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28 de dezembro de 2018
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13:44

Foi-se 2018!

Por
Sul 21
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Foi-se 2018!
Foi-se 2018!
Foto: Guilherme Santos/Sul21

Selvino Heck (*)

Que se dirá ou escreverá de 2018 daqui a 50 anos? Não eu, por certo, mas outros que virão depois de mim! Pré-adolescente, lembro de muitas coisas de 1964. Passando da adolescência para a juventude, lembro de 1968. Lembro bem mais do início dos anos 1970, da ditadura recrudescida, das eleições de 1974 e 1978. São tempos passados, mas ficaram os registros, que fazem parte da história, minha e de muitos, e fazem parte da História.

2018, o pior ano de nossas vidas? Ou o ano da juventude e das mulheres, o ano da resistência e, apesar de tudo, da esperança? Ou o ano em que foi-se o Estado de Direito?

Penso, hoje, que 2018 será lembrado no futuro como o ano em que foi-se o Estado de Direito, foi-se a Democracia. As ainda controversas manifestações de 2013 começaram a compor o quadro de 2018. Os acontecimentos e as mobilizações de cinco anos atrás estão aí, basta rememorá-los/as. As Fake News dominaram 2018 e elegeram quem foi eleito presidente. O Sistema de Justiça acovardou-se, para não dizer que se vendeu e/ou corrompeu. Ou fez escárnio do povo com os reajustes em tempos de crise e o auxílio-moradia. O ano em que se invadem escritórios de advogados do mesmo jeito que se invadem casas de inocentes. O ano em que uma operação chamada Lava-Jato persegue e investiga de fato – investiga, ou faz de conta? – pra valer só um lado da sociedade, e ‘esquece’ os muitos Queiroz da vida. Aliás, ‘onde anda o Queiroz’? Ou, quando todos os dias acontece o assassinato impune de lutadores/as, ou de jovens pobres, pretos e prostitutas nas favelas e periferias, ou quando se exaltam as mortes de bandidos – ‘bandido bom é bandido morto’ –, ou se fala dos métodos de tortura como se fatos corriqueiros fossem: onde está o Estado de Direito? Quem matou Marielle e Anderson? Ou quando se forma um governo de generais, quase sem mulheres, sem nordestinos e sem ninguém do Norte? Democracia pela metade, democracia sem rostos, sem nomes? Ou quando se livra todo mundo, menos Lula, preso político ‘ad aeternum’, sem provas, inocente, de quem não se pode ver o rosto, ouvir a voz? Que democracia e Estado de Direito são esses, que valem para alguns, sempre, e valem, nunca, para outros?

E que dizer da declaração do Presidente da Associação Brasileira de Magistrados (AMB), Jayme de Oliveira, no apagar das luzes de 2018? “Não tem como ficar vivendo do jeito que a magistratura está vivendo, o dia inteiro sangrando. É preciso criar uma política nacional remuneratória.” Declaração feita em tempos em que, por um lado, o Sistema de Justiça teve reajuste salarial e viu ser recriado o auxílio-moradia. E, por outro, tempos de PEC 95, que congela os recursos para saúde, educação e segurança por 20 anos, em tempos de hospitais fechando, em tempos de perdas de direitos todos os dias para quem ganha 1, 2, 3 salários mínimos, quando está empregado, em tempos de miséria e fome aumentando a olhos vistos nas ruas, em tempos de violência e insegurança gerais.

Estamos em pleno Estado de Direito? Há democracia? Dá para comemorar 2018? Se 2018 ainda está sendo e foi o que foi, que esperar de 2019? Fugir? Esconder-se? Voltar ao anonimato? Fazer de conta que ‘não é comigo’, ‘nada tenho a ver com isso’?

Ainda bem que jovens e mulheres em especial, entre outras/os tantas/os lutadoras/es, se não salvaram o ano, o que não está no seu poder, pelo menos deram alento e esperança. Muito alento, muita esperança. Felizmente, jovens e mulheres resistiram, gritaram bem alto, mostraram sua força e poder, estão vivos para a democracia.

Foi-se 2018, mas restam a indignação e a coragem de seguir lutando, filhas da esperança, que não podem ser abandonadas nunca. Escrevi em 1980, em plena ditadura militar, e publicado no jornal Cajado, do Movimento Peregrinos, da Pastoral da Juventude, e declamado esta semana na reunião do Conselho Popular da Lomba do Pinheiro, depois da discussão do projeto KiLOMBA, cursinho pré-vestibular de inspiração freireana para jovens da periferia, o poema A MANHÃ VAI CHEGAR. “A manhã há de chegar,/ eu sei./ Com ventos e tempestades,/ mas vai chegar./ E vai habitar nas curvas do homem e da mulher,/ nas esquinas do mundo,/ nas circunstâncias da história./ E vai resplandecer o povo/ com seu frescor,/ sua claridade e ternura./ E vai armar o povo de palavras./ Vai proclamar a liberdade/ e expulsar o medo./ A manhã vai chegar sem fantasmas,/ sem fomes,/ sem mordaças./ O povo sairá nas ruas,/ unirá as mãos (hoje, 2018, NINGUÉM SOLTA A MÃO DE NINGUÉM),/ e a bandeira da liberdade,/ finalmente, vai drapejar/ no continente. A manhã há de chegar,/ eu sei.”

Feliz Ano Novo a todas e todos, se é que é possível desejar um Feliz Ano Novo nas atuais circunstâncias. De minha parte, estarei em Curitiba na virada do ano, para energizar 2019, gritando LULA LIVRE com companheiras e companheiros. Democracia, sempre. Esperançar, sempre!

(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 


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