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17 de julho de 2019
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19:45

Quando a polêmica vira disfarce da manipulação  

Por
Sul 21
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Quando a polêmica vira disfarce da manipulação   
Quando a polêmica vira disfarce da manipulação  
Reprodução/Youtube

Sergio Araujo (*)

O Brasil está precisando de um “papo reto”, expressão que vem sendo utilizada para definir uma conversa franca e verdadeira. Porque estamos vivendo uma fase de muito disse me disse. Muita desfaçatez. E isso está tornando lugar comum a prática e a aceitação da falsidade e das chamadas segundas intenções como algo normal, tolerável, compreensível. E não é. Por várias razões. A principal delas é porque tira o foco daquilo que é importante e que realmente interessa ao país e aos brasileiros.

Em uma nação com mais de 13 milhões de desempregados, os factoides criados pelo presidente da República não podem ser considerados como de interesse nacional. Por mais que isso seja atraente à imprensa, que explora o sensacionalismo e que tem sido a principal fonte propagadora da estratégia governista de disfarçar a realidade. Porque acostuma os alienados em política a acreditarem nos absurdos divulgados e porque potencializa o conflito entre os ideologicamente contrários, desperdiçando tempo e energia em pautas de importância secundária.

Claro que tem absurdos intoleráveis e que precisam de contraponto, como a recente afronta presidencial de querer indicar o filho deputado para a embaixada brasileira em Washington (EUA). Ou a ideia de transformar estações ecológicas em paraísos turísticos.  E tantas outras aberrações. Tais polemicas, entretanto, não passam de cortina de fumaça para as grandes mentiras que pouco a pouco começam a ser digeridas e, consequentemente, toleradas. Senão vejamos:

Para a aprovação da reforma trabalhista o então presidente Michel Temer defendeu que ela seria a solução para a geração de novos empregos. O que se viu foi exatamente o contrário. Para júbilo dos patrões. Mas foi no novato governo Bolsonaro que o engodo proliferou de uma forma tal que adquiriu feições de programa de governo. A começar pela tramitação da reforma da previdência, apresentada como solução para o desequilíbrio do erário nacional, e cujo texto em elaboração penaliza quem ganha menos e beneficia quem ganha mais. Isso sem falar na alteração dos limites de idade para a aposentadoria, onde o grande desafio será manter o trabalhador vivo até que ele alcance o direito ao benefício.

Pois bem, prevendo mais um descompasso entre o que é dito e o que de fato acontece, o governo já trata de encontrar uma desculpa. Começa a dizer que para os efeitos da reforma da previdência serem de fato eficazes é preciso a implementação de outra reforma, desta vez a tributária. Levando em conta a lógica precedente, alguém tem dúvida de que a iniciativa vai sobrecarregar ainda mais os empresários de pequeno porte e beneficiar as grandes empresas, especialmente as multinacionais? Resultado, mais desempregados.

Pois é, e assim, no compasso das medidas ilusórias, vão-se corroendo as expectativas e as esperanças dos brasileiros de viverem num país onde o cidadão valha mais do que o vil metal e a ambição pelo poder. Onde seus representantes atuem de fato como procuradores dos seus interesses e dos seus destinos. Por falar nisso, repararam no silencio dos nobres edis em relação a imprescindível reforma política? Essa sim reformadora e moralizadora.

Tudo isso explica a razão de tanta dubiedade. Tanta preferência pela polêmica e pelo mi mi mi desenfreado. E por isto é preciso mostrar que tudo é intencional. Premeditado. Proposital. Esse deve ser o discurso. Essa deve ser a cobrança. Esse deve ser o brado levado às ruas. Essa deve ser a conversa nos bares, nas filas dos ônibus, nas refeições em família e nos pátios das escolas e universidades. Sem medo. Sem vergonha. Com toda clareza e objetividade. Para mostrar que vida não é um smartphone, muito menos um game virtual.

Essa é a mensagem que os brasileiros conscientes e responsáveis têm a obrigação de repassar para a população, especialmente para os jovens. De que existe vida real do outro lado das redes sociais e dos noticiosos tendenciosos. E de que elas(es) estão servindo de instrumento para tentar nos manipular e nos usar como avatares de uma realidade fantasiosa, cujas mensagens subliminares, minuciosamente concebidas e criteriosamente propagadas, nada tem de entretenimento e muito menos de boas intenções. Esse pessoal que se diz do bem, acreditem, está fazendo mal ao Brasil.

(*) Jornalista

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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