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17 de novembro de 2017
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09:22

Os bodes do Marchezan Júnior

Por
Sul 21
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Os bodes do Marchezan Júnior
Os bodes do Marchezan Júnior
Mesmo antes de assumir pintou um quadro de horror anunciando o colapso das finanças municipais. A Prefeitura estaria enfrentando uma crise semelhante à do governo do Estado. Grande bobagem. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Paulo Muzell

É por demais conhecida a “paródia do bode”. O dilema: o cara só podia alugar uma casa muito pequena para abrigar sua numerosa família. Teve uma ideia genial: antes de se mudar, colocou no seu interior vários bodes, quadrupedes de pequeno porte, mas que exalam odores nada agradáveis.

O primeiro dia da família na casa nova foi terrível, insuportável. No segundo dia ele retirou um bode, no terceiro outro e assim sucessivamente até a retirada do último. Sua mulher e filhos enfim suspiraram aliviados passando a achar a casa confortável.

Pois é exatamente isso que Marchezan Júnior vem fazendo. Mesmo antes de assumir pintou um quadro de horror anunciando o colapso das finanças municipais. A Prefeitura estaria enfrentando uma crise semelhante à do governo do Estado. Grande bobagem.

É verdade que a receita municipal teve pequena queda desde 2015. É também verdade que nos dez anos do período 2005/2014 a receita da Prefeitura teve excelente desempenho, cresceu mais de 50% acima da inflação medida pelo IPCA, o índice oficial da Prefeitura. Marchezan enfrenta uma pequena marola e diz que é um tufão. Versão conveniente: justifica o arrocho salarial e os ataques aos direitos dos servidores municipais, além da necessidade da venda da Carris e do DMAE. Ele é daquela turma sinistra que não cuida da gestão, só quer vender o patrimônio público. O Estado é para eles uma possibilidade de “bons” negócios.

Júnior começou com a recusa de pagar em maio a reposição da inflação passada garantida por lei. Primeiro bode. A seguir anunciou que não teria ao longo do ano recursos suficientes para pagar três meses da folha dos servidores, que passariam a receber parceladamente. Segundo bode. Para o bom entendedor ele estava dizendo que o 13º virara uma miragem. A seguir, sem nenhuma necessidade aumentou a contribuição previdenciária do funcionário de 11% para 14%. Terceiro bode. Não satisfeito, foi além, elaborou um pacote de projetos de lei que mutilam o plano de carreira retirando direitos dos trabalhadores. Quarto bode. Propôs, também a alteração da data de pagamento da folha do último dia útil do mês para o quinto dia útil do mês seguinte. O pagamento da gratificação natalina passaria para janeiro, um absurdo que provocou reação contrária do vereador Clàudio Janta, seu líder do governo na Câmara. Janta acabou sendo afastado da liderança. Júnior propôs, também, a prerrogativa unilateral do Executivo de retirar dos servidores os regimes de tempo integral e de dedicação exclusiva o que na prática significa o fim a estabilidade salarial do funcionário. Foi o quinto bode.

Marchezan Júnior justificou o parcelamento afirmando insuficiência de recursos para pagar a integralidade dos salários no último dia útil do mês conforme determina a lei. Auditoria do TCE/RS, solicitada pelo Sindicato dos Municipários (Simpa) e pelo Ministério Público de Contas, apurou que seria possível, sim pagar a integralidade nos meses de junho e julho desde que fossem utilizados recursos vinculados, prática usual na Prefeitura. Seria possível, também, pagar com folga a folha utilizando superávits do DMAE, o que já ocorreu muitas vezes no passado remoto e recente. Ora, a Prefeitura cobre com recursos da Fazenda metade da despesa do DMLU bem como a totalidade da despesa de pessoal do DEMHAB, uma outra autarquia municipal. O que impede que ocasional e temporariamente se socorra de recursos sobrantes do “primo rico”, o DMAE?

O parecer do TCE/RS não levou em conta, todavia, um outro dado fundamental na análise da questão. Por que as contas da Prefeitura têm saldos tão baixos no final de cada mês?  Que outros pagamentos são feitos antes da folha? A resposta está no Sistema de Despesa Orçamentária da Secretaria Municipal da Fazenda (SDO/SMF). Ao longo do mês de outubro a Prefeitura pagou 148 milhões a fornecedores e prestadores de serviço, montante que é o dobro do valor líquido mensal da folha da administração direta, de cerca de 74 milhões de reais. A conclusão é óbvia: o Júnior priorizou o pagamento dos fornecedores e dos prestadores de serviços de terceiros durante o mês para, no seu final, alegar insuficiência de recursos para honrar os salários do funcionalismo. O atraso do pagamento da folha é intencional e lhe convém porque fortalece a falsa tese de que a Prefeitura está quebrada.

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Paulo Muzell é economista. 


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