Sergio Araujo (*)
Em represália á imprensa brasileira que na sua opinião não fez a devida divulgação do pronunciamento realizado na Conferência da ONU, Jair Bolsonaro anunciou que não dará mais entrevistas até que o conteúdo publicado seja reformulado. Trata-se, inequivocamente, de uma chantagem, algo inaceitável para um governante que jurou obediência a Constituição que, dentre suas garantias, assegura o direito à liberdade de imprensa. Mas considerando seu histórico, tudo indica tratar-se de mais uma das suas bravatas.
Ocorre que por ser o presidente da República, essa atitude adquire feições de mau exemplo. Talvez por considerar-se realmente um Mito, que está acima de tudo e de todos, Bolsonaro tem classificado determinados veículos da imprensa nacional como mentirosos e adeptos do uso de fake news. Tal atitude, digna de governos autoritários, tem produzido seguidores. Dentro e fora do governo. O que agrava ainda mais o problema.
O ministro da Economia Paulo Guedes, por exemplo, em represália as alterações promovidas pelo Congresso Nacional no texto original da Reforma da Previdência, disse ser favorável à repactuação da distribuição dos recursos para os já depauperados estados e municípios. Na mesma linha atuam os ministros da Educação, Meio Ambiente, Relações Exteriores, Mulher, Família e Direitos Humanos e outros mais.
Até mesmo a estratégia do “morde e assopra” de Bolsonaro está sendo copiada pelos seus fiéis seguidores. A polêmica Damares Alves é uma delas. Após dizer que “a gravidez é um problema que dura só nove meses” a ministra resolveu “dourar a pílula” anunciando que pretende propor ao Congresso Nacional o aumento do período da licença maternidade remunerada de quatro meses para um ano.
Surfando na onda do bom-mocismo, Abraham Weintraub resolveu mostrar “boa vontade” para com o ensino público superior. Depois de afirmar que o corte de verbas para universidades federais estava atrelado ao plano do governo Bolsonaro de priorizar a educação básica e que para cada aluno de graduação colocado na faculdade ele poderia trazer dez crianças para uma creche, o ministro da Educação anunciou recentemente o descontingenciamento de R$ 1,156 bilhão para as universidades federais. Ele não diz, mas a mobilização dos estudantes e do universo acadêmico foi fundamental para a mudança de postura do governo.
Diante dessas atitudes camaleônicas é preciso entender que a atual fase de indulgência do governo, refletida na nova forma de se comunicar, não tem nenhum traço de arrependimento e muito menos de conscientização de erro ou equívoco. Tudo é planejado e intencional. E com motivação clara. Por conta das pesquisas de opinião que mostram um decréscimo vertiginoso da popularidade do presidente e do seu governo. Pelo desgaste da imagem do Brasil à nível internacional. Pela gestão inoperante realizada até agora. Pelas eleições municipais que se aproximam. E muito mais.
Não podemos esquecer que estamos diante de um governo que, além da aptidão pela prática de atitudes cruéis, tem a desfaçatez como uma das suas características. Ou a não apresentação prévia de um plano de governo e a ausência de Bolsonaro nos debates durante a campanha eleitoral não foi propositalmente uma grande e programada dissimulação? Por isso o emudecimento midiático de Bolsonaro. Seu silencio não passa de um grito autoritário de “não me desmintam”.
Tal qual um enlouquecido Dom Quixote verde-oliva, Bolsonaro não percebe que está lutando contra moinhos de vento intransponíveis e que sua tropa de fanáticos seguidores não passa de um grande e atabalhoado Exército de Brancaleone. O que, convenhamos, pode ser péssimo para ele, mas salvador para o país.
(*) Jornalista
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