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26 de junho de 2019
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19:12

O blefe da reeleição de Bolsonaro

Por
Sul 21
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O blefe da reeleição de Bolsonaro
O blefe da reeleição de Bolsonaro
Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, ministro da Economia. Foto: Isac Nóbrega/PR

Sergio Araujo (*)

“Pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos todo o tempo”. (Abraham Lincoln)

“Se o povo quiser, estamos aí para continuar mais quatro anos”, disse Jair Bolsonaro na Marcha para Jesus, em São Paulo. Pronto, se os incrédulos sobre a previsível derrocada do Brasil nas mãos dele precisavam de um estímulo para fazer cair a ficha, essa é a deixa. Qual presidente em sã consciência poderia, em apenas seis meses de um governo que até agora não disse a que veio e que só semeou discórdia e confusão, ousaria falar em reeleição? Inacreditável tudo isso. Realmente estamos diante de um mito da utopia e da insensatez.

Mas a pergunta que se impõe é: Que povo é esse referido pela bravata presidencial? Os evangélicos? Os saudosistas dos governos militares? Os antipetistas radicais? A turma do bandido bom é bandido morto? Os que se deixaram iludir (muitos já arrependidos) pela inimaginável associação entre radicais de direita e liberais, apresentada como a nova era da democracia representativa? Enfim, que povo é esse que só cabe na bolha do imaginário bolsonariano?

Certamente não é a integralidade do povo brasileiro. Senão vejamos. Jair Bolsonaro obteve no segundo turno da eleição presidencial, considerando-se apenas os votos válidos, 57,7 milhões de votos. Ou seja, dos eleitores que fizeram uma escolha entre ele e Haddad, 55,13% votaram nele. Mas e os que decidiram não votar em nenhum dos dois, seja se abstendo, seja votando em branco ou anulando o voto? E os que optaram pelo candidato petista? Bem, se considerarmos esse contingente veremos que a tal de maioria pró-Bolsonaro não se repete. Cai para 49,8%. E mais, se incluirmos nessa conta o número total de eleitores brasileiros (os que compareceram às urnas e os que não foram votar) o percentual dos que referendaram o nome de Bolsonaro despenca para 39%.

Mas já que ele fala em povo e não em eleitores, se levarmos em conta que o total de brasileiros beira os 210 milhões de pessoas, o número de votos que o ex-capitão conquistou no pleito de outubro do ano passado representa apenas pouco mais do que um quarto (27,5%) da população. Ou seja, a imensa maioria dos brasileiros já não o quis em 2018. Por isso a declaração de Bolsonaro, de que se o povo quiser ele disputará a reeleição, não passa de mais uma das suas bravatas. Ou no mínimo uma tentativa de parecer maior do que realmente é.

E esse é o grande desafio e o hercúleo esforço de Bolsonaro e seus apoiadores, sintetizados na frase inicial deste artigo. Mostrar, mesmo que de forma ilusória e ardilosa, que continuam fortes e com apoio popular. Por isso as ações governistas focam somente naquilo que é de interesse do seu público alvo e não no interesse da sociedade como um todo. Uma espécie de não nos deixem só. Por isso as entrevistas do presidente e dos ministros em programas populares de televisão. Por isso a convocação de mobilização de rua sem qualquer pauta que justificasse a aglomeração. Por isso o cala boca forçado dos irmãos Bolsonaro e do sei lá o que Olavo de Carvalho.

Aliás, a ausência de antigos parceiros como o MBL e o Sai Pra Rua nas últimas mobilizações pró-Bolsonaro mostra a existência de fissuras na imagem do Mito. De tal forma e de tal maneira que a mobilização de apoio à Sérgio Moro, organizada pelos dois grupos para o próximo domingo, está sendo promovida sem a participação objetiva do presidente, do seu partido e dos seus aliados.

Isto prova não apenas o desgaste do presidente, facilmente identificado nas pesquisas, mas também o reflexo contaminante que isso está provocando na sua equipe de assessores, a começar pelo todo poderoso ministro da Justiça, considerado um dos “Ases” do governo, e que foi moral e juridicamente ferido pelas denúncias do site The Intercept.

Tudo isso (e muito mais) deixa no ar a sensação de que o castelo de cartas do “Salvador da Pátria” começou a ruir. E algo me diz que não vai adiantar buscar ajuda no posto Ipiranga. Por falar nisso, alguém tem notícias do Paulo Guedes?

(*) Jornalista

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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