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20 de julho de 2018
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17:58

De frente para o rio, de costas para a cidade

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Sul 21
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De frente para o rio, de costas para a cidade
De frente para o rio, de costas para a cidade
“Prefeito vive as rusgas com o funcionalismo municipal e com a Câmara de Vereadores”. (Foto: Maia Rubim/Sul21)

Sergio Araujo (*)

Em 2002, um técnico japonês, integrante da missão do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) – instituição que analisava a possibilidade de emprestar recursos para o a despoluição do lago/rio Guaíba (Pró-Guaíba) e torná-lo um dia novamente balneável -, ao sobrevoar Porto Alegre de helicóptero, ao entardecer, surpreendeu-se com a evasão de um expressivo número de veículos e pessoas do centro da cidade para os bairros. Seu comentário foi de que em qualquer cidade do mundo que tivesse essa interface urbana com o rio o sentido do fluxo seria o inverso. Uma constatação um tanto óbvia para um estrangeiro que desconhece a tradição de abandono histórico da orla e do próprio Guaíba.

Pois bem, passadas duas décadas e meia da oportuna observação, a prefeitura de Porto Alegre, num esforço que envolveu duas administrações (Fortunati e Marchezan), inaugurou no dia 29 de junho as obras de revitalização da orla do Guaíba no trecho compreendido entre a Usina do Gasômetro e a Rótula das Cuias. Nestes 1,3 quilômetros foram concentradas arquibancadas, deques, passarelas, bares e restaurantes. Tudo muito moderno e bonito, possibilitando que os frequentadores do local possam passear e curtir o pôr-do-sol com muito mais conforto e segurança. Banho ainda não dá para tomar, pois a ambicionada despoluição do Guaíba não deslanchou.

Apesar do entusiasmo inicial, a ponto de um dos principais jornais do estado dizer que “a obra devolveu o orgulho aos porto-alegrenses” a realidade mostra que a situação é uma exceção diante do verdadeiro abandono que se encontra a cidade. E que não rotulem a crítica como má vontade, de quem só enxerga o lado negativo das coisas. Basta um rápido passeio pelo zona central e arrabaldes para constatar o desleixo que a cidade se encontra. Obras inacabadas que se prolongam ano após ano, como a recuperação do Largo dos Açorianos, a revitalização do Cais Mauá, os viadutos e avenidas previstos para a Copa de 2014 e outras mais.

Isso sem falar na negligência com os serviços rotineiros, de encargo municipal, como a recuperação das vias públicas (a buraqueira nas ruas lembra o solo lunar), a falta de capina nas praças e parques, o zelo com prédios e monumentos históricos, a falta de atenção aos moradores de rua, que já montam acampamentos nos canteiros das principais avenidas e sob os viadutos e pontes da cidade, e muito mais. Até mesmo coisas simples, como a contratação de uma empresa para fazer voltar a funcionar os relógios digitais, se tornou uma novela infindável.

E como se não bastasse, o prefeito vive as rusgas com o funcionalismo municipal e com a Câmara de Vereadores. Ou seja, desdenha daqueles que poderiam lhe auxiliar na busca de soluções para a melhoria de Porto Alegre. Entronado em seu autoritarismo, parece crer que a bela fachada litorânea do entorno do centro histórico será capaz de esconder as mazelas que estão as suas costas. Tal postura daria um belo slogan para identificar a atual gestão municipal: “De frente para o rio, de costas para a cidade”.

Mais humildade prefeito! Existe vida longe da orla precisando de ajuda e atenção. Governar não é uma festa, é um ato de solidariedade e de respeito as diferenças. Faça com que o ocaso do sol não se repita no seu cuidado com os porto-alegrenses.

(*) Jornalista

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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