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22 de fevereiro de 2019
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15:31

Um banquetaço contra a fome e pela vida

Por
Sul 21
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Um banquetaço contra a fome e pela vida
Um banquetaço contra a fome e pela vida
Divulgação

Selvino Heck (*)

O Brasil saiu do Mapa da Fome segundo a FAO, organismo da ONU, em 2014. O Brasil está voltando ao Mapa da Fome em 2019, quando 13 milhões de brasileiras e brasileiros passam fome no Brasil. Em seu primeiro dia de governo, o presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória 870/2019, que extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), que assessorava a Presidência da República na formulação, assessoramento e monitoramento das políticas públicas de segurança alimentar e nutricional, hoje reconhecidas no mundo inteiro.

Por isso, e por outras razões, vai acontecer o “Banquetaço” dia 27 de fevereiro, quarta-feira, em todas as capitais brasileiras. Em Porto Alegre, o “Banquetaço” será ao meio dia, na Praça da Matriz, em frente ao Palácio Piratini, à Assembleia Legislativa e ao Palácio da Justiça. Haverá também Banquetaços em Santa Maria e Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul.

O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) surgiu em 1993, a partir da Ação da Cidadania contra a Fome e pela Vida, coordenada por Betinho e espalhada por todo território nacional. Dom Mauro Morelli foi o primeiro presidente do CONSEA. A primeira Conferência Nacional de segurança alimentar aconteceu em 1993.

Fernando Henrique Cardoso fechou o CONSEA. A luta da sociedade contra a fome, no entanto, continuou. Até que o presidente Lula, eleito em 2002, tornou o combate contra a fome prioridade absoluta, com uma frase histórica, no discurso de posse no Congresso: “Se ao final do meu mandato, todos os brasileiros tiverem a possibilidade de tomar café de manhã, almoçar e jantar, terei cumprido a missão da minha vida”. Lula recriou o CONSEA, ligado diretamente à Presidência da República, e promoveu a segunda Conferência nacional de segurança alimentar em 2004.

O CONSEA contribuiu para a definição e/ou o aprimoramento de políticas públicas para a garantia e segurança alimentar e nutricional no Brasil. Exemplos emblemáticos disso são: a estratégia Fome Zero; a Política e o Plano Nacional de Segurança alimentar e nutricional; os Programas de convivência com o semiárido brasileiro; a Política e o Plano nacional de Agroecologia e Produção Orgânica; o Plano Safra da Agricultura familiar; o Programa de Aquisição de Alimentos; o Programa Nacional de Alimentação Escolar; o Guia Alimentar da Alimentação brasileira.

A extinção do CONSEA fragiliza ou, na prática, leva à extinção do Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) e compromete os processos de garantia do Direito Humano à Alimentação, inscrito na Constituição em 2006. E representa uma afronta à democracia e um retrocesso social, uma vez que desmonta um dos mais importantes espaços de participação social, um dos pilares da democratização do Estado, onde a sociedade tinha dois terços dos conselheiros e o governo federal um terço.

A fome está voltando, basta ir para as ruas e as periferias, e o Brasil pode voltar ao Mapa da Fome a qualquer momento. Por isso, o “Banquetaço” dia 27 de fevereiro. É uma atividade realizada em todos os Estados brasileiros, organizada pelos CONSEAs estaduais em parceria com uma diversidade de organizações da sociedade civil do campo e da cidade. Tem como objetivos: mobilizar deputados e senadores pela revogação dos itens da MP 870/2019 que extinguem o CONSEA nacional e suas competências; dar visibilidade e defender a diversidade social, ambiental, alimentar e de organizações e movimentos sociais que lutam para preservar a biodiversidade e a soberania e  segurança alimentar e nutricional; denunciar o desmonte das políticas públicas de soberania e segurança alimentar e nutricional; denunciar o desmonte das políticas públicas e a violação dos direitos da população, dentre eles, os casos de Mariana e Brumadinho, que demonstram a prevalência dos interesses das mineradoras, das indústrias químicas e alimentícias e do capital à saúde da população.

Estão convidados, e vão participar do BANQUETAÇO, não só as entidades que fazem parte do CONSEA, mas também, e principalmente, a população em situação de rua, indígenas, sem teto, sem terras, quilombolas, trabalhadoras e trabalhadores. Será um banquete de festa pelas conquistas, vitórias e avanços no combate à fome. Será um banquete de luta e denúncia. Será um banquete de mobilização pela democracia e um grito profético. Será um banquete de esperança, porque, quando o povo está unido e luta, ninguém consegue tirar definitivamente seus direitos.

Disse o Papa Francisco, em reunião esta semana com a FAO, organismo da ONU que declarou o Brasil fora do Mapa da Fome em 2014: “É preciso garantir que cada pessoa e cada comunidade possa desenvolver suas capacidades de um modo pleno, para que os povos e comunidades sejam responsáveis pela própria produção e pelo próprio progresso. Promover soberania alimentar é chave para acabar com a fome.”

(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990), ex-conselheiro do CONSEA nacional, conselheiro do CONSEA/RS pelo CAMP (Centro de Assessoria Multiprofissional).

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 


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