Colunas>Sérgio Araújo
|
10 de novembro de 2014
|
10:44

Afinal, para que serve a oposição?

Por
Sul 21
[email protected]

Pronto. Foi-se mais uma eleição. E que eleição! Nunca na história desse país se produziu uma campanha tão tumultuada e com tantos ataques a biografia pessoal e política dos candidatos a governador e presidente da República. Ninguém foi poupado. Mas no final a voz das urnas se fez ouvir. E a mesma urna que escolheu os futuros governantes definiu, também, aqueles que irão exercer o papel de oposição. Mas que oposição é essa? A do estilo PT, contínua e implacável? Uma espécie de UFC político? Com exceção de alguns poucos partidos, não é essa a tradição. O que temos visto, lamentavelmente, é uma desobediência à vontade do eleitor. Como? Praticamente extinguindo a figura da oposição. Ou não é isso o que acontece no Congresso Nacional e nos Parlamentos Estaduais quando partidos de diferentes matizes ideológicas se fundem, por interesses pragmáticos, para formar incompreensíveis bases governistas?

A impressão que tal montagem franksteniana passa é de que mais vale o atendimento de um interesse pessoal ou partidário do que o acolhimento de um apelo popular. Também, como esperar atitude cidadã de quem, na campanha, se desinteressou pela apresentação de propostas para solucionar os graves problemas da administração pública, especialmente os mais reclamados pela população? Pois foi essa verdadeira salada de frutas de siglas, aliada a existência de mais de três dezenas de diferentes partidos, que fez com que o eleitor valorizasse mais o voto na pessoa do que no partido que ela representa. Essa é fábrica que produz aberrações políticas.

No momento em que se fala tanto em reforma política, uma das medidas mais urgentes deveria ser a separação institucional e objetiva dos papéis desempenhados pelas bases governistas e oposicionistas. Quem sabe impedindo a composição das fatídicas alianças partidárias, de difícil compreensão popular? Isso daria um basta à cooptação carguista e a sedução financeira. O absurdo é tanto que tem partido que, independente de ganhar ou perder as eleições, consegue se manter sempre no poder. Ou seja, passou de linha auxiliar para extensão direta. “Se hay gobierno soy a favor”. Sabem qual é o principal dano provocado pela fragilidade da oposição? A falta de uma fiscalização eficiente dos atos praticados pelos governantes e seus representantes. E a fiscalização é o maior dever de um Legislativo consciente e realmente ligado a defesa dos interesses do povo. Sem ela o terreno legislativo se torna fértil para a semeadura da corrupção.

O Brasil, os estados e os municípios precisam de oposições responsáveis, honestas e atuantes. Faz bem para a cidadania e para o bolso do contribuinte. É por isso que não entendo os dois extremos de quem se propõe fazer realmente oposição ao governo Dilma, por exemplo. O que se contrapõe apenas para “inglês ver”, mantendo-se numa posição de passividade contemplativa; e o que prega o impeachment ou volta da ditadura militar, ignorando a importância democrática do resultado das urnas. Nem tanto o céu, nem tanto a Terra. E esse é o desafio de todos os partidos: rever seus papéis e corrigir os seus erros.

Nesse aspecto nem mesmo o PT escapa. Precisa reaprender a se comunicar legitimamente com a vontade popular. Enquanto representante e não como indutor. Da mesma forma os partidos anti-PT precisam aprender que oposição se faz com atitude e não apenas com discurso. Militante não serve apenas para atuar como cabo eleitoral ou como convencional. Serve, fundamentalmente, como fiscal atento das práticas dos seus correligionários e das ações dos partidos que estão no poder, inclusive o seu. Só assim os partidos poderão mudar sua imagem negativa e se valorizar perante o eleitor.

Mas não temos o direito de parecer ingênuos. Modificar o atual status quo da atuação política dos partidos e dos parlamentares significa expor publicamente suas vísceras, suas mazelas e suas imperfeições. Só uma coisa poderá exigir tamanho “sacrifício”: a vontade popular. Mas essa participação não pode se restringir apenas a virtualidade das redes sociais e das notícias midiáticas. Precisa chegar às ruas, as casas, as universidades … Só assim será possível sonhar com a implantação de uma Casa do Povo realmente confiável e transformadora.

Talvez essa seja a lição inesperada do último pleito. E o momento de propor essa discussão é agora, enquanto as urnas ainda estão aquecidas e a memória do eleitor avivada. Um grande movimento cívico, pacífico e responsável. Autêntico. Imaculado do ponto de vista da contaminação das intenções autoritárias e excludentes. Se o resultado das urnas dividiu o país entre vencedores e vencidos, tal separação não pode ser levada para o campo de batalha pela preservação da ética, da moralidade e do espírito público. Somos um só país e um só povo. E como tal precisamos de governos fortes e respeitáveis e de oposições sérias e realmente representativas. Chega de faz de conta. É hora do Brasil mostrar a sua verdadeira face e projetar o seu tão ambicionado futuro promissor.

.oOo.

Sergio Araujo é jornalista.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora