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25 de abril de 2018
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16:09

Companheiro Ciro Gomes?

Por
Sul 21
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Ciro Gomes. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Samir Oliveira (*)

A eleição presidencial deste ano será a mais incerta desde 1989. A direita está dividida, a extrema-direita coloca a cabeça para fora, o centro patina e a esquerda tenta se recuperar do refluxo a que vem sendo submetida desde o golpe parlamentar.

Sejamos honestos: a possibilidade de Lula ser candidato inexiste. A não ser que o Tribunal Superior Eleitoral promova algum tipo de malabarismo político sem precedentes em torno da Lei da Ficha Limpa, algo muito pouco provável. É claro que o PT insiste em posicionar o ex-presidente como candidato, afinal este discurso anima a militância e reforça a defesa de Lula diante da condenação e da prisão.

Recentemente o próprio Lula parece ter dado sinais de que irá paulatinamente se distanciar da posição de candidato. Em carta enviada aos correligionários, liberou as lideranças do PT para que “ficassem totalmente à vontade para tomar qualquer decisão, porque 2018 é muito importante para o partido, para a esquerda e para a democracia”. E finalizou: “Para mim, quero minha liberdade”.

É neste contexto que assistimos às movimentações de Lula e do PT em direção a Ciro Gomes, pré-candidato do PDT à presidência. Essa aproximação não surge do acaso. Ciro é um nome bem colocado nas pesquisas de intenção de voto até o momento. Há elementos concretos indicando que Lula enxerga em uma aliança com o pedetista a possibilidade mais sólida de a centro-esquerda voltar ao poder.

Por isso colocou Ciro e o presidente nacional do PDT na lista de pessoas que deseja receber na prisão. Por isso escalou Fernando Haddad para fazer a interlocução com Ciro. Recentemente ambos se reuniram no escritório do economista e ex-ministro da ditadura Delfim Netto, juntamente com o economista Bresser-Pereira.

Essa aproximação só causa espanto em quem não acompanhou a política brasileira das últimas duas décadas. Delfim converteu-se de mentor econômico da ditadura a conselheiro dos governos petistas. A questão é: o coronel Ciro Gomes passará de “inimigo da democracia” a “guerreiro do povo brasileiro”?

Ciro Gomes foi muito criticado por ser o único pré-candidato presidencial identificado com a esquerda a não prestar solidariedade a Lula após sua condenação e na véspera de sua prisão. Manteve uma distância cautelosa da linha geral do petismo, evitando a todo custo dar aos fotógrafos a imagem simbólica de estar num palanque ao lado de um Lula prestes a ser preso. Foi evidentemente massacrado pela militância petista nas redes sociais.

Ciro Gomes encarna as condições perfeitas para representar o projeto lulista nestas eleições. É um político tradicional que não tem restrições a alianças com os partidos da ordem, defende um programa desenvolvimentista ancorado nas grandes indústrias nacionais e não representa uma ameaça ao mercado financeiro e ao sistema político. Aposta, assim como Lula, na manutenção dos pactos da Nova República, mesmo que todas as evidências apontem para a falência completa deste regime. Sua militância em sete partidos ao longo de sua trajetória política demonstra intempestividade, mas também comprova que Ciro conhece como poucos os caminhos tortuosos do sistema político.

Por enquanto, todos negam que uma aliança esteja sendo costurada. Neste caso acredito que o tempo será o senhor da razão. A proximidade do calendário eleitoral irá acelerar as contradições que são inerentes ao projeto lulista.

(*) Samir Oliveira é jornalista e militante da Setorial LGBT do PSOL/RS.

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Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do jornal, sendo de inteira responsabilidade de seus autores.


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