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27 de janeiro de 2017
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10:00

Só coincidências

Por
Sul 21
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Por Nelson Rego

É claro que foi um acidente, não foi assassinato. Por que não pode ter sido acidente? É acreditável acreditar em inacreditáveis coincidências, por que não? Caiu o avião em que viajava Teori Zavaski nas vésperas do esperado dia em que ele tornaria públicas as 77 delações da Lava Jato. A morte de Teori beneficia muitos suspeitos de formarem megaquadrilha para comandar a política e o orçamento do Brasil, inclusive alguns que, na investidura de deputados, senadores e Presidente da República, podem influenciar nos trâmites para a escolha do sucessor de Teori e, digamos assim, no ritmo e na amplitude com que as investigações prosseguirão. Que tremenda sorte tiveram todos esses suspeitos, não é mesmo? Agora existe uma grande chance para que tudo passe a andar, digamos assim, de outro jeito. Mas, ora, por que não acreditar em inacreditáveis coincidências? Há motivos para duvidar da isenção com que a perícia do acidente foi e está sendo conduzida?

Recapitulemos uma prova de como inacreditáveis coincidências de fato acontecem. Os eleitores do Paraná devem ter bem presente em sua memória (espera-se) a inacreditável sorte do deputado Fernando Lúcio Giacobo, que foi premiado doze vezes na loteria em menos de um ano. Investigado por outros episódios de sua biografia, tais como crimes de sequestro, cárcere privado, sonegação de impostos, formação de quadrilha e falsidade ideológica, o deputado esclareceu o ponto específico dos doze prêmios da loteria recebidos em menos de um ano: ele foi abençoado por Deus. Pronto, está explicado, viram como dá para acreditar em inacreditáveis coincidências? Tanto dá que a Ministra Cármen Lúcia algum tempo depois extinguiu processo movido pelo Ministério Público contra o abençoado deputado por outro ponto específico, uma acusação de estelionato envolvendo uma concessionária de veículos de fachada. Aliás, a Ministra Cármen Lúcia, como é de conhecimento geral, será decisiva para os encaminhamentos das investigações pós-Teori na Lava Jato.

Estamos em boas mãos. Temos, por exemplo, uma imprensa vigilante. Por vezes, vigilante só numa direção e um pouco distraída em outra, mas temos nosso acordo de que coincidências acontecem e uma coincidência é só uma coincidência e nada mais, certo? A imprensa estará em cima, fiscalizando e cobrando a continuidade da Lava Jato. Mas se por motivos legais a operação entrar em outro ritmo e o outro ritmo levar a uma redefinição da, digamos assim, amplitude do foco, é claro que a mídia responsavelmente desaquecerá aos poucos o assunto para evitar o estresse desnecessário à condução do país em direção a rumos mais dóceis por um Congresso composto por muitos homens abençoados por inacreditáveis coincidências.

Nesse rearrumar de ritmos e focos, será também só coincidência se a operação Zelotes for definitivamente esquecida. Para quem já esqueceu: a operação Zelotes é aquela que começou a investigar imensas sonegações de impostos, inclusive as sonegações da grande mídia, que, aliás, no Governo Temer, teve acréscimo de 600% no bilionário total dos valores recebidos para veicular propaganda oficial. É a operação aquela que começou e parou. Parou por quê? Por que parou?

Pergunta

Como se faz para pedir intervenção ampla, geral e irrestrita da OEA no Brasil?

Desenho de Rafael Martins da Costa

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Nelson Rego é escritor. Professor no Departamento e no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.  Sua coluna é publicada quinzenalmente no Sul21.

 

 

 

 

 

 

 


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