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17 de julho de 2016
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11:01

Caminhos cruzados

Por
Luís Gomes
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Caminhos cruzados
Caminhos cruzados

erico verissimo caminhos cruzadosÉrico Veríssimo escreveu e publicou Caminhos Cruzados em 1935, período especialmente conturbado na sociedade brasileira. O romance foi considerado comunista e subversivo.

Romance urbano, Caminhos Cruzados conta uma história coletiva, mostrando a sociedade brasileira de forma crítica, contrastando a riqueza e a pobreza, ressaltando os problemas para cada camada social. Érico retrata uma cidade inteira, compondo murais através de suas descrições. Destaca a miséria, a opressão social e a hipocrisia.

Nas palavras do próprio Érico, em prefácio ao livro em 1964, “Caminhos Cruzados é um livro de protesto que marca a inconformidade do romancista ante as desigualdades, injustiças e absurdos da sociedade burguesa”.

A vida é uma luta. Não é fácil a construção da democracia. Estamos em 2016 e, mais uma vez, depois de um período de alargamento democrático, de políticas públicas com participação social, assistimos ao desmonte das políticas públicas, à desconstrução de direitos conquistados a duras penas, à volta da máxima neoliberal, `Estado mínimo, Mercado livre e absoluto`.

Laura Carvalho (Folha de São Paulo, 14.07.16) comenta a frase do ministro da Fazenda, Henrique Meireles, resumindo a política econômica do governo interino e golpista: “O Plano A é o controle de despesas, o B é privatização, e o C, aumento de imposto.”

Laura Carvalho transporta isso para a vida doméstica, imaginando “uma família para a qual, diante da crise, a primeira opção fosse cortar a escola das crianças, diminuir a ida ao pediatra ou eliminar os remédios dos avós. Depois, o Plano B: vender a geladeira, o sofá e o piano. E só depois convencer o filho mais velho a abrir mão do carro zero Km e ajudar um pouco em casa”.

É o que está em jogo de novo neste momento no Brasil. O governo e as políticas são a favor de quem, beneficiam quem? Será, mais uma vez, o andar de cima, o rentismo quem, em vez de investir no desenvolvimento do Brasil, em distribuição de renda, em políticas a favor do povo trabalhador, põe seus não poucos excedentes no exterior, lixando-se para quem sua e trabalha e constrói no cotidiano este país-continente?

Ou as políticas, como têm sido nos últimos governos, e o objetivo são o desenvolvimento nacional, o emprego, a casa, a agricultura familiar, a saúde e educação para todos? São a construção coletiva e participativa, a consciência de quem acredita que é de baixo para cima que as coisas e a política devem ser e acontecer?

É o que está em jogo quando as mobilizações nas ruas, os protestos dizem que o impeachment da presidenta Dilma é golpe, que as instituições democráticas estão em perigo, assim como a soberania nacional.

Como escrevia Érico Veríssimo em 1935, o protesto e a inconformidade ante as desigualdades, injustiças e absurdos da sociedade burguesa continuam, além de urgentes, mais que necessários. O escritor, o intelectual, ninguém pode calar-se, esconder-se atrás das cortinas, fechar-se ante a insensatez, a corrupção, o desmonte do Estado, a entrega de uma riqueza como o pré-sal.

A sabedoria do povo que, ao longo do tempo e da história, e especialmente nas últimas décadas, se organizou e se organiza na luta por direitos não deixará que as poucas conquistas sejam eliminadas ou perdidas. A consciência popular não permitirá recuos, direitos a menos, destruição da democracia. E haverá de obrigar o filho mais velho a vender o carro zero Km e ser solidário com a família.

São as tarefas estratégicas deste momento de “caminhos cruzados” da sociedade brasileira. Não é pouco, mas também não é demais para quem acredita na força popular e na democracia.

.oOo.

Selvino Heck foi deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987/1990).


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