Colunas>Selvino Heck
|
31 de maio de 2019
|
10:11

Insegurança geral: Preparemo-nos! (10)

Por
Sul 21
[email protected]
Insegurança geral: Preparemo-nos! (10)
Insegurança geral: Preparemo-nos! (10)
Foto: Guilherme Santos/Sul21

Selvino Heck (*)

Chego em casa tarde da noite depois da última reunião, vejo um papel grudado no chão no corredor de entrada do prédio onde moro em Porto Alegre. Leio: “Senhores moradores da rua Thomaz Flores. Na função de zeladoria patrimonial, cabe-nos alertar que antes de dormir revisem todas as janelas de suas residências para verificar se estão devidamente fechadas e trancadas. Mesmo sabedores de nossa vigilância constante durante a madrugada, temos notado elementos estranhos no bairro e informações de entrada em apartamentos, de primeiros, segundos e terceiro andares nas ruas vizinhas onde não existe nenhum tipo de serviço de guardas. Mesmo nesta rua, com todo o cuidado que temos em vigiar, acontecem alguns casos. Agradecemos a compreensão e nos colocamos à disposição para eventuais esclarecimentos. Atenciosamente, Roberto.”

Manchete de jornal no final de semana: “Gigante aposta alto na venda de armas – Com Decretos de Bolsonaro, Taurus tem perspectiva de comercializar para milhões de brasileiros. Eventual abertura de mercado para estrangeiros cria expectativa” (Humberto Trezzi, Zero Hora, 25-26/05, pp. 20/21).

Segue a matéria: “Os mercadores de armas estão animados. Os catalisadores da euforia são dois Decretos assinados por Jair Bolsonaro neste ano, um facilitando o registro de armas e outro, ainda mais polêmico, ampliando a potência de calibres permitidos e o número de pessoas que têm direito a portar armamento. E a Taurus, empresa nascida há 80 anos e que domina hoje o mercado brasileiro, está entre os potenciais beneficiados.

Estudos feitos por lobistas do setor indicam que até 6 milhões de brasileiros estariam dispostos a adquirir uma arma, para uso em casa ou na rua. É um mercado que pode render R$ 12 bilhões e representa aumento de 10 vezes quanto ao total de armas oficialmente legalizadas no Brasil: 331 mil de defesa pessoal (pessoas físicas) registradas no Sistema Nacional de Armas, e 350 mil pertencentes a caçadores, atiradores e colecionadores. Outras 327 mil estão em nome de empresas e forças policiais. Algumas estimativas indicam que existem hoje em território brasileiro cerca de 17,6 milhões de armas leves em circulação, a imensa maioria na ilegalidade.”

Qual dois discípulos de Emaús, Cláudio Nascimento e eu seguimos a pé na direção de nossas casas no início da noite, no final do grande Ato contra a Reforma da Previdência semanas atrás. Saindo do Largo Zumbi dos Palmares, Porto Alegre, passamos nas imediações do Campus Central da UFRGS em direção ao Bairro Bom Fim, olhando para os lados, falando de segurança/insegurança, com cuidados, desconfiados e algum medo, e contando ‘causos’ de assaltos e violência acontecidos nas ruas, bairros e redondezas por onde passamos.

Como andar na rua tranquilamente na capital do Orçamento Participativo e do Fórum Social Mundial? E não está se falando da periferia da cidade, mas da região central. Se não posso/podemos mais andar tranquilamente nas ruas do centro de Porto Alegre, posso/podemos andar onde? Se não posso/podemos mais sair tranquilo da minha casa ou dormir sem sobressaltos à noite, como posso/podemos ainda viver em paz? Em que tipo de sociedade nos transformamos, onde um massacre de dezenas de presos é festejado por muita gente nas redes sociais? Onde o medo de sair às ruas a qualquer hora do dia, em especial à noite, predomina. E se assinam Decretos colocando armas nas mãos de todo mundo! E que vão acabar na mão de milicianos!

Escrevi em 2018, período pré-eleitoral, artigos com o título “Um Fome Zero contra a violência”, lembrando que, tal como foi feito pelo presidente Lula propondo o Fome Zero como programa prioritário do seu governo, o tema da violência e da segurança pública deveriam estar em primeiro lugar de qualquer programa de governo. O que não se faz, obviamente, colocando armas nas mãos da população, mas sim promovendo a paz, mudando e melhorando o sistema prisional, com trabalho e formação para os aprisionados, promovendo políticas discutidas com a sociedade e programas com participação social e valores de solidariedade, cidadania, justiça social, esperança.

Não é o que está acontecendo, infelizmente. Assim, crescem a violência e a insegurança geral em 2019. Ameaçam a vida da cidadã e do cidadão, tiram a vida do jovem e da mulher, especialmente negras e negros, colocam em xeque a democracia. A mobilização social contra a violência deve estar e entrar nas pautas urgentes da sociedade, assim como o enfrentamento da fome, da miséria e do desemprego, para se ter paz social e uma Nação com soberania.

(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990). Em trinta e um de maio de dois mil e dezenove.

§§§

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora