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5 de março de 2015
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11:28

Uma cidade sem pressa de ser feliz

Por
Sul 21
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Por Sergio Araujo

Quem viu as fotos do prefeito José Fortunati transitando alegremente pelo chamado Caminho do Gol, no último domingo, no trecho entre o viaduto dos Açorianos e o estádio Beira-Rio, pode ter pensado que a capital dos gaúchos é próspera em lugares propícios ao lazer e ao entretenimento. Ledo engano. Trata-se de imagens que mostram a excepcionalidade de um acontecimento. Fake, como dizem os internautas. E isso é um dos tantos problemas crônicos do antigo Porto dos Casais, que completa 243 anos de fundação, e que se prolongam governo após governo.

A demora para que as coisas aconteçam em Porto Alegre – e não é de agora – coloca em cheque a denominação da cidade. Como chamar de Alegre uma cidade onde seus habitantes não podem desfrutar adequadamente das maravilhas da natureza e nem dispor de um local amplo e apropriado para realizar seus eventos e festividades? A começar pela orla do Guaíba e seu paradisíaco pôr-do-sol. Por que o tão aguardado projeto de revitalização do Cais Mauá não consegue sair do papel? Por que as melhorias previstas para a área que margeia o Guaíba entre a Usina do Gasômetro e a chamada Rótula das Cuias, numa extensão de apenas 1,3 Km, se arrastam sem perspectiva de quando serão iniciadas? Por que o anfiteatro Pôr-do-Sol não recebe melhorias para deixar de parecer um aterro improvisado, com uma rudimentar concha acústica?

Lembro de um fato onde um japonês, técnico do Banco Mundial, num final de tarde, ao sobrevoar de helicóptero a orla do Guaíba, próximo ao Mercado Público, ficou surpreso ao ver a migração dos porto-alegrenses do Centro para outros bairros. Segundo ele, tal procedimento contraria a tendência mundial dos municípios que possuem o privilégio de contar com uma orla marítima, ribeirinha ou lacustre. Nessas localidades, segundo ele, a migração é inversa. Ou seja, a população, no final da tarde sai do trabalho ou das suas residências para ir desfrutar dos atrativos dessa orla. Mas é justamente aí que está o xis da questão de Porto Alegre: Onde estão os atrativos?

Mas as deficiências não se restringem apenas ao mau aproveitamento de nossa beira rio ou beira lago, como queiram. Por que a capital ainda não dispõe de um local adequado, amplo, confortável e bem equipado, para abrigar grandes eventos? Há pouco tivemos que amargar críticas da mídia nacional e internacional sobre a precariedade do Gigantinho para sediar as lutas do UFC. E mais, por que ao contrário de outras capitais o nosso Sambódromo tem que ter essa cara de passarela suburbana, terceiro mundista? E a precariedade dos nossos parques? A começar pela Redenção, Parcão e Marinha. Por que estão fadados a ter uma vida útil de apenas doze horas? E os nossos morros? Por que permitem que se tornem amontoados imobiliários, formais ou informais, ao invés de áreas turísticas de uso comum, protegidas ambientalmente?

Tudo isso sem falar da balneabilidade do Guaíba, cuja despoluição se transformou em sonho de geração após geração, e que nunca se torna realidade? Os moradores de Ipanema deveriam se sentir envergonhados de residirem num arremedo de balneário que possui a mesma denominação da bela e conhecida praia carioca.

E que não se justifique a demora da realização dos investimentos pela escassez financeira. Muitas são as cidades, inclusive em países e estados de menor poder econômico que Porto Alegre, o Rio Grande do Sul e o Brasil, que souberam utilizar a criatividade e a competência para encontrar soluções para os necessários empreendimentos. É o caso da Estação das Docas, em Belém do Pará, e da orla marítima de Florianópolis (avenida Beira Mar), no Brasil, e do Porto Madero, em Buenos Aires, na Argentina. Para ficar apenas na América do Sul.

Porque não utilizam as propaladas PPPs (Parcerias Público Privadas) para realizar os investimentos necessários? Ou será que dinheiro público (BNDES) só pode ser aplicado em portos dos países amigos, como Cuba por exemplo? Ou será que a contrapartida das grandes empreiteiras só pode beneficiar os partidos e seus dirigentes corruptos e nada mais? Ou será mesmo a falta de líderes competentes, inovadores e comprometidos com as causas de interesse público, como foram Loureiro da Silva, Thompson Flores e Guilherme Sociais Villela, que mudaram para melhor as feições de Porto Alegre?

Bem, seja qual for o motivo ou a razão, o certo é que não dá mais para tolerar tamanha falta de aptidão para o desenvolvimento e a prosperidade. Até parece que vivemos numa cidade que avança em slow motion. Tudo se arrasta. De obra de infraestrutura até a implantação de serviços. Além do que está faltando primor no zelo pela manutenção de nossos monumentos, viadutos, pontes, praças, parques, ruas e avenidas. Vejam a demora da reconstrução da parte do Mercado Público que foi incendiada em julho de 2013. Ou seja, nem o dever de casa está sendo bem feito.

Tudo isso me leva a crer que Porto Alegre está precisando de um gestor que tenha predisposição à iniciativa de empreender, realizar, executar e concluir. Que tenha pressa de melhoria. Que saiba governar o governo. Que pense e atue mais como cidadão e menos como político. Alguém que queira ser e fazer os outros felizes. Que ambicione morar e viver numa cidade realmente alegre.

Sergio Araujo é jornalista e publicitário.


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