Sergio Araújo (*)
Pois o maquiavelismo político de Michel Temer, que resultou no golpe que depôs a presidenta Dilma, legítima e democraticamente eleita, e lhe alçou ao cargo máximo do país, fez mais uma vítima: a institucionalização do cargo de vice-presidente, que pode ser denominada de a “Maldição de Temer”. Sim, pois ao invés da imagem de parceiro leal do titular do cargo, ser vice-presidente, na concepção “temerista”, passou a ser sinônimo de oportunismo. Alguém pouco confiável. Um traidor de plantão.
Justificada, pois, a dificuldade dos pré-candidatos à presidência da República para a indicação dos seus vices. E não por escassez de nomes, mas pela recusa daqueles que foram convidados. E o estigma de Temer falando mais alto.
Daí a extrema dificuldade de Bolsonaro e Alckmin, por exemplo, conseguirem parceiros de chapa.
No primeiro caso, pelo risco de formar fila com aquele que é o mais bélico de todos os candidatos. Literalmente. Nas declarações e nas atitudes e, principalmente, na ameaça que representa ao regime democrático. No outro, pela composição mafiosa e suspeita dos partidos que compõem o tal de “Centrão”, “Blocão”, ou seja lá o nome que derem ao agrupamento de siglas que firmaram pacto fisiológico para tomar de assalto o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional.
Isso sem falar no PMDB, o aproveitador-mor do poder, que praticamente deixou a candidatura de Henrique Meirelles à deriva. Patinho feio da eleição, por representar um governo recordista de impopularidade, conseguir alguém que assuma o papel de kamikaze na condição de vice é o mesmo que dizer publicamente que o suicídio político é uma obrigação, um dever.
Mas a dificuldade de compor as chapas majoritárias não se restringe aos vices. Também a cabeça da chapa, por diversas razões – dentre as principais a dificuldade de formatar coligações, a escassez de recursos e a priorização de interesses individuais -, tem dificultado a vida de vários partidos. E não foi por falta de tentativa. A começar pelos candidatos outsiders, como Joaquim Barbosa, Luciano Huck e Dr. Rey, até políticos conhecidos como Rodrigo Maia (DEM) e Aldo Rebelo (SDD). E tudo indica que teremos mais desistências.
À se considerar a máxima de que “um partido político existe para disputar o poder e executar seu programa”, a resistência das siglas em lançar candidaturas próprias e dos políticos de aceitarem a missão de concorrer evidencia a crise generalizada porque passa o país. Não é falta de nacionalismo ou de lealdade partidária, é temor, medo mesmo, de que possa ter sua vida vasculhada e dar visibilidade aos segredos escondidos sob o tapete da moralidade.
Daí a preferência pela segurança do mandato conquistado pelas eleições proporcionais, que garantem a proteção do fórum privilegiado, do que a ousadia voluntariosa de uma campanha majoritária, muito mais arriscada.
Mas como diz o ditado, não há mal que sempre dure e não há bem que nunca acabe. A vitória eleitoral não é uma conquista obtida por covardes. E nem o mandato se presta como esconderijo de malfeitores. Embora o insipiente esboço de reforma política – idealizado para garantir privilégios e deixar tudo como está – não permita otimismo quanto a depuração das casas legislativas, especialmente, a insatisfação popular continua sendo o principal agente de transformação e será ela que, nas urnas, fará a faxina necessária. É apenas uma questão de tempo.
(*) Jornalista
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