Em Destaque|Últimas Notícias>Geral
|
25 de fevereiro de 2015
|
22:54

“Quase toda semana, eu sinto o vento da morte nas minhas orelhas”

Por
Sul 21
[email protected]
250215_FC_MG_3421
Manifestantes lembraram os 4 anos do atropelamento na Cidade Baixa | Foto: Filipe Castilhos/Sul21

Marco Weissheimer

O quarto “aniversário” do atropelamento coletivo de ciclistas no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre, foi marcado por protestos contra a impunidade do crime cometido e por uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mantendo a previsão de júri popular para Ricardo Neis, autor do atropelamento, por tentativa de homicídio de onze pessoas. A decisão foi tomada pelo ministro Rogério Schietti Cruz, que rejeitou o recurso dos advogados de Neis que pretendiam mudar a acusação de tentativa de homicídio para tentativa de lesão corporal, o que evitaria o tribunal de júri.

250215_FC_MG_3432
Ciclistas foram para a frente do Tribunal de Justiça | Foto: Filipe Castilhos/Sul21

No dia 25 de fevereiro de 2011, dezenas de ciclistas do grupo Massa Crítica foram atropelados pelo Golf dirigido por Ricardo Neis na Cidade Baixa. O motorista fugiu do local sem prestar auxílio, mas se apresentou à polícia três dias depois, alegando legítima defesa. Na ocasião, Neis argumentou que teria avançado com o carro por ter sido ameaçado de linchamento pelo grupo. Após ser denunciado pelo Ministério Público por tentativa de homicídio, ele foi internado em uma clínica psiquiátrica e ficou alguns dias detido, mas em março do mesmo ano conquistou o direito de responder ao processo em liberdade.

“Foi uma feliz coincidência essa decisão do STJ sair justamente hoje”, comentou o desembargador Tulio Martins ao receber uma carta de integrantes da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta (Mobicidade), em frente ao Tribunal de Justiça. A carta pede “celeridade e rigor no cumprimento das leis, não apenas no processo de Ricardo Reis, mas em todos crimes de trânsito, para tentarmos reduzir o número de mortes e acabarmos com a impunidade de quem usa o carro como arma, matando ou ferindo alguém.” O texto lembra ainda que “no trânsito brasileiro morrem cerca de 50 mil pessoas por ano, um número de fatalidades maior que o de muitas guerras, e isso só ocorre pela certeza da impunidade dos condutores de veículos”.

Isadora Lescano, que entregou a carta ao desembargador Tulio Martins, disse que, apesar das cenas chocantes do atropelamento coletivo ocorrido há quatro anos, ainda tem muita gente morrendo no trânsito de modo absurdo.
Isadora Lescano, que entregou a carta ao desembargador Tulio Martins, disse que, apesar das cenas chocantes do atropelamento coletivo ocorrido há quatro anos, ainda tem muita gente morrendo no trânsito de modo absurdo.

Para protestar contra esse quadro, um grupo de ciclistas se reuniu em frente ao prédio do Tribunal de Justiça no final da tarde de quarta-feira e promoveu um panelaço pelo fim da impunidade aos crimes de trânsito. Após a entrega da carta, o grupo realizou uma marcha do Tribunal até o cruzamento da José do Patrocínio com a Luiz Afonso, na Cidade Baixa. Nesta quinta-feira (26), às 19h, ocorrerá uma nova manifestação, a “Pedalada Pelada – Obscena é a impunidade”, que sairá do Largo Zumbi dos Palmares.

Isadora Lescano, que entregou a carta ao desembargador Tulio Martins, disse que, apesar das cenas chocantes do atropelamento coletivo ocorrido há quatro anos, ainda tem muita gente morrendo no trânsito de modo absurdo. “Quase toda semana, eu sinto o vento da morte nas minhas orelhas”, resumiu Isadora, que anda de bicicletas todos os dias. “Queremos o nosso direito de ir e vir com segurança. Nestes quatro anos, perdi as contas de quantas bicicletas brancas foram penduradas em Porto Alegre. Há uma hostilidade grande contra os ciclistas e as pessoas estão morrendo por bobagens”.

Usuária diária da bicicleta como meio de transporte, Isadora tem reservas em relação às ciclo-faixas criadas em algumas ruas da cidade. “Eu uso as ciclo-faixas, mas acho que elas não são funcionais, são um paliativo, um arremedo do que chamam de plano cicloviário. Além de não serem funcionais, não são seguras e, em muitos casos, levam do nada a lugar algum”.

Os ciclistas esperam que o julgamento do autor do atropelamento coletivo na Cidade Baixa, que ganhou repercussão mundial, possa servir como ponto de partida para começar a reverter esse cenário.

Foto: Filipe Castilhos/Sul21
Foto: Filipe Castilhos/Sul21
250215_FC_MG_3477
Foto: Filipe Castilhos/Sul21

 

250215_FC_MG_3481
Foto: Filipe Castilhos/Sul21

 

 


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora