque milhões de trabalhadores estão na miséria. Com esse dinheiro da ruptura do FMI e da dívida, poderia fazer um plano de obras públicas, que garantisse emprego pra milhões de trabalhadores, ao mesmo tempo em que construiria moradia, escolas, hospitais, ou seja, atenderia as necessidades nas questões mais básicas da maioria da população.

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O professor defende também a necessidade de uma reforma da mídia | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Sul21 – Pra fazer isso, teria que tornar esse projeto conhecido da população, mas o PSTU ainda é um partido pequeno. De que forma fazer com que essa mudança também seja um anseio da população, que a população conheça essa proposta e ela não seja apenas do partido?

Júlio Flores – De fato, a grande mídia precisaria de controles substanciais por parte dos próprios trabalhadores, porque atualmente atende aos grandes empresários e aos seus próprios interesses. Então [seria preciso] uma profunda democratização ou controle social, nos meios de comunicação, de tal maneira que todas as ideias que pudessem ser publicadas no debate realmente sejam. A grande mídia não publica opiniões divergentes das suas. De fato, não há uma democracia nesse terreno. Inclusive no terreno eleitora. No momento das eleições, eles publicam aquilo que eles acham que é do seu interesse. Então, tem um critério de seleção avesso à democracia.

Sul21 – Ao mesmo tempo, como fazer uma gestão socialista aqui em Porto Alegre considerando a atual conjuntura nacional?

Júlio Flores – Isso é possível, porque é verdade que há coisas contraditórias, a vida é contraditória e a luta política também. Mas o elemento central da nossa proposta, em todos os terrenos, é a mobilização popular, então, supondo que não haja eleições gerais agora e que se mantenha ou o governo Dilma ou o governo Temer, obviamente nosso governo municipal seria de oposição frontal a esse governo. Porque eles de fato defendem a continuidade do modelo econômico como está, com ataques aos direitos trabalhistas, querem fazer a reforma da previdência, querem fazer uma reforma trabalhista, retirar direitos da população. Por outro lado, como é que a gente faz isso? Em que um governo trabalhador socialista apoiaria? Nós propomos um governo apoiado em conselhos populares. O que é isso? É uma coisa superior ao que se teve aqui na capital, que é o Orçamento Participativo. Seria desencadeado em um processo de assembleias populares nos bairros da capital, nas escolas, nas fábricas, nos bancos, nos supermercados. E ele iria gerir em cada região, delegados a um conselho popular que governaria a cidade junto com o governo eleito, ao qual o governo eleito se submeteria, ou seja: todas as demandas da população passariam por aí. Esse seria o governo na nossa proposta, dos conselhos populares, que obviamente teria oposição de todas as instituições.

“Aqueles que não exploram o assalariado teriam lugar nos conselhos. E esses conselhos governariam a cidade, sem ter medo de oposição”

Foto: Guilherme Santos/Sul21
Grandes empresários não participariam de seu governo, garante | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Sul21 – Haveria um conselho de grandes empresários também, nesse caso?

Júlio Flores – Não, não participariam do governo. O que é possível são os pequenos, os micro empresários, de empresas familiares, pequenos mercados. Mas os grandes não, não fariam parte e não teriam nenhuma incidência no governo. Aqueles que não exploram o assalariado teriam lugar nos conselhos. E esses conselhos governariam a cidade, sem ter medo de oposição. O governo teria suas propostas concretas para a cidade, mas se a maioria dos conselhos definir determinada política, esta é a política do governo. E aí, obviamente que tem outras instituições, como, por exemplo, a Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativa, que muito provavelmente se oporiam a essas medidas, que seriam de ruptura do capital. E com as quais teríamos que coexistir, não necessariamente pacificamente, muito provavelmente antagonicamente, enfrentando-se com eles. Nós não temos nenhuma ilusão de que a Câmara de Vereadores, eleita por partidos tão reacionários que existem em Porto Alegre, aceitaria pacificamente um aumento dos impostos para os grandes proprietários de imóveis em Porto Alegre ou a isenção de impostos para aqueles que tenham um salário menor do que três salários mínimos, diminuir IPTU, por exemplo, nós propomos a isenção dessas tarifas, passe livre para desempregados, idosos e deficientes. Os proprietários do transporte coletivo aceitariam pacificamente?  Não, e eles têm o seu lobby na Câmara de Vereadores.

Sul21 – Seriam feitas estatizações no transporte coletivo?

Júlio Flores – A nossa ideia é essa, a estatização. Colocar todas as empresas sob controle da Carris, 100% estatal e em direção a uma tarifa simbólica de R$1 e que nós tivéssemos total controle. Seriam medidas para mudar a face da cidade, que estaria contra os poderosos, contra aqueles que lucram colocando o custo sobre os ombros do trabalhador. Então seria um governo de mobilização popular, de enfrentamento e que trabalharia com determinação pra transformar não só a cidade, mas o estado e o país. Porque a gente vê um governo desse tipo como uma tarefa dinâmica numa conjuntura de crise em que nós nos preparamos para mudar a face do país, então não teria como não ser um governo desse tipo, um governo estático.

“[Luciana] propunha outras organizações, tipo orçamento participativo, mobilização do povo, mas não especificamente um conselho popular que decidisse”

Sul21 – Ao mesmo tempo teria que ter um diálogo com, por exemplo, o governo federal na questão de verbas e de repasses.

Júlio Flores – Com certeza. A exigência dos repasses necessários dos impostos que são repassados no município, o que é muita pouca coisa, de fato.  É em torno de 20%, 25% que vem para os municípios, isso seria um dos elementos, mas também tem outra coisa: tem uma dívida do município com o governo federal. Em 2012, era R$ 1 bilhão e 300 milhões, aproximadamente, hoje deve estar mais. Mas seria um dos elementos que nós suspenderíamos o pagamento dessa dívida, para poder investir nas áreas de necessidade da população.

|Foto: Guilherme Santos/Sul21
Júlio participou da convenção do PSOL que lançou oficialmente Luciana como pré-candidata | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Sul21 – A princípio, o PSTU pensa em formar aliança com outros partidos que também estejam no mesmo campo?

Júlio Flores – Com certeza. Nós estamos em tratativas com o PSOL, PCB, mas principalmente com o PSOL, no sentido de estarmos com a Luciana Genro na prefeitura, mas levamos esses pontos que não são necessariamente coincidentes. Nós estamos debatendo até dia 5, que é a nossa convenção oficial, quando vamos decidir qual será nossa apresentação no processo eleitoral. Por enquanto, nós mantemos a nossa pré-candidatura e o que pode mudar é a nossa convenção. Tem uma decisão que é da direção do partido, que apresentou nossa pré-candidatura, mas nós abrimos o debate dentro do partido, principalmente depois que a Rede rompeu [com o PSOL]. Nós participamos do lançamento da pré-candidatura da Luciana Genro, apresentamos nossa opinião e colocamos alguns pontos, dentre eles, essa questão socialista dos trabalhadores apoiados em conselhos populares, que não foi isso que eu entendi da fala da Luciana. Ela propunha outras organizações, tipo orçamento participativo, mobilização do povo, mas não especificamente um conselho popular que decidisse. Então essa diferença é importante, é uma diferença programática, porque nós não achamos que um governo socialista dos trabalhadores, que represente o povo, possa estar apoiado em organizações tradicionais, do tipo Câmara de Vereadores e outras instituições. Não é o que a Luciana propõe exatamente. Ela levantou que a pressão popular necessariamente faria com que a Câmara aceitasse as propostas que o governo implementaria. Nós não temos essa ilusão, porque nós sabemos que os representantes dos partidos tradicionais fariam forte oposição em defesa dos interesses capitalistas da cidade, então a gente prevê um governo desse tipo, daquilo que nós propomos, com um grau razoável de mobilização e enfrentamento com o capital na cidade.

Sul21 – O PSOL, embora não tenha fechado aliança com a Rede, tem o apoio do PPL. Isso poderia ser um entrave na aliança com o PSTU?

Júlio Flores – Sim, é uma das coisas que nós levantamos, porque nós nos qualificamos como representantes dos trabalhadores, mas há uma discussão ainda entre nós com a questão mais de programa e também com a questão do PPL. Isso fica secundário em relação a esse tema programático, mas é importante, não é um problema menor.

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Mesmo acreditando que mudança não virá no regime atual, PSTU vê importância em participar das eleições | Foto: Guilherme Santos/Sul21

“Nós rejeitamos as terceirizações e as privatizações que já ocorreram na saúde. Nós trabalharíamos para a estatização”

Sul21 – Vocês cogitariam fazer, por exemplo, parcerias público-privadas em obras da cidade?

Júlio Flores – De jeito nenhum, de modo algum. A nossa proposta é inclusive a expropriação das empreiteiras e das construtoras, para colocá-las a serviço desse plano de obras públicas de capital, para construir escolas, moradias, obras de infraestrutura de um modo geral, para a melhoria das condições de vida da população. Então a gente proporia a expropriação dessas empresas e não faríamos parceria público-privada com nenhuma dessas organizações, assim como de resto, com nenhuma outra organização [privada] da saúde, educação. Nós rejeitamos, por exemplo, as terceirizações e as privatizações que já ocorreram na saúde. Nós trabalharíamos para a estatização. Nas escolas também tem um projeto em andamento, ou seja, várias instituições privadas interferem nas escolas municipais e nós rejeitamos isso, é uma interferência indevida, é um processo de terceirização e privatização do processo da educação na capital e nós somos totalmente contrários a esse processo, então trabalharemos firmemente para mudar toda essa situação.

Sul21 – Existe uma discussão dentro do partido sobre a questão de disputar eleições, se seria válido, já que não correspondem a um modelo no qual o PSTU acredita?

Júlio Flores – Entendemos que a mudança não virá de uma eleição no regime atual, mas vemos importância em disputar e apresentar nosso projeto, disputar a consciência, coração e mente do povo para nossas ideias. De fato, na nossa análise, [nossas ideias] se identificam com as ideias dos milhões de trabalhadores. Não vemos outro caminho para a mudança que não seja de luta política pelo poder nas ruas, mobilização popular, porque aqueles que estão no poder hoje não vão querer largar assim tão facilmente. E certamente tomarão medidas repressivas, como o próprio governo Dilma já tomou e governos estaduais também. Vocês lembram de 2013, não era o PSDB que estava no governo [do RS]. A lei antiterrorismo, por exemplo, é um absurdo, e foi o PT que sancionou. Essas mudanças profundas que são necessárias teriam oposições, não temos ilusão de que seria algo simples. Mas seria um momento de luta política pela mudança. Mas as eleições são importantes, foram uma conquista da Revolução Francesa diante do absolutismo feudal, mas hoje a democracia burguesa é a ditadura do capital. Porque os maiores beneficiados são os grandes empresários e os corruptos. 90% do Congresso, para ser generoso, está ligado a grandes empreiteiras, empresas, banqueiros, industriais, que é quem domina o país. E assim também as Câmaras de Vereadores, Assembleias e governos Executivos. E, obviamente, toda essa estrutura não está a favor de defender os direitos dos oprimidos, dos trabalhadores, mulheres, LGBT, negros. Mas há uma crise entre eles muito grande e acho importante nesse momento apresentarmos nossa proposta e nos preparando para mudanças mais profundas.

| Foto: Guilherme Santos/Sul21
Júlio lembra que conquistou votos expressivos em 2004, mas não se elegeu a vereador devido ao quociente eleitoral | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Sul21 – Ainda sobre o sistema atual, o PSTU é prejudicado com a questão do quociente eleitoral e do tempo de TV, por exemplo?

Júlio Flores – Sim, essa é uma questão importantíssima. Eu lembro que em 2004 eu tive 5.600 votos pelo PSTU, tivemos algo como 8 mil no total, e seriam necessários 21 mil votos para o partido. Nós não alcançamos e teve outros candidatos que se elegeram com 2.900, 3 mil votos. Isso é anti-democrático e agora há ainda a restrição do tempo de TV e rádio enormemente para quem não tem representação no Congresso, que é o nosso caso. Enquanto vemos que no berço da revolução democrática, na França, os partidos todos, independente de seu peso, tem o mesmo tempo para fazer sua propaganda.

Eu digo que há dois momentos que foram muito importantes na luta política brasileira, primeiro foi na década de 1970 com as greves do ABC Paulista, a construção do PT, da qual eu fiz parte, muito jovem. Não estava entre os principais líderes, mas participei. E aquele foi um momento muito importante, que gerou esperança entre milhões de trabalhadores de que haveria mudança. E um outro grande momento da falência do PT, que se mostrou incapaz de fazer as mudanças que os trabalhadores precisam. Acho que esse é o nosso momento, da verdadeira esquerda apresentar um projeto alternativo de sociedade, e construir nas ruas, nas mobilizações, um programa coerente que seja capaz de fazer essas mudanças. Por um lado está difícil, mas as pessoas aprenderam o que é preciso, que não pode fazer aliança com os partidos da burguesia. Porque o PT governou com PMDB, PP, PR. É um governo que de fato implantou o projeto que era igual ao do PSDB. Esse tipo de aliança não nos serve.

“Hoje, o pedido de fora todos e eleições gerais, é generalizado, as fábricas querem isso, não querem a volta da Dilma”

Sul21 – Recentemente, alguns militantes do PSTU saíram do partido, principalmente por questões de política nacional. Como o senhor vê essa saída em massa?

Júlio Flores – Nós lamentamos, não foi algo que nos deixou felizes. Mas foram oito meses, pelo menos, de debate a respeito de vários temas, e nós achávamos inclusive que as opiniões que eles defendiam poderiam ficar dentro do partido e serem debatidas. Porque são diferenças importantes, mas que poderiam ter tido a paciência de, em sendo minoria, continuar discutindo no interior do partido, mas defendendo a opinião majoritária, que é como nós funcionamos. Debatemos tudo dentro do partido e os militantes têm o direito de defender o que bem entenderem, mas uma vez definida a posição, é esta que todos devem levar para a rua. Mas decidiram fazer o que chamaram de ‘experiência em separado’, o que encaramos como uma ruptura, mas achamos profundamente equivocada. E são companheiros valorosos, quadros que o nosso partido formou durante décadas, alguns que fundaram o PSTU, que têm o mesmo tempo de militância que eu, mais de 30 anos. Não são a maioria dos que saíram, mas alguns. Numericamente, é 25% do partido. Mas seguimos debatendo e quem sabe a gente possa recompor o nosso partido.

| Foto: Guilherme Santos/Sul21
Sobre o racha no PSTU, ele lamenta a posição dos companheiros: “achamos profundamente equivocada” | Foto: Guilherme Santos/Sul21

As diferenças que levaram ao rompimento, tu tens razão, foi a postura em relação ao governo federal. Eles achavam que não era importante a gente levantar o “fora todos”, achavam que não era pertinente. E nesse sentido tomaram uma posição mais em defesa do governo da Dilma, da Frente Popular. Nós achamos que não. Dilma foi eleita com uma margem pequena para o segundo mandato, e ela havia dito que não ia atacar os trabalhadores e fez justamente o contrário. Tanto é que o ABC Paulista, nas fábricas que eram os principais defensores e eleitores do PT, agora vaiam o governo Dilma, romperam. E nós rompemos junto com a classe operária. Hoje, o pedido de fora todos e eleições gerais, é generalizado, as fábricas querem isso, não querem a volta da Dilma. As pesquisas apontam que a maioria da população quer eleições gerais e nós também defendemos isso.

Sul21 – O foco do partido é a classe operária, então. 

Júlio Flores – Sim, nós somos um partido que se volta para a classe operária, enquanto aquele que trabalha puxando a fábrica, que transforma a matéria-prima em produto. Achamos que ele que produz valor na nossa sociedade e que isso é apropriado por uma minoria. Os outros setores, como nós professores, jornalistas, bancários, comerciantes, não trabalham com a transformação da matéria-prima em produto, mas fazemos um processo de transferência da mais-valia ou das informações. Mas também somos explorados, porque vivemos do trabalho assalariado, então somos os proletários. Nós somos a classe trabalhadora como um todo, mas particularmente a classe operária. Que tem feito greves, mas não mostrou todo seu potencial de mobilização. Já contra a reforma da previdência, várias centrais sindicais farão um grande dia de paralisação em agosto em direção à greve geral, buscando parar o país contra as reformas trabalhistas e contra os governos.


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