Samir Oliveira (*)
Caxias do Sul é o segundo maior município gaúcho. A metrópole da Serra é reconhecida pela Festa da Uva e pela potência de suas indústrias. E agora, graças ao prefeito Daniel Guerra (PRB), também poderá ser lembrada pela restrição à liberdade de expressão, pela censura e pela intolerância.
A prefeitura de Caxias do Sul adotou todas as medidas que estavam a seu alcance para impedir que a XVIII Parada Livre ocorresse. Primeiro, barrou a realização do evento na praça Dante Alighieri, onde normalmente acontece. Em seguida, negou as alternativas propostas pela organização da Parada, como a Praça das Feiras e a Rua Plácido de Castro. De forma autoritária, decidiu confinar um evento multitudinário a um centro cultural sem a menor capacidade de comportar o público que tradicionalmente comparece à Parada.
Resultado: a organização precisou se virar para pagar por um estacionamento privado onde pudesse realizar o evento. Uma vaquinha virtual está sendo realizada para ajudar com os gastos.
Enquanto persegue a população LGBT com uma mão, a prefeitura de Daniel Guerra afaga sua base eleitoral com outra. Por isso, assim como proibiu a realização da Parada Livre em espaços públicos, não levantou nenhum empecilho para que a Marcha com Jesus ocorresse. O próprio prefeito, que pertence a um partido fortemente ligado à Igreja Universal, esteve presente no evento, que aconteceu sem óbice da prefeitura nos espaços públicos de Caxias. Como, aliás, é o correto. Que bom que em Caxias do Sul todos os católicos e evangélicos têm o direito de ir às ruas demonstrar o orgulho de sua fé. É uma pena que a mesma liberdade não seja garantida à população LGBT, que todos os anos vai às ruas para lutar contra o preconceito e defender igualdade de direitos.
Mais do que lamentável, a atitude da prefeitura de Caxias é inconstitucional, ferindo a garantia da liberdade de reunião e de expressão assegurada pela Constituição. É por isso que a organização da Parada Livre fará uma denúncia ao Ministério Público contra as restrições autoritárias do governo.
Talvez motivado pela vitória conservadora que girou o país à extrema-direita, o prefeito Daniel resolveu declarar guerra à população LGBT. Já no primeiro turno, contrariou a decisão de seu partido de apoiar Geraldo Alckmin e declarou um entusiasmado voto em Jair Bolsonaro. Em 2014, quando era vereador, Daniel Guerra votou contra uma moção de repúdio a Bolsonaro por suas manifestações preconceituosas.
Está claro de que lado está o prefeito. Não é nenhuma surpresa que ele, um político tradicional ligado a um partido conservador, seja homofóbico. O que causa espanto é sua disposição de utilizar os poderes do cargo e a estrutura da prefeitura para impedir ou colocar empecilhos à realização de um evento com o qual não concorde. Seria tão absurdo como se um governante ateu resolvesse barrar a Marcha com Jesus.
O que ocorre em Caxias do Sul é apenas mais uma expressão dos tempos sombrios em que vivemos no Brasil. Uma demonstração de que o autoritarismo bolsonarista contagia todas as instituições e níveis de governo.
É evidente que as mulheres, a negritude, a comunidade LGBT e a classe trabalhadora serão os segmentos mais atingidos pelo ódio e pelas políticas econômicas antipopulares. Mas também é verdade que já sopram fortes ventos de resistência e organização contra os ataques.
Mais de 80 mil pessoas passaram pela 22ª Parada Livre de Porto Alegre. As paradas de Cachoeirinha e Sapucaia reuniram multidões. Em seguida ocorrem as paradas de Pelotas, de Esteio e de Rio Grande. Onde prefeitos como Daniel declaram guerra, nós seremos resistência. Onde querem armário, demonstraremos orgulho. Onde querem ódio, demonstraremos amor!
(*) Samir Oliveira é jornalista e militante da Setorial LGBT do PSOL/RS.
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