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17 de dezembro de 2014
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10:23

Os desafios de Sartori

Por
Sul 21
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Os desafios de Sartori
Os desafios de Sartori
Bernardo Jardim Ribeiro / Sul21
Bernardo Jardim Ribeiro / Sul21

Falta muito pouco para que José Ivo Sartori tome posse como novo governador do Rio Grande do Sul. E ele chega num período onde a histórica crise financeira do Estado está, pelo que dizem as notícias, na sua fase mais crítica. Mesmo com a parcial colaboração federal, que aceitou fazer um rearranjo financeiro da dívida dos estados para com a União, tudo indica que a cura dos males da estagnação do desenvolvimento do Rio Grande ainda vai demorar. Tal qual a tão aguardada cura AIDS, cujo vírus HIV, apesar de identificado, ainda não resultou numa vacina eficiente para a cura da doença, os motivos pelo crescente desequilíbrio das finanças do Estado, apesar de ter suas causas conhecidas, ainda não recebeu o tratamento estrutural necessário.

E o que não faltou foram oportunidades para tanto. Desde a redemocratização e do retorno das eleições diretas, cinco partidos já ocuparam o Palácio Piratini. O PP (na época PDS), o PDT e o PSDB uma vez, com Jair Soares (1983-1986), Alceu Collares (1991-1994) e Yeda Crusius (2007-2010); o PT duas vezes, com Olívio Dutra (1999-2002) e Tarso Genro (2011-2014); e o PMDB três vezes, com Pedro Simon (1987-1990), Antônio Britto (1995-1998) e Germano Rigotto (2003-2006). E foram muitas as tentativas.

O governo Britto, por exemplo, com a criação do Programa de Concessão Rodoviária, lançou o embrião da parceria público-privada, posteriormente desmontado pelo governo Tarso, que criou a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR). Também o governo Rigotto esboçou uma medida estrutural para a deficitária previdência estadual, separando as áreas da saúde e da previdência no Instituto de Previdência do Estado. Faltou completar o serviço criando a previdência complementar para os novos servidores que ingressassem no serviço público estadual. Não resolveria o problema de imediato, mas seria a solução a longo prazo.

Primeiro governador negro do Rio Grande do Sul, Alceu Collares empunhou a bandeira da Educação e fez inovações ousadas para a época, e por isso mesmo fortemente contestadas. Dentre elas o Calendário Rotativo, semente do que hoje se chama de Escola em Tempo Integral, e a exigência de uma maior participação dos professores em atividades realizadas dentro da sala de aula, medida esta que pode ser considera matéria-prima da atualmente chamada meritocracia.

No primeiro governo petista, Olívio Dutra levou para o Estado a sua maior conquista do tempo em que foi prefeito de Porto Alegre, o Orçamento Participativo. Que teve prosseguimento no governo Rigotto sob a denominação de Consulta Popular e que continua valendo até hoje. Inclusive com a mesma deficiência: não executar na integridade o que foi indicado pela população como prioridade.

O governo Yeda, por sua vez, tentou equilibrar as finanças estaduais através de um choque de gestão denominado “Déficit Zero”, que propunha reduzir o déficit financeiro do Estado, que perdurava havia décadas, mediante o corte de cargos de confiança (CCs), a reestruturação da máquina pública e a contenção de despesas e racionalização da receita. Já com parcos recursos disponíveis e com sua credibilidade afetada pela agressividade oposicionista e pelas denúncias de corrupção no Detran, sua gestão ficou centrada praticamente na busca do tão almejado equilíbrio das contas públicas.

Por último veio Tarso Genro, naquele que seria o segundo governo petista. Tarso assumiu numa época em que a arrecadação do Estado mal dava para pagar os custos da máquina administrativa. Daí a imposição do chamado “Alinhamento das Estrelas”, tendo em vista a dependência do Estado para com a União objetivando a realização de investimentos em obras e serviços públicos. Conseguiu atingir esse objetivo parcialmente. Algumas obras foram executadas, como a conclusão da Rodovia do Parque (BR-448), e outras assumidas, como a duplicação da segunda ponte sobre o Guaíba e a implantação do metrô em Porto Alegre. Para amenizar a desesperadora situação financeira do erário, Tarso raspou o tacho dos recursos disponíveis, fazendo empréstimos em instituições financeiras e até mesmo saques dos depósitos judiciais, sem falar do uso do Caixa Único.

E o que Sartori vem pregando? Dentre outras coisas, a parceria público-privada para a realização de investimentos na área de infraestrutura; a busca de uma solução para o déficit previdenciário; o equilíbrio financeiro entre receita e despesa; a busca de financiamentos externos; e a melhoria da prestação dos serviços públicos. O que equivale dizer o mesmo do mesmo. E ai está a comprovação de um das principais razões da estagnação do desenvolvimento do Rio Grande. A descontinuidade das ações implementadas pelos governos anteriores. É o tal “se não fui eu que fiz não presta”. Como assim? O interesse partidário se sobrepondo ao interesse coletivo? É a tal política do balde de caranguejo, onde quem está trás, para subir, puxa quem está na frente.

Bem, mas o Sartori se elegeu com o slogan “Meu partido é o Rio Grande”. Então dá para dizer que essa mentalidade está com os dias contados? Oxalá esteja. Mas não será nada fácil. A situação das finanças do Estado é tão crítica que não pode ser vista como missão de um homem só. Ou de um só governo. Para que o Rio Grande realmente encontre o caminho da superação o esforço tem que ser coletivo. Mas para isso é preciso que os gaúchos – todos os gaúchos – estejam conscientes das dificuldades e realmente dispostos a modificar esta realidade.

De parte do novo governo, basta que o pouco que foi dito durante a campanha se comprove na prática. Que o diálogo seja realmente a ferramenta de trabalho de Sartori. Que a transparência dos números e das intenções seja uma constante. Que a busca de uma gestão inovadora e eficiente seja uma obstinação. Que a simplicidade, a honestidade e o espírito público sirvam de Norte para a conduta de todos os integrantes do novo governo, independente do cargo ou partido que representam.

Mas a construção do Rio Grande que sonhamos não depende apenas do governo ou do cidadão. Depende também da qualidade da oposição. Se é verdade que a mesma urna que elege o governante, elege também a oposição, e é, tal papel precisa ser desempenhado com responsabilidade e senso crítico compatível com o interesse popular. Daí a importância da fiscalização permanente dos atos do Executivo. Não visando apenas a próxima eleição, mas a correção de rumos e de equívocos. Adotando uma postura mais propositiva e menos destrutiva.

Que os próximos quatro anos sejam de avanço e não de estagnação, e muito menos de retrocesso. Já chega o tempo perdido e as experiências mal sucedidas. O Rio Grande e os gaúchos merecem mais. Muito mais.

Sérgio Araújo é jornalista e publicitário


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