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4 de setembro de 2019
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19:52

Bolsonaro e o empoderamento do ódio

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Sul 21
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Bolsonaro e o empoderamento do ódio
Bolsonaro e o empoderamento do ódio
Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil

Sergio Araujo

Quando eclodiram as manifestações de rua pedindo o impeachment de Dilma Rousseff eu achava folclórico a presença de faixas pedindo o retorno das forças armadas à vida política do país. Bando de malucos saudosistas, pensava. Distraído, imaginando viver numa democracia plena, não percebi que se tratava de um indício da preparação de um golpe e que o clamor pelas forças armadas nada mais era do que o chamamento dos especialistas no assunto. O objetivo dos tais protestos, sabe-se hoje com clareza, foi a implantação de uma ditadura econômica-militar-religiosa.

Na época, como se não bastasse o apelo ao “braço forte, mão amiga”, os adeptos do radicalismo de direita foram buscar a “clava forte da justiça”, no caso um juiz que surfava no imaginário popular como o “paladino da justiça”, aquele que é implacável no combate a corrupção. Era o apogeu da era Sérgio Moro, com direito a boneco inflável trajando roupa de super-homem e tudo mais.

Para completar os preparativos da estocada fatal faltava ao movimento um porta-voz convincente e ele foi encontrado naqueles que sempre participaram dos grandes golpes do país: o monopólio da mídia. No caso, as grandes empresas jornalísticas. Estava fechado a cerco. Não apenas para o afastamento de uma presidenta legitimamente eleita, mas para tirar o PT do poder, colocando-lhe a pecha de culpado pelas mazelas do país.

Tamanha conspiração acabou encontrando na vocação fisiológica do Congresso Nacional o campo ideal para a batalha final. Dilma foi expurgada da presidência numa votação tragicômica que ficará marcada para sempre na história do parlamento brasileiro. Mas a vitória das forças do atraso estava incompleta. Faltava Lula, símbolo maior do PT e favorito para vencer as eleições de 2018.

Ou seja, havia chegado a derradeira hora do “super-paladino” da Justiça mostrar à que veio. E ele fez isso de uma maneira impiedosa e implacável. Tornou Lula um prisioneiro político. Estava aberto o caminho para que o radicais de direita, aqueles cujos representantes portavam faixas pedindo a volta dos militares, tomassem o poder.

O resto todos sabemos. O Mercado (poder econômico), sempre pragmático e oportunista, decidiu apoiar para presidente aquele que aparecia nas pesquisas com capacidade para derrotar o PT. Um ex-capitão do Exército que como político se projetou mais pelo seu destempero verbal do que por seu desempenho como parlamentar. Alguém que pelas suas limitações intelectuais fosse facilmente influenciado e manipulado. Não deu outra, ajudado pelo sentimento antipetista provocado pela grande mídia e estimulado pelas fake News e pelo acaso (facada), o “azarão” venceu a eleição.

Uma vez empossado, na sensação ilusória de que tudo pode e pode tudo, caracterizada pelos constantes arroubos ditatoriais de que “quem manda sou eu”, Bolsonaro assegurou deferências e repartiu seu governo dentre aqueles que considerava seus mentores e aliados. No primeiro caso despontam os filhos Eduardo, Flávio e Carlos, o presidente dos EUA Donald Trump e o guru Olavo de Carvalho. No segundo, Sérgio Moro, Paulo Guedes, evangélicos, militares, grandes empresários do agronegócio e do setor extrativista e outros afins.

Mas para completar o rol de agentes patrocinadores do golpe e de apoiadores da sua eleição estava faltando a imprensa. Não se enganem, Bolsonaro sabe ser grato aos seus. Todos esses frequentes atritos com a imprensa não passam de “cortina de fumaça” para justificar a diferença de tratamento entre os veículos que apoiam seu governo e os que, segundo ele, fazem oposição. Mas mesmo assim não podemos esquecer de que todas as grandes empresas de comunicação adotam posição de submissão à aplicação do receituário neoliberal do governo Bolsonaro.

Mas e para seu exército de leais e fanáticos seguidores, o que Bolsonaro reservou? Pensem no que mais satisfaz um fascista e terão a resposta. Quem disse que é nacionalismo exacerbado; governo totalitarista, corporativista, militarista e obcecado com a segurança nacional; desprezo pelos direitos humanos, por intelectuais e artistas; controle da mídia e censura; e uso da religião como forma de manipulação, acertou em cheio.

É por isso que os apoiadores do ”Mito” pouco se importam com a estagnação da economia, com os milhões de desempregados, com o desmatamento da Amazônia, com a redução do orçamento para a Educação, para as pesquisas que mostram a crescente perda de credibilidade do presidente e da desaprovação do seu governo e muito mais.

Para estes, o que importa é a sensação de dominação, nutrida pelo ódio pela discriminação, pelo preconceito e pela intolerância que diariamente são ministrados pelo presidente-ditador. Apesar de algumas baixas, os que permanecem no “time” estão cada vez mais destemidos e arrojados. Já não se escondem mais no anonimato, pois sentem orgulho da causa que defendem.

Adeptos da formação de milícias, atuam como se fossem representantes da neo-KKK brasileira, ora fazendo ameaças pelas redes sociais, ora partindo para a agressão física e ora ofendendo artistas ou intelectuais em espetáculos e eventos públicos.

Pois é deste universo de abduzidos pela maldade que sairão os candidatos da “nova ordem” e da “nova política” nas próximas eleições. Por isso é necessário ter todo o cuidado possível com os embriões da serpente bolsonariana que estão sendo gestados. Eles já nascem com o veneno hipnótico que intoxica as pessoas com falsos conceitos de pátria e Deus.

Mas como na vida sempre existe um antídoto para tudo, o grande desafio dos que prezam a democracia, a liberdade e a cidadania será encontrar um antídoto para evitar a propagação do fascismo. Com urgência e sem divisão.

(*) Jornalista

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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